Produtor alemão esteve no Festival para Gente Sentada esta sexta-feira. Na segunda e última noite, o Theatro Circo voltará a encher, desta feita para ouvir Gilsons e Josh Rouse.
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“Agora quero que façam o som de animais. Animais míticos, selvagens, como os dinossauros.” Ia a noite a meio quando o pedido de Nils Frahm, ainda que inusitado, levou a que o Theatro Circo, em Braga, se transformasse, por uns minutos, numa cacofonia delirante. Havia quem imitasse pássaros. Outros rãs. E ouviu-se ainda sons tão misteriosamente inumanos que não eram passíveis de ser identificados. Houve também risos, muitos. Não fosse o pedido estranho. Mas, por Nils Frahm, o público parece fazer tudo. Com razão, porque Nils Frahm também tudo faz pelo público.
A mistura de barulhos, gritos e chamamentos serviu para que o produtor alemão de 41 anos a gravasse e fizesse dela uma das sete peças apresentadas esta sexta-feira na sala de espetáculos bracarense. Com os toques de magia aqui e ali, típicos de Frahm, rodeado da sua parafernália de teclas e sintetizadores, o que eram gemidos animalescos sem ritmo rapidamente se tornaram em melodia sonhadora.
O concerto de Nils Frahm teve lugar no primeiro dia do Festival para Gente Sentada - o seu regresso depois de já ter passado pelo festival e pela cidade em 2018 - mas nem a posição da audiência, denunciada pelo próprio nome do certame, impediu que o ambiente estivesse ao rubro - dentro ou fora das cabeças de quem ouvia.
Espetáculo dinâmico
Essa é a característica de Nils Frahm: levar os espectadores por uma viagem particular, num ambiente comum a todos. Quantas cabeças abanavam a seu bel-prazer, sem imposição de ritmo. Havia também na sala quem desse a perceber que nem um músculo se mexia, tal era a atenção depositada no fervilhar do músico entre diferentes ritmos, dinâmicas e instrumentos. A mistura entre música clássica e electrónica proporcionada por Frahm é de todos e vivida por todos de forma distinta.
O alemão apresentou-se em palco com dois sets distintos. Primeiro, o seu já confortável aglomerado de teclas e sintetizadores - que apresentaram alguns problemas técnicos durante o concerto, aos quais Frahm reagiu com leveza e humor, não tendo cortado na espetacularidade. À esquerda, uma novidade face ao anterior espetáculo (o atual chama-se “Music for” e foi apresentado pela primeira vez em Sydney, Austrália, em 2022), uma espécie de harmónica de vidro, com um teclado - um instrumento que só pela sua beleza de luz e cor, refletindo, ao girar, os feixes vindos dos holofotes que nele incidiam, captava qualquer atenção.
Mas o espetáculo desta sexta-feira arrancou de imediato com o desenvencilhar da curiosidade. Calçando umas luvas, molhando-as em água, Frahm começou o concerto com sons cristalinos produzidos por este incomum instrumento. Neste novo set não há adulterações. Não há sintetizadores. Não há sons “falsos”. Tudo “daquele lado” - houve ainda momentos com uma calimba e com uma espécie de caixa - é apresentado tal como acontece no momento.
O produtor seguiu ainda, durante as duas horas de espetáculo, por distintas bases, indo do jazz à influência africana. Sempre pautando as pausas entre as longas peças (maioritariamente retiradas do mais recente álbum “Music for Animals”) com um humor que arrecadava todos os risos da esgotada sala, Frahm é a prova de que há excelência em se fazer um one man show. Aprenda-se com quem, sozinho em palco, consegue ocupá-lo por inteiro. Fisicamente e mentalmente.
Mais concertos esta noite
Antes de Nils Frahm esteve em palco a banda local Mutu. Os bracarenses, que se predispõem a misturar música tradicional com eletrónica, deram um concerto que ia cativando os muitos que ali estavam a aguardar o cabeça de cartaz.
Este sábado à noite sobem ainda a palco o trio brasileiro Gilsons, formado por Francisco, João e José Gil, filho e netos de Gilberto Gil, e, para fechar, Josh Rouse, que regressa a Portugal para uma digressão que recorda o álbum “1972”, lançado há 20 anos.