Sabemos que ele vem, mas nunca estamos preparados. Depois das estivalidades, a mesa volta a ser o tom de reunião com familiares e amigos. Começamos a acender as lareiras pelo país fora e voltamos às sopas e caldos do nosso conforto. E como em todas as estações do ano, temos muitas razões para nos alegrarmos, e vinhos a condizer.
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O cair da folha desperta na maioria das pessoas sentimentos menos positivos, mas motivos não faltam para nos alegrarmos. Os enófilos que frequentam as páginas da Evasões sabem que no vinho não há tempo para dias cinzentos.
A escolha que lhe propomos foca-se mais no vinho tinto, mas há algumas exceções. Vai gostar de saber que acaba de ser lançado um varietal que pode bem ser o melhor Tinta Caiada que já provou. Vem do Alentejo, assim como um tinto de Portalegre e um Alicante Bouschet do Baixo Alentejo.
Do Dão vem um branco que contraria todas as modas e põe-nos a comer queijo à lareira, ou carne de porco à alentejana à mesa. Proposta muito séria chega-nos de Trás-os-Montes, num tinto vigoroso e alguns anos de evolução. Temos igualmente um grande vinho do Porto para lhe propor e para se mimar, que também merece. Mais dois vinhos do Douro feitos com muito talento por mãos sábias e experimentadas.
Depois, um belo tinto alentejano, para acompanhar o seu pato assado com laranja. E terminamos com um rosé muito especial, estreme da casta Tinto Cão.
Surpresas e boas ideias não faltam nesta seleção que lhe propomos. Boas provas!
Cardeira Tinta Caiada
Alentejo tinto 2023 (15%) | Herdade da Cardeira 29 euros
Pontuação*: 18
Erika e Thomas Meier apaixonaram-se pelo Alentejo, tal foi a atração que em 2010 o terroir da Orada, junto a Borba, exerceu no casal suíço. Nos 100 hectares da Herdade da Cardeira, a vinha ocupa 21 hectares e os vinhos feitos até hoje são francamente encorajadores. Este varietal de Tinta Caiada, casta antiga que já pouco se encontra, é fascinante. Corpo de fruta conciso, amargos perfeitos, e madeira impercetível. O elevado grau alcoólico sente-se na prova, mas não prejudica a impressão de frescura. Excelente entendimento com o enólogo Paulo Laureano.
Tapada da Fonte Reserva
Alentejo tinto 2023 (14,5%) | Pista Wines 35 euros
Pontuação*: 18
Uvas provenientes de vinhas em Alter do Chão, altitude cerca de 400 metros. Fermentação em inox, estágio de 12 meses em barricas novas de carvalho francês. Encepamento Touriga Nacional (50%) e Alicante Bouschet (50%). Aromas cítricos e de bagas de arbusto maduras. Nariz eminentemente cítrico, boca viva e fresca. Ameixa preta, chocolate e laivos de alcaçuz. Ligação excelente com um bom ensopado de borrego à alentejana. Pelas impressões de prova, também irá bem com sobremesas de chocolate negro.
Herdade do Rocim Alicante Bouschet
Alentejo tinto 2024 (14%) | Herdade do Rocim 14 euros
Pontuação*: 17
Solos eminentemente xistosos. Uvas provenientes de vinhas próprias. Desengace com ligeiro esmagamento do bago. Pisa a pé e fermentação em lagar de pedra. Estágio de oito meses em barricas de carvalho francês. Nariz franco, notas de cereja e ameixa preta. Impressões balsâmicas de esteva e folha de eucalipto. Na boca há notas mentoladas e frutadas, a que acresce chocolate negro, formando um corpo autónomo, que viaja coeso e vagaroso para um final feliz, frutado e floral. Excelente companhia para lombo de porco assado com ameixas.
Casa de Santar Reserva
Dão Branco (13,5%) | Global Wines 16 euros
Pontuação*: 17,5
Este fantástico vinho branco representa muito do que normalmente classificamos como branco de inverno. Produzido a partir de uvas das castas Encruzado, Arinto e Malvasia Fina, este vinho corporiza um trabalho enológico excecional de Paulo Prior, que nos habituou já ao melhor. Esmagamento suave e fermentação em inox a baixa temperatura. Metade do vinho resultante estagiou seis meses em barricas de carvalho francês de tosta suave. Excelente com queijo Serra da Estrela amanteigado, maravilhoso com carne de porco com amêijoas.
