Agente que mobilizou polícias quebra silêncio: "Pensem nas consequências das vossas ações"
O polícia que está a mobilizar, desde domingo, milhares de elementos da PSP, da GNR e da Guarda Prisional em protesto por melhores condições salariais e de trabalho quebrou, pela primeira vez, esta quinta-feira, o silêncio para alertar os profissionais das forças de segurança que todas as ações têm "consequências".
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"Antes de agirem, o que escrevem, o que dizem ou que fazem, pensem nas consequências das vossas ações", afirmou Pedro Costa num vídeo difundido nas redes sociais, em que pede "desculpa" por se ter ausentado da Assembleia da República, onde está concentrado em vígilia desde o último domingo, para "tratar de um assunto pessoal inadiável" não relacionado com o protesto.
"Está tudo bem. E volto a dizer que está tudo bem. Não precisam de se preocupar", garantiu o agente de 32 anos, na PSP há cinco, prometendo regressar esta sexta-feira de manhã à "luta".
"Quero dizer que sou só uma gota no oceano. Não é por eu não estar presente, como no dia de hoje, por exemplo, que algo vai acabar. (...) Isto não é um sprint, é uma maratona. Vão haver alturas em que vamos ter dúvidas ou vamos querer baixar os braços e desistir. Vai ser nestas alturas que vamos mostrar quem somos", continuou, agradecendo, de seguida, a todos os "camaradas" das várias forças e serviços de segurança que se têm deslocado à Assembleia da República para o apoiar.
No vídeo, e aludindo a grupos criados no WhatsApp e Telegram, o polícia recordou que nos chats de conversação, onde cresce a "luta" de forma inorgânica, estão presentes "polícias, cidadãos e cidadãos que não gostam de polícias". Por isso, pediu contenção nas palavras e nos atos.
No domingo, o agente, natural de Alcácer do Sal, iniciou uma vigília em frente ao Parlamento, por considerar que os polícias têm sido negligenciados, sobretudo, "no que toca aos vencimentos", que apelidou de "low-cost". "Não existe vontade por parte dos nossos políticos em resolver este grande problema de todos nós. Se não fizermos nada, irá continuar tudo na mesma", disse, afirmando que só existem "duas opções": "continuar com as mesmas estratégias (comunicados e frases bonitas)" ou "fazendo ver que os vencimentos auferidos são indignos e injustos".
Mas, afinal, quem é Pedro Costa? Frequentou o 14.º curso de formação de agentes, sempre prestou serviço no Comando de Lisboa e intitula-se como uma "criança de mãos e pés atados no mundo da polícia". Num primeiro vídeo publicado no domingo e dirigido aos elementos das forças de segurança, diz estar na mesma situação que "todos": "escravo do trabalho, entre serviços e remunerados, e mal-pago". Acrescenta também que não quer "substituir o trabalho dos sindicatos", mas é crítico das formas de luta que estes utilizam e que têm ao seu dispor.
Quer, então, ser um mártir ou ter protagonismo? "Já temos muito disso na instituição", aclara, ciente de que o possam considerar um "maluco". "Muito se fala em coragem e medo. Se por um lado, temos a coragem e não temos o medo de enfrentar as diversas ocorrências mais perigosas, que põem em risco a nossa integridade física, por outro, vivemos neste clima de medo onde não se pode fazer nada que não siga a linha que alguns consideram correta", afirma, criticando a "distribuição gratuita de processos disciplinares", "por parte de quem manda", sem terem consideração "que somos pessoas, e não mártires".
A contestação dos elementos da PSP, da GNR e da Guarda Prisional teve início há já algum tempo após o Governo ter aprovado, em 29 de novembro, o pagamento de um suplemento de missão para as carreiras da Polícia Judiciária, que, em alguns casos, pode representar um aumento de quase 700 euros por mês.
As estruturas da PSP e da GNR sempre manifestaram indignação por este tratamento que consideram "desigual e discriminatório". Houve até quem criasse uma petição. Também o diretor nacional da Polícia Judiciária, Luís Neves, defendeu a revisão das condições salariais das restantes forças e serviços de segurança, assegurando estar solidário com as críticas.
Já o presidente da Republica promulgou o diploma do Governo que regula o pagamento do suplemento de missão para as carreiras da Polícia Judiciária, mas instou o próximo executivo a corresponder à "justa insatisfação" das outras forças policiais.
Marcelo Rebelo de Sousa lembrou que a aprovação daquele diploma "suscitou desde logo uma verdadeira onda de insatisfação e de contestação por parte dos sindicatos e das associações representativas de outras classes das forças de segurança" por causa do "alegado tratamento desigual" e "à invocada discrepância e disparidade de valores a auferir por uns quando comparados com outros".