Compositor minimalista lança novo volume de “Organic music tapes” e atua esta quinta-feira na Casa da Música, "um lugar muito especial", como confessa ao JN. Tiago Sousa passará ainda pela Guarda, Lisboa e Barreiro.
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O pianista e compositor Tiago Sousa não desapontou os fãs e lançou no início do ano o terceiro volume da sua série “Organic music tapes”. Neste novo álbum, deparou-se com a vontade de compor sonoridades enraizadas na corrente minimalista, mas sem se desviar de criar música orgânica, onde evidencia os padrões provenientes das demoradas estratégias dos processos biológicos.
O músico partilha com o JN que “esta ideia consumou-se na minha cabeça quando observava a superfície de um lago e reparei na forma como o vento agitava as ondas em diversas direções, provocando um ritmo encantatório”.
“Percebi nesse momento que esta era a forma pela qual a música orgânica queria ser edificada, pela mesma ambiguidade métrica, quase caótica, difícil de codificar e de prever”.
Comparado aos dois volumes anteriores, é de realçar a transformação nas suas composições, completamente contaminada pelo papel do órgão onde “neste caso, o instrumento é todo um edifício”.
Mesmo não sendo uma novidade nas suas composições, Tiago Sousa, de 39 anos, encontrou uma nova forma de integrar variadas classificações do órgão, recorrendo a loops pré-gravados.
“Interessou-me o carácter sónico do instrumento elétrico e esse processo de tocar sobre música pré-gravada para provocar pequenos desvios que induzem perceções subtis e efeitos psico-acústicos”.
O ritmo infinito das ondas
Neste disco espreme do órgão diferentes vibrações, que nesta nova fase criativa do pianista e compositor foram cruciais para desenvolver noções de ressonância e reverberação, que “ganham um novo relevo quando falamos destes instrumentos e da sua relação com a acústica de uma igreja”.
Ao ouvir o terceiro volume são percetíveis os riscos que assumiu, afastando-se dos processos criativos a que estava habituado, pela crescente vontade de questionar a prevalência do tempo musical marcada pelo repetitivo metrónomo, “com os seus batimentos indexados aos ponteiros de um relógio”.
“O propósito seria abandonar esta noção mecanizada e apressada do tempo musical e construir uma música que se aproximasse mais do ritmo infinito, das ondas do mar, dos ciclos solares e lunares, da respiração de um ser vivo”.
Para materializar esta necessidade, deixou-se inspirar pelas composições e técnicas dos autores norte-americanos Steve Reich, Philip Glass e Terry Riley. Aqui, no som contínuo dos órgãos transparece o trabalho com a repetição e circularidade nos seus temas originais.
Seguem-se Guarda, Lisboa e Barreiro
Com a sua digressão já em curso, e com Vila Real para trás, o segundo público a ser encantado pela escrita contemporânea e minimalista de Tiago Sousa é o portuense, na Casa da Música, esta quinta-feira, às 21.30 horas.
Este palco já não é novidade para Tiago Sousa e, assim, montou um concerto onde espera que o público “passe um bom bocado e possa reverberar comigo e com a sala, que é um lugar muito especial”. Os bilhetes para este concerto estão disponíveis a 15 euros.
O músico português atuará ainda na sexta-feira no Teatro Municipal da Guarda, no sábado na Sala Lisa, em Lisboa, e regressará à Igreja de Nossa Senhora do Rosário, no Barreiro, no dia 18 de fevereiro, com entrada gratuita.
Foi na Igreja do Barreiro que Tiago Sousa gravou “Upbuilding”, o tema que abre o seu novo álbum, o mais impactante para o músico, marcado pela potente presença do órgão de tubos. “Upbuilding” foi apresentado em primeira mão no Festival Internacional de Música Exploratória do Barreira - OUT.FEST, em outubro de 2023.
Redefinir o órgão
“No contexto do OUT.FEST foi muito gratificante poder tocar para uma igreja completamente cheia e sinto que a experiência foi igualmente gratificante para quem esteve na plateia. Foi um dia em cheio”.
Em contrapartida, na visita à Casa da Música, aquele tema não será ouvido num órgão de tubos, mas antes num órgão elétrico. Contudo, Tiago Sousa confessa ao JN que espera voltar ao Porto para um novo recital.
Como os padrões, “difíceis de determinar, de composição irregular formadas pelo movimento espontâneo e natural”, as composições neste terceiro volume permanecem em constante movimento, sem silêncio e repletas de sonoridade com contornos indeterminados.
De certa forma, Tiago Sousa transportou padrões “tais como os que se formam numa pedra jade, nos veios da madeira ou na fibra dos músculos. Padrões como os que se formam quando olhamos o céu à noite e vemos as nebulosas de corpos celestes”. Padrões que redefinem a utilização do órgão, afastando-o de conotações religiosas.