Cadastrado deu boleia a vítima de violência doméstica até ao posto da GNR para apresentar queixa. Tribunal da Relação considerou ato "nobre" e reverteu pena efetiva de prisão.
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O Tribunal da Relação de Guimarães suspendeu a pena de oito meses de prisão a um homem de Valpaços, desempregado e com 40 anos, que tinha sido condenado a uma pena efetiva em primeira instância por conduzir sem carta pela 17.ª vez. A Relação foi indulgente porque levava uma mulher, vítima de violência doméstica, ao posto da GNR.
Sérgio P., natural de Sanjozenda, é um velho conhecido da GNR de Valpaços. Até já teve carta de condução, mas ficou sem ela. A última vez que foi apanhado a conduzir sem carta foi em 26 de dezembro. Sérgio estava em liberdade condicional havia três meses e deu boleia a uma vizinha que queria ir ao posto da GNR apresentar queixa por violência doméstica. Pegou no seu Opel Corsa e lá foi com a vizinha ao posto de Valpaços, mas já não saiu de lá. Ficou detido por não ter carta.
"Nobre sentimento"
Em julgamento, no Tribunal de Valpaços, Sérgio foi condenado a oito meses de prisão efetiva, mas a Relação de Guimarães suspendeu recentemente a pena, apesar das inúmeras condenações por condução ilegal.
Para a indulgência contribuíram vários fatores, segundo se lê no acórdão dos desembargadores de Guimarães. Primeiro, os juízes tiveram em conta o facto de Sérgio ter conduzido ilegalmente quando ajudava a vizinha vítima de violência doméstica. Demonstrou um "nobre sentimento de solidariedade e de cooperação na erradicação de um fenómeno que a comunidade, justificadamente, vem rejeitando com grande alarme", que é o da violência doméstica.
Depois, em julgamento, Sérgio confessou "integralmente e sem reservas" os factos de que estava acusado. Há ainda o facto de ter experiência em condução, pois já teve carta, o que "mitiga o grau das exigências de prevenção", referem os juízes.
Por fim, Sérgio sofre de depressão, uma patologia que "apenas sairá prejudicada com