Palácio dos Távoras Vinhas Velhas Grande Reserva
Trás-os-Montes tinto 2020 (14,5%) | Costa Boal 28 euros
Pontuação*: 18,5
Estamos perante um grande vinho transmontano marcado por forte mineralidade, e que apesar de ter já cinco anos não mostra qualquer sinal de decaimento fenólico. Esta é a primeira perplexidade que anoto, e a virtude vai toda do incrível solo de Trás-os-Montes onde as vinhas velhas estão. Além de não haver qualquer tipo de aramação, o sistema radicular é muito profundo. Estágio de 14 meses em barricas novas de carvalho francês. Apesar da austeridade que apresenta, este vinho notável é muito elegante e fresco. Excelente para perdiz estufada.
Quinta do Noval Nacional
Vintage Porto 2023 (19,5%) | Quinta do Noval 1200 euros
Pontuação*: 19,5
É um misto de devoção e entusiasmo, a emoção que se desenvolve quando se prova um grande vinho do Porto como este. O designativo Nacional significa que as uvas são provenientes de um pequeno talhão da quinta de cepas nacionais, ou seja, sem enxertia em porta-enxerto americano, operação que ainda hoje é feita como prevenção da filoxera. Touriga Nacional, Touriga Francesa, Tinto Cão, Tinta Roriz e Sousão são as castas mais importantes do blend. O desempenho no palato é brilhante, evoluindo muito devagar e sempre em elegância.
Pedro Milanos Reserva
Douro tinto 2023 (14%) | Maria Luísa Valente 30 euros
Pontuação*: 17,5
Não é a primeira vez que falo do génio do enólogo Vasco Valente Lopes, e este excecional vinho é ocasião mais que apropriada para voltar a avaliar o seu trabalho. A forma como integra entre si as partes de um lote é desafiante e exprime conhecimento íntimo das artes enológicas. Produzido a partir de uvas da quinta Senhora da Graça das castas Touriga Nacional e Tinta Roriz. Pisa a pé em lagar, onde fermentou. Estágio de 12 meses em barricas de carvalho francês. Comportamento sublime com galinhola estufada com foie gras.
Quevedo Clarete Tinta Amarela
Douro tinto 2024 (11,5%) | Quevedo Wines 21 euros
Pontuação*: 17
Vinho de uma série especial, designada Q-Lab por Óscar Quevedo, e que indicia de alguma forma o carácter experimental do vinho em questão. Este chama contudo a atenção pela firmeza e consistência da proposta. Começa por ser um vinho de grande elegância, e feito a partir de Tinta Amarela em estreme. Depois, é bastante moderado no álcool. E tem uma cor muito aberta, a fazer lembrar Pinot Noir. Acontece que o comportamento em boca é estável, a oferecer um comprimento de prova fascinante. Muito bom com linguado grelhado no carvão.
Dona Maria Reserva Touriga Nacional/Petit Verdot
Alentejo tinto 2020 (14,5%) | Júlio Bastos 23 euros
Pontuação*: 17,5
Sandra Gonçalves é uma das mais brilhantes enólogas do país. Aqui, na Dona Maria tem um entendimento quase telepático com o produtor e tem vindo a desenvolver um portfólio de gabarito a partir das vinhas da propriedade. Este vinho é um caso de estudo e ganha dimensão especial no espaço outonal. Num blend muito original, junta Touriga Nacional e Petit Verdot. A primeira acentua a tonalidade cítrica no nariz, enquanto a segunda contribui com sugestões de vagem de ervilhas. Juntas criam um bouquet interessante. Excelente para pato assado com laranja.
Kopke São Luiz Winemaker"s Collection Tinto Cão
Douro rosé 2024 (12,5%) | Sogevinus 17 euros
Pontuação*: 17
A casta Tinto Cão é conhecida pela maturação tardia e na Quinta de São Luiz, em pleno Cima Corgo, esse é um factor crucial. A escolha do enólogo Ricardo Macedo está por isso justificada e vai mais além, instalando a ousadia num estilo normalmente direto como é o rosé. Aqui, isso não acontece. Aromas terrosos a cogumelos frescos e sugestões frutadas de cerejas. Impressão de boca profunda e consistente, a pedir pratos proteicos e gordos. Há que pôr tudo em causa para encontrar a harmonização ideal. Caril de frango à goesa irá muito bem com este rosé tão especial.
*Pontuação de 0 a 20