Albuquerque Foudation: novo museu em Sintra exibe coleção única de porcelana chinesa
Uma singular coleção privada, com mais de 2600 peças de porcelana chinesa de exportação - muitas delas encomendadas por Portugal - das dinastias Ming e Qing pode agora ser admirada por todos, sob um olhar contemporâneo. A Albuquerque Foundation fica a meia-hora de Lisboa.
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Um prato pintado com duas mulheres persas, da dinastia Ming (de cerca de 1640), um jarro de vinho em forma de mulher a dançar, da dinastia Ming (final do século XVI) e uma terrina em forma de caranguejo em base fixa, da dinastia Qing (cerca de 1770) são algumas das peças em destaque na coleção reunida ao longo de mais de seis décadas pelo colecionador brasileiro Renato de Albuquerque. E que, apesar de ser considerada uma das mais relevantes “coleções privadas do Mundo de porcelana chinesa imperial e de exportação”, não tinha ainda sido vista.
Pelo menos, não na totalidade. Algumas peças já haviam sido emprestadas a instituições como o Metropolitan Museum of Art de Nova Iorque e o Victoria & Albert Museum, em Londres, mas a “coleção no seu todo nunca tinha sido exposta”, tendo sido mantida em privado até a família do colecionador “decidir que seria interessante poder partilhá-las com o público, a pensar no futuro das peças”, explica à Evasões Mônica Novaes Esmanhotto, diretora de assuntos institucionais da Albuquerque Foundation, cuja sede abriu portas em fevereiro numa quinta em Linhó, Sintra.
A Quinta de São João, datada do final do século XVIII, era usada como casa de veraneio desde os anos 1980, altura em que o engenheiro civil de São Paulo, hoje com 97 anos, estendeu uma parte dos negócios para Portugal. A atual fase “fértil, do ponto de vista académico, institucional, do colecionismo e do mercado de arte”, diz a responsável, foi outra das razões determinantes na decisão de levar a coleção para Sintra, já que as próprias peças têm grande ligação com a história do país e o “interesse por porcelana e cerâmica chinesas no Brasil é quase incipiente”.
Convicta de que o projeto honra a obra do avô, a cofundadora Mariana A. Teixeira de Carvalho acrescenta que a coleção “suscita o diálogo e a criatividade em torno da cerâmica como prática artística”, enquanto propõe, ao mesmo tempo, uma leitura contemporânea sobre o conjunto das 2600 peças (a maioria dos séculos XVI e XVIII), que ajudam a refletir sobre questões tão atuais como a globalização e o capitalismo. Jacopo Crivelli Visconti, curador italiano a viver em São Paulo, dirige a fundação.
Para não roubar o protagonismo aos jardins, que descem da casa pintada de terracota como num anfiteatro, com o mar ao fundo, o projeto do ateliê paulista Bernardes Arquitetura optou por enterrar parte da estrutura principal, convidando os visitantes a descer uma escada em caracol até à exposição. O telhado, que acompanha o declive do terreno, e os caminhos retilíneos ligam o contemporâneo e o antigo. Já o pavilhão secundário, num dos extremos do jardim, acolhe as exposições temporárias de arte moderna, que dialogam com a exposição.
A fundação vista à lupa
A exposição principal
A coleção permanente, patente, nesta versão, até 30 de agosto de 2026, tem a curadoria da autora e académica norte-americana Becky MacGuire. Intitulada “Connections”, parte das ligações culturais e humanas entre povos, plasmando-as em três núcleos temáticos: “Reino Espiritual”, “Encontros” e “Vida no Oriente e Ocidente”, sem ordem específica de contemplação. As 260 peças - entre jarras, castiçais, porta-pincéis, pratos, garrafas, taças, cisternas, bacias, relicários, entre outros objetos da Coleção Albuquerque de Cerâmica Chinesa - datam entre os séculos XVI e XVIII (sobretudo dos períodos Ming e Qing) e representam o espólio da coleção, balizada, no global, entre o século XX a. C. e o século XX. Produzidas em fornos milenares na China, as peças seguiam para a Ásia Oriental, o Sudeste Asiático, o Médio Oriente e Europa.
A exposição temporária
Theaster Gates, ceramista e urbanista de Chicago, assina a primeira exposição do pavilhão da programação contemporânea com uma série de esculturas por si produzidas, colocadas lado a lado com peças da Coleção Albuquerque que o próprio selecionou. O espaço, minimalista, tem no próprio chão uma instalação artística, composta por 7.600 azulejos de cerâmica negra feitos em Tokoname, no Japão (onde o artista estudou olaria, há 21 anos), expostos pela primeira vez na Europa. Uma das suas influências - Dave Drake, um ceramista escravizado no sul dos EUA, que gravava a sua assinatura nas peças, algo proibido, e esteve ativo até aos anos 1870 - está refletida na peça escultórica “Signature Study’ (2020), que apresenta a sua própria assinatura. A exposição “Theaster Gates: A Mão Sempre Presente” vai estar disponível até final de agosto.
A loja, biblioteca e restaurante
Esta não é uma vulgar loja de lembranças: quer ser uma extensão do museu, dando espaço ao que de melhor produzem cerca de 20 artistas e marcas em Portugal, em termos de porcelana e cerâmica, da mais utilitária à mais concetual. Teresa Pavão, Graça Pereira Coutinho e o Studio Eeme são alguns dos nomes presentes. Na sala seguinte localiza-se a biblioteca especializada, com cerca de um terço dos 1600 livros do colecionador. Os momentos de pausa podem fazer-se no café/restaurante Albú, gerido pelo grupo Paradigma, cuja oferta inclui pão da padaria Isco e itens de pastelaria, tostas, sopa do dia, saladas e bowls, focaccias, flatbreads, panquecas, com várias opções vegetarianas. Acompanha o mesmo horário do museu, de terça-feira a domingo.
Albuquerque Foundation
Rua António dos Reis, 189 (Linhó), Sintra
Tel.: 219 231 370
Web: albuquerquefoundation.pt
De terça-feira a domingo, das 10h às 18h. Encerra à segunda.
Entrada: 10 euros/adulto; 8 euros/estudantes e jovens até 18 anos e maiores de 65; gratuito até
aos 12 anos e para residentes em Sintra, aos domingos até às 13h.
As visitas podem ser livres ou guiadas.

