Está feliz na Turquia, no Goztepe, mas não dispensa a visita a Portugal quando é para recarregar baterias. Beto concretizou o sonho de conquistar um título pela seleção, a Liga das Nações, e mostra-se motivado a prolongar uma carreira que foi construída a pulso. "Ainda há muita coisa para ganhar", salienta o guarda-redes ao JN.
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Está de volta ao Algarve, após mais uma época na Turquia. Passar férias em Portugal é obrigatório para carregar energias?
Sem dúvida. Valorizo muito o que o meu país tem para oferecer e não abdico de voltar cá para estar com a família e os amigos. Foi um ano duro, que, felizmente, acabou da melhor forma.
Voltou a ser titular no Goztepe, mas, ao contrário da época de estreia, foi preciso sofrer até ao fim para garantir a permanência. O que aconteceu?
Demasiados contratempos. Tivemos de lidar com três mudanças de treinador e isso exige sempre um período de adaptação. Acabámos por cumprir o objetivo mínimo, mas é uma época que serve de aprendizagem. Para todos.
Individualmente, manteve um bom nível e recebeu algumas distinções ao longo do ano.
Apesar de todos os problemas, sinto que ajudei a equipa. Acabei por fazer uma grande temporada, que foi culminada com a nomeação para o melhor guarda-redes da liga.
O futuro continua a passar pelo futebol turco? Está feliz no Goztepe?
Sim, sinto-me muito bem no clube. Tenho mais um ano de contrato e vou cumpri-lo. Tenho sido bem tratado desde o primeiro dia.
Acabou a época com um troféu nas mãos. É bonita a taça da Liga das Nações?
[Sorriso] Muito bonita. Era algo que me faltava, um título pela seleção. É o ponto alto para qualquer jogador, ganhar pela seleção é um sonho de menino.
Ficou de fora na épica conquista do Euro 2016, em França, por estar lesionado.
Sim, são as contingências desta profissão. Na ocasião, não estive presente fisicamente, mas fazia parte do grupo. É um orgulho fazer parte desta seleção.
Após um ano desgastante, qual foi o espírito que se viveu na seleção nas duas semanas da Liga das Nações?
Há um enorme compromisso entre todos. A mentalidade é forte, competitiva, e todos sabem o que querem. É sempre especial quando nos reencontramos. Tenho lá muitos amigos.
Um deles é o capitão Cristiano Ronaldo. Como é que o sentiu?
Igual, com aquela imensa vontade de ganhar. Queria conquistar mais um título e conseguiu [sorriso]. Somos dos mais antigos no grupo e é sempre um prazer quando temos a oportunidade de trabalhar juntos.
Não foi utilizado em nenhum dos jogos. A sensação de satisfação é a mesma?
Na seleção, não há lugares cativos. Para pertencer a este lote é preciso trabalhar muito e todos temos de nos sentir parte do sucesso quando ganhamos e sentir parte do insucesso quando perdemos. Só assim se constroem as grandes equipas, aquelas que conquistam títulos.
Depois do jogo com a Suíça (3-1) e aquele hat-trick do Ronaldo, sentiram logo que iam ser campeões?
Era um objetivo e tínhamos muita ambição. Mal acabou o jogo, sentimos que havia ali uma janela que podíamos aproveitar. Jogávamos em casa e tínhamos todas as condições para conquistar o título.
O Ronaldo nunca tinha festejado nos Aliados, mas para si já não foi novidade. Como foi voltar a celebrar no coração do Porto?
Fantástico. A demonstração que somos todos Portugal. É uma memória que vai ficar para sempre no meu coração.
A nova geração da seleção pode ser personificada em jovens como Rúben Dias e João Félix?
São dois exemplos, mas há mais. Trata-se, sem dúvida, de dois grandes jogadores e dois promissores talentos do futebol português. Portugal tem de estar orgulhoso de conseguir formar jogadores com este nível.
Jogou quatro épocas em Espanha, no Sevilha. Que conselho dá ao João Félix?
Ele já deve ter muita gente a aconselhá-lo. O que posso dizer é que ele só tem de ser ele próprio para vingar em Espanha. Tem de estar tranquilo e fazer o seu trabalho. Desejo que faça isso para conseguir semear o pânico nos relvados [gargalhada].
A saída de João Félix para o Atlético de Madrid deixa o futebol português mais pobre?
Todos os anos saem jogadores e surgem outros. Acredito que há mais jovens a despontar. A Liga portuguesa é uma prova competitiva, que todos os anos serve de montra para muitos jogadores.
Bruno Fernandes, onde encaixaria melhor? Inglaterra ou Espanha?
Toda a gente sabe que são dois grandes campeonatos e os bons jogadores encaixam em qualquer lado. Por uma questão pessoal, e por ter estado lá quatro anos, gostava de ver o Bruno na liga espanhola. Mas é como digo, sou um bocado suspeito, porque vivi a experiência e gostei muito de Espanha. É, para mim, uma liga muito atrativa.
Espanha ficou, recentemente, em choque com a morte de Reyes, devido a um acidente de viação. Foram companheiros de equipa no Sevilha, que memória guarda?
Foi uma perda muito triste. Éramos muito amigos e fiquei abalado com a notícia. Vou guardar para sempre o seu sorriso e o nosso abraço.
Curiosamente, defendeu um penálti decisivo do Reyes numa eliminatória da Taça em que o Leixões afastou o Benfica na marcação de penáltis (5-4).
Sim, é um momento que fica entre nós. Brincávamos muito com isso. Na altura, eu fui mais feliz que ele.
Consegue acompanhar a liga portuguesa? Por ter sido campeão, o Benfica parte com favoritismo para a nova temporada?
Ano novo, vida nova. Não creio que haja favoritos, volta tudo a começar do zero e ainda é cedo para fazer projeções, até porque os plantéis ainda estão em construção. Prevejo mais uma luta equilibrada até às últimas jornadas.
O "seu" Sporting surpreendeu-o na época anterior? Depois dos incidentes em Alcochete e toda a instabilidade inerente ao caso, conseguiu montar uma equipa e ganhar a Taça da Liga e a Taça de Portugal.
Obviamente, fiquei muito feliz. Toda a gente sabe que foi naquela casa que cresci e continuo a acompanhar o clube com muita atenção. Quando saí da primeira vez, com 18 ou 19 anos, prometi ao meu pai que um dia ia voltar e, graças a Deus, cumpri.
Aos 37 anos, pensa um dia regressar ao futebol português?
Nunca se sabe. Enquanto me sentir bem e tiver condições para jogar, todos os cenários serão possíveis. O importante é sentir que posso ser útil e que as pessoas me querem.
Olhando ao percurso que teve na carreira, sente-se realizado?
Muito. Só posso agradecer aos meus pais, por tudo que me ensinaram, e agradecer a quem trabalhou comigo e me deu a oportunidade de evoluir.
Alguma vez pensou desistir?
Houve momentos difíceis, em que cheguei a estar sem receber, mas os meus pais ajudaram-me e não me deixaram desistir.
Onde se vê daqui a 10 anos?
Ui, é demasiado tempo. Para já, vejo-me apenas a desfrutar deste período em família. Obviamente, acredito que ficarei sempre ligado ao futebol, porque já são mais de 20 anos como profissional e esta é a minha grande paixão, mas vejo esse dia ainda longe [sorriso].
A medalha da Liga das Nações está bem guardada?
Está guardada provisoriamente. Estou a acabar de construir a minha casa e um pequeno museu, onde irei juntar todos os símbolos das outras conquistas.
Esta é dedicada, especialmente, a alguém?
Esta vai por inteiro para a minha família, mulher e filhos, porque durante todo o ano foram eles que me ajudaram a ultrapassar as etapas mais complicadas.
CV:
Data de nascimento: 01/05/1982 (37 anos)
Nacionalidade: Portuguesa
Percurso: Ponte de Frielas, Sporting, Casa Pia, Marco, Leixões, F. C. Porto, Cluj, Braga, Sevilha e Goztepe
Principais títulos: Liga, Liga Europa (4) e Liga das Nações