Retrospetiva breve de José M. Rodrigues, nome essencial da fotografia portuguesa
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No regresso, 44 anos depois, ao mesmo museu onde expôs pela primeira vez, José M. Rodrigues rememora um percurso fotográfico erguido em torno de eixos como o tempo, a luz e a memória. Mais do que uma síntese, "Amostra" é uma declaração de princípios de um artista visual que concebe a fotografia como plataforma privilegiada para o olhar e para o pensamento, evitando ficar refém da máquina, mero instrumento tecnológico para os fins a que se propõe. Distinguido com o Prémio Pessoa em 1999 pelo conjunto da sua obra, Rodrigues selecionou para Évora, cidade intimamente ligada ao seu trajeto pessoal e profissional, uma dezena de meia de fotografias de larga escala e três objetos, representativos de diferentes etapas da sua atividade, dos anos 1980 ao presente.
A ideia de diálogo com o espectador é transversal a todas essas imagens, nas quais as pedras, as peles e as vísceras concretizam uma das ideias-chave do fotógrafo: a eterna tensão entre o Homem e a Natureza. Perante a vastidão dos elementos naturais, sobretudo a água, a ação humana perde expressão e vê-se compelida a refletir sobre a sua função, muito distante do papel central a que por norma se arroga.
Essa evidência confere às fotografias reunidas no museu eborense uma dimensão de mistério que apenas vem aumentar o leque de possibilidades interpretativas de quem visita a mostra. É o caso da fotografia mergulhada na escuridão, da qual emerge uma figura humana na penumbra que tateaia de forma hesitante o caminho, tendo como referência um mero fio de luz. Num outro trabalho emblemático de "Amostra", o único que recusa o preto e branco, o corpo da obra é constituído por centenas de micro-imagens de um homem, como se a sua identidade se tivesse fragmentado em partículas ínfimas.
Com um percurso artístico cuja formação passou por países como a França e Países Baixos, José M. Rodrigues mantém intactos os esforços de experimentação que o têm acompanhado desde os primórdios, sem que isto signifique, porém, uma recusa de atenção ao real.
"Amostra"
José M. Rodrigues
Museu Nacional Frei Manuel do Cenáculo
Évora