José Sócrates defende hoje, domingo, numa entrevista ao jornal espanhol El País, a decisão de usar a golden share para vetar a compra da participação da PT na Vivo pela Telefónica. Diz que a Comissão Europeia tem mantido nesta matéria "posições ideológicas ultraliberais".<br />
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Na entrevista, realizada na noite de quinta-feira e publicada na edição de hoje, domingo, do diário de referência, o primeiro-ministro argumenta que a acção do Estado respeitou a lei e foi uma decisão "racional" e não política em defesa dos interesses estratégicos da PT.
Centrada exclusivamente no negócio PT-Vivo, a entrevista inclui várias questões sobre a possibilidade do Tribunal Europeu vir a decidir, este mês, que o uso das "golden shares" é ilegal, um cenário que José Sócrates recusa antecipar.
Sobre as criticas já formuladas pela Comissão Europeia sobre esta matéria, o chefe do Executivo considera que Bruxelas não tem razão, porque o Estado não se outorgou quaisquer direitos especiais na PT.
José Sócrates recorda que esses direitos foram "decididos de forma privada pela assembleia geral de accionistas da PT" e de acordo com as regras de funcionamento das sociedades comerciais".
Para o primeiro-ministro português, a queixa da Comissão Europeia reflecte algum preconceito contra a posição accionista dos Estados, uma postura que não é apenas económica, mas ideológica.
"Penso que as posições da Comissão Europeia, de há muitos anos, derivam não apenas de posições económicas, mas também de posições ideológicas ultraliberais contra a presença do Estado", afirma José Sócrates.
"Em muitas das empresas que desempenham um papel importante nas economias, como por exemplo as de energia e telecomunicações, os direitos especiais dos Estados são uma boa forma, uma forma light de preservar o interesse geral para o ter em conta nas decisões estratégicas das empresas", argumenta.
José Sócrates rejeita que o Estado tenha actuado contra a posição dos accionistas insistindo que cada um "vota conforme a sua própria vontade. Eu não estou a violar nenhuma vontade dos accionistas, mas que os accionistas não violem a vontade do Estado", diz.
O primeiro-ministro explica ter usado a "golden share" a pensar "nos interesses estratégicos da PT" e lamenta que a Telefónica "não tenha negociado com a direcção da PT", especialmente tendo em conta a própria história da Vivo, que "começou com um investimento da PT no Brasil, numa decisão estratégica que então foi muito criticada, em 1998".
"Mais tarde, a PT convidou a Telefónica a ser sua parceira com 50%. A Telefónica não tem o direito natural de tomar o controlo da Vivo", afirma, adiantando que respeita a posição do presidente executivo da PT, Zeinal Bava, de discordar do uso da "golden share".
"Os estatutos são a lei da empresa. Todos os conhecem há 15 anos. E não me recordo de nunca ninguém ter apresentado uma proposta na assembleia geral para modificar os estatutos", refere.
Sócrates diz não conhecer qualquer plano alternativo de desenvolvimento da PT, caso avançasse com o negócio e, questionado sobre se a decisão o deixar sozinho, o primeiro-ministro português defende-se dos ataques que lhe têm sido feitos.
"Qualificar de colonialismo o investimento de Portugal no Brasil é ridículo. Não tenho medo da solidão na hora de tomar decisões. Um primeiro-ministro não pode deixar-se encurralar. Nenhum Governo gosta que lhe dobrem o braço. Um primeiro ministro não pode deixar-se encurralar", disse.
Questionado sobre se o seu homólogo espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, o apoia na decisão, José Sócrates diz que o que falou com o líder espanhol "é um assunto privado", mas que a defesa dos interesses nacionais "não afecta" o relacionamento com o chefe do Governo em Madrid.