Da tragédia se fez a eternidade. Francisco Lázaro, carpinteiro numa fábrica de carroçarias automóveis em Lisboa, integrou a primeira delegação olímpica portuguesa, numa equipa de seis atletas que marcou presença nos Jogos de Estocolmo de 1912, e foi nas ruas da capital da Suécia que deu a vida a correr atrás de um sonho bem real. Acabou traído por um conjunto de circunstâncias, e outros tantos rumores, tornando-se o primeiro atleta da história das olimpíadas da era moderna a falecer durante uma prova.
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A tarde estava invulgarmente quente para um país nórdico. Os termómetros marcavam 32º à sombra e a hora prevista para o início da maratona (13.45 horas) levou mesmo a que vários médicos sugerissem o adiamento da prova, mas os juízes não aceitaram. Pouco antes do tiro de partida, Francisco Lázaro foi visto pelos colegas de seleção a cobrir o corpo com sebo e terá sido aconselhado a tomar um duche, mas não havia tempo para tal. Assim, partiu para os 42 quilómetros com os poros da pele tapados, o que impedia a transpiração e que é apontado, até hoje, como um dos motivos para o colapso que teve entre o 25.º e o 35.º quilómetro. Tentou levantar-se várias vezes e várias vezes voltou a tombar, sendo transportado ao hospital, onde viria a morrer na madrugada seguinte. A autópsia revelou que a causa da morte se deveu a desidratação extrema e insolação - foi um dos poucos que correram sem chapéu -, sendo que também foi referido que tinha o fígado completamente mirrado e rijo. Este pormenor alimentou os rumores de que Francisco Lázaro usaria, como muitos outros corredores e ciclistas da altura, a "emborcação", uma mistura constituída por ovos, água, essência de terebentina (um anestésico) e ácido acético (vinagre).
O certo é que Lázaro chegou ao hospital de Estocolmo com uma temperatura corporal de 41,5º e o desfecho deu um tom sombrio às palavras que o atleta terá dito antes do início da maratona - "Ganho ou morro".
Dois dias depois e após receber os jornais internacionais, o JN dava a "dolorosa notícia da morte de um dos melhores elementos da equipa portuguesa", enquanto no dia 20 de julho as mais de 24 mil pessoas que lotavam o Estádio Olímpico de Estocolmo prestaram uma silenciosa homenagem a Francisco Lázaro, com Pierre de Coubertin, o fundador dos Jogos Olímpicos da era moderna, a fazer questão de endereçar as condolências à família do desportista. No 100.º aniversário da morte, foi inaugurada uma placa com o nome de Francisco Lázaro na porta da maratona do Estádio Olímpico. Para a eternidade.