Maior goleador da seleção e "deus" no país, Hakan Sukur passou a exilado político e refaz a vida nos EUA, à frente de pastelaria.
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Ainda não tira cafés com a mesma facilidade com que marcava golos, nem lava pratos com a mesma destreza com que cabeceava, mas Hakan Sukur faz o que pode. Para endireitar a vida depois do futebol, e, principalmente, para esquecer o que o levou até Palo Alto, na Califórnia, nos Estados Unidos da América. Aquele que ainda é o maior goleador da seleção turca, que marcou o golo mais rápido da história dos Mundiais e que era uma espécie de deus do Bósforo, também é um exilado.
E a reforma nem lhe prometia grandes problemas. Depois de arrumar as botas para o canto das memórias, Sukur aventurou-se como comentador desportivo, ao mesmo tempo que dava os primeiros passos na política, onde não se dava mal. A tal ponto que chegou a ser eleito para o Parlamento como membro do AKP, o mesmo partido conservador e religioso que é liderado por Recep Tayyip Erdogan, o todo-poderoso governador da pátria que já foi do Império Bizantino. Hoje, contado ninguém acredita, mas Sukur e Erdogan já foram grandes amigos.
O cenário transformou-se, e para muito pior no caso da glória turca da bola, quando o ex-futebolista começou a olhar de lado para os tiques ditatoriais daquele que também foi convidado de luxo no primeiro casamento do jogador que fez história no Galatasaray. Demitiu-se do partido, deixou o cargo no Parlamento e passou a ser carne para canhão das autoridades turcas. Desde mandados de captura, passando por contas bancárias congeladas, até notícias de uma alegada ligação terrorista. Valeu tudo e mais alguma coisa para dar uns pés de barro a um ídolo então unânime. E não se pode dizer que os esforços tenham sido em vão.
Em 2015, Sukur pegou na família e fugiu do país para destino desconhecido até há pouco tempo. Desde aí, não mais foi a casa, nem quando recebeu a notícia de que o pai, doente com cancro, foi levado para a prisão, onde ficou quase um ano. Nem é provável que volte nos próximos tempos. "Talvez no futuro vá lá visitar", limitou-se a dizer ao "The New York Times", quando não pairarem sobre ele ameaças de morte e promessas de prisão perpétua, faltou-lhe acrescentar. A vida, essa, segue numa pastelaria em Palo Alto. Dentro do possível, claro.