As férias dos portugueses custaram em média, este ano, mais 21% do que no ano passado, de acordo com três cenários analisados e calculados pelo JN.
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A família típica do Norte que passou uma semana no Algarve gastou quase mais 600 euros (41%), sendo a maior fatia absorvida pelo alojamento. O casal da mesma região que gozou uma semana na ilha da Madeira pagou mais 71% pelo automóvel alugado naquela semana e a fatura total ficou 500 quase acima face a 2021. E mesmo o grupo de amigos do Porto que se limitou a ir passar um dia na praia em Moledo, com piquenique para o dia e umas cervejas na esplanada, já pagou mais 19%, com a fatura da gasolina a pesar mais 32% que em 2021.
A recuperação do turismo e o aumento da procura, bastante acima das previsões das organizações internacionais do turismo ou do transporte aéreo, aliados à inflação que atingiu 8,7% em junho - mês em apreço nos cálculos JN, embora já tenha subido para 9,1 em julho - tornaram o preço das férias mais pesado para muitas famílias portuguesas. A pressão da procura por parte dos turistas nacionais está acima dos valores de 2019 (7%), juntando-se a dos estrangeiros (ainda 3,5% abaixo de 2019).
ocupação recorde
O alojamento e a restauração também dispararam este ano. De acordo com a Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP), em junho, os preços do alojamento subiram 40%, os dos restaurantes e hotéis aumentaram 15,7% e os dos restaurantes, cafés e similares estavam 7,6% mais caros. Entre os custos que mais pressionam os preços do setor estão, além dos combustíveis e a energia, a subida de 17,5% no salário mínimo face a 2019. No último ano bom para o turismo antes da pandemia, o salário mais baixo era de 600 euros; este ano é de 705 euros. A remuneração bruta mensal média por trabalhador nestes setores não subiu tanto (14,3%, de 1022 para 1139 euros), mas ainda está 117 euros acima de 2019.
A retoma inesperada continua a surpreender os empresários. No início de junho, o inquérito da Associação da Hotelaria de Portugal revelava que a média de reservas para o verão se situava entre 40% e 59%, com um preço médio a igualar o de 2019 nas regiões Centro, Lisboa e Norte e a superá-lo nas demais. Afinal, segundo os únicos dados que permitem avaliar a situação, nesta altura, da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve, os números de julho superaram os de 2019, com uma ocupação de quase 90% e uma subida de 17,2% nas vendas.
Transporte subiu
As férias organizadas e o transporte aéreo estão entre os mais inflacionados no último ano, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE): respetivamente, +35% e +88%, em junho. Nos cenários calculados pelo JN, as viagens aéreas aumentaram apenas 47% mas o preço médio inclui outras companhias aéreas além das nacionais, como os dados do INE.
Mesmo de carro, qualquer "escapadinha" de poucos quilómetros é inevitavelmente mais cara, uma vez que a gasolina já estava 32% mais cara em junho face ao mesmo mês do ano passado.
Até a poupar foi impossível gastar menos
A inflação encarece a energia, os combustíveis, os alimentos e também afetou o preço das férias dos portugueses. A maior procura por alojamento de verão impulsionou os preços das casas e da hotelaria. As viagens de avião e o aluguer de automóveis dispararam para preços impensáveis há um ano. Mesmo quem optou por férias mais modestas acabou por pagar em média mais 21% do que há um ano.
Cenário 1
Família de quatro ruma ao Algarve sem grandes luxos
Filomena foi passar uma semana ao Algarve, com o marido e os dois filhos, mas tentou economizar o mais possível: todas as refeições foram feitas em casa, a partir de compras no supermercado. Em alimentação, gastaram 300 euros há um ano, mas este ano as compras ficaram 40 euros mais caras. E os gelados na praia foram rejeitados.
"Os gelados que, em qualquer lado, custam um euro, na praia custavam 2,5 euros. Os cafés custavam 1,5 euros, por isso tomámos sempre em casa. A bola de Berlim, lá comemos pelo menos uma para não dizer que não havia bolas este ano, mas subiram para 1,7 euros, Estão muito caras!", reclamou a mãe de família.
