Rainer Zitelmann., autor do ensaio "Em defesa do capitalismo", afirma que apenas o desconhecimento da História justifica a oposição a este sistema económico.
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Apenas 16% dos portugueses associam o capitalismo à melhoria da qualidade de vida. A estatística faz parte do livro "Em defesa do capitalismo", um ensaio em que o historiador alemão Rainer Zitelmann procura desmontar os principais mitos anticapitalistas. Crítico da intervenção governamental excessiva, afirma que "os socialistas, apesar de terem o pior sistema, são melhores no marketing".
O capitalismo é o pior dos sistemas, à exceção de todos os outros?
O capitalismo é um ótimo sistema. Os números provam-no: antes do capitalismo, 90% do planeta vivia em pobreza extrema. Hoje, este número não vai além dos 10%.
Defender o capitalismo nos dias que correm, com toda a resistência que existe, não é a mais popular das atitudes...
Sim, claro. O livro contém inquéritos que fiz em 19 países e só em seis deles o capitalismo tem boa imagem. Foi por isso que escrevi este livro, embora saiba que os anticapitalistas não o vão querer ler. Rejeitam-no sem sequer saberem o seu conteúdo.
Como explica a forte oposição a um sistema que diz ser o mais justo de todos?
É um fenómeno recente. Há 30 ou 40 anos, com as reformas da Margaret Thatcher, a abertura económica da China e a queda do Muro de Berlim, havia um grande entusiasmo. Os programas escolares contêm muita informação sobre os malefícios do capitalismo, mas nada dizem sobre os resultados trágicos do socialismo. Os media em geral também costumam dar muito eco às teses anticapitalistas. O capitalismo tem muitos inimigos - da Esquerda à Direita - e poucos apoiantes. Sou um deles.
Surpreende-o que o marxismo ainda tenha tantos seguidores?
Hoje assistimos a um ressurgimento dos ideais marxistas. Há um mês estive no Vietname, país que oficialmente se define como comunista, mas onde quase não encontrei marxistas. Acreditam no capitalismo, embora usem antes o termo "economia de mercado socialista". Encontro mais marxistas na Europa e nos EUA do que na China ou no Vietname, o que é, no mínimo, curioso.
Afirma no livro que o anticapitalismo é particularmente popular entre os intelectuais. Como explica essa preferência?
O socialismo atribui uma grande importância ao papel dos intelectuais. O mesmo não se passa no capitalismo. Por isso, creio que o anticapitalismo não é uma ideologia da classe trabalhadora, como se poderia pensar. É, isso sim, uma religião dos intelectuais, mesmo os da extrema-direita. Apesar de terem o pior sistema, os socialistas são muito melhores no marketing. Nas 24 versões de tentativa de implementação do socialismo, de Cuba à Venezuela, falharam sempre. É uma má ideia que nunca morre. Deem-me um exemplo apenas de um local onde o socialismo tenha funcionado. Não existe. Compare-se com a trajetória da Polónia. Enquanto foi um país comunista, era dos mais pobres da Europa. Desde que começou a implementar reformas em favor do mercado, é o campeão europeu do crescimento. Sou um historiador. Limito-me a analisar os resultados e não as teorias.
Defende que o capitalismo não só é o melhor sistema económico como é o que melhor defende os direitos humanos e o ambiente. Há muitos mitos anticapitalistas por desfazer?
O capitalismo significa, antes de mais, liberdade de escolha. São os consumidores que decidem o que querem, não os governos. As alterações climáticas são um dos grandes problemas do nosso tempo, mas acredito que, em termos gerais, a situação está melhor do que há 30 anos. Da qualidade da água à poluição do ar, houve vários avanços. Comparemos, por exemplo, a situação na antiga Alemanha: apesar de a RFA ser mais industrializada, as emissões de CO2 para a atmosfera eram três vezes superiores na RDA. O capitalismo significa, antes de mais, inovação, e é disso que precisamos para combater as alterações climáticas.
Defende a existência de regras para regular o mercado?
São necessárias regras, claro. Até os historiadores mais libertários o defendem. A grande questão é saber quantas. Não conheço nenhum país no Mundo que tenha regras insuficientes. Mesmo líderes tão abertamente capitalistas como o Ronald Reagan ou Margaret Thatcher, tomaram medidas para impedir o alargamento do buraco da camada de ozono. O problema é que hoje temos medidas a mais em todo o Mundo.
Com a pandemia e a guerra, os Governos tornaram-se mais interventivos no plano económico. Teme que essa intervenção provisória se torne definitiva?
Há um perigo evidente. Mas não são só os governantes. Veja-se o que fez o Banco Central Europeu ou a Reserva Federal norte-americana. Deviam pugnar pela estabilidade da nossa moeda, mas a sua intervenção só veio criar mais problemas, nomeadamente a bolha imobiliária. A inflação que enfrentamos hoje deve-se à forma como compraram montantes gigantescos de dívida ao longo dos anos.
Portugal é um dos países que analisa no livro. Surpreendeu-o a dimensão do sentimento anticapitalista existente por cá?
Em Portugal, o capitalismo é associado a palavras como "ganância" ou "corrupção". Só 16% da população acredita que o capitalismo melhora a vida das pessoas, o que é de loucos, porque, como demonstro no livro, este sistema contribuiu imenso para a descida dos níveis de pobreza por todo o Mundo.