Mas o que ficou bastante mais caro foi o alojamento. Há um ano, um apartamento na Quarteira custava 802 euros; este ano subiu para 1263 euros (57%), adiantou fonte do Imovirtual. As regiões de Faro e de Albufeira tiveram aumentos menos expressivos, de 2% e 6,5%, respetivamente. Já no Olx, os preços subiram em média 4,9% e o preço mais elevado para alugar um T2 por uma semana em junho deste ano foi de 1190 euros A família de Filomena tinha ficado num T1, há um ano, este ano ficou num T0 para poupar 200 euros.
A fatura dos combustíveis e das portagens pesou muito no orçamento da família. "Normalmente, um depósito de gasóleo dava para ir e ainda dar umas voltas. Este ano, ainda tivemos de meter mais e evitámos pegar no carro para dar passeios além das deslocações necessárias", acrescentou a mãe, que notou outras subidas nos preços face há um ano. "As cadeiras na praia estão a custar 23 euros ao dia e estavam cheias, não dá para entender. Salvo erro, há um ano custavam 17 euros. É claro que não gastei nisso", acrescentou.
Ao todo, e com todas as restrições, a família despendeu quase mais 600 euros do que teria gasto há um ano. "A continuar assim, não volto a fazer férias no Algarve, ninguém aguenta os preços e não vale assim tanto a pena", lamentou Filomena.
2021: 1427,7 euros
2022: 2008,95 euros
cenário 2
Casal do Porto passa semana na Madeira
Pedro e Margarida vivem e trabalham no Porto e, como já não contam com os filhos para as férias, aproveitam para conhecer um destino novo em cada ano. Ainda não tinham ido à Madeira, portanto decidiram rumar à ilha na última semana de junho.
Os bilhetes de avião não foram o mais caro, até porque aproveitaram uma companhia low cost cujos preços aumentaram apenas 47% face ao ano passado. O hotel de quatro estrelas também não foi excessivamente caro, uma vez que há bastante oferta de alojamento na ilha. No entanto, ficou cerca de 200 euros mais caro do que teria sido há um ano.
Porém, o aluguer do automóvel já foi "difícil e bastante mais caro que o esperado". A tarifa para uma semana no veículo mais económico custava, na mesma semana de 2021, cerca de 167 euros. Este ano, o negócio ficou por 286 euros (+71%). Ainda assim, se tivessem escolhido outro arquipélago teria sido pior. Em S. Miguel, nos Açores, "os preços são tão disparatados que chegam aos 300 euros por dia para as viaturas mais baratas. E há particulares a alugar o próprio carro para aproveitar o negócio", relatou Patrícia, que vive em Ponta Delgada. A falta de viaturas para aluguer será responsável pela inflação no "rent-a-car", uma vez que as frotas não foram reforçadas como habitualmente nos últimos dois anos. E "a procura repentina, este ano, depois da pandemia, tem sido muito intensa e inesperada".
Regressando à Madeira, o casal de turistas do Porto notou também o aumento de preços nos restaurantes, onde fizeram todas as refeições da semana. "Há um ano, gastámos uma média de 20 euros por cada um, por refeição. Este ano, a média subiu para quase 25 euros cada", lamentou a empresária, que não quis limitar as refeições aos locais mais económicos, mas admite que não se "meteram em luxos" para controlar os custos. As férias do casal acabaram por ficar quase mais 500 euros do que teriam custado na mesma altura do ano passado.
2021: 1758 euros
2022: 2256,5 euros
cenário 3
Um dia na praia de Moledo com piquenique
Jovens, solteiros e sem filhos, colegas desde os tempos da escola secundária, um grupo de amigos de Gondomar tem por hábito marcar um dia, todos os anos, para ir à praia passar momentos diferentes. Juntam-se na partilha de um carro, levam piquenique para alimentar o grupo e aceitam a indulgência de, a meio da tarde, beber cervejas numa esplanada.
O destino escolhido é, habitualmente, Moledo, a pouco mais de 100 quilómetros. Em junho, o litro de gasolina estava a 2,2 euros, por isso só a viagem ficou 32% mais cara do que em 2021, quando o mesmo combustível custava 1,6 euros. E o grupo seguiu sempre por estradas nacionais, para poupar nas portagens.
A fatura do piquenique - sandes de queijo, sumos, fruta e batatas fritas - ficou dois euros ou 13% mais cara este ano. E beber cervejas na esplanada, ainda que só tenha aumentado 10% face há um ano, custou mais 1 euro.
2021: 38,78 euros
2022: 46,13 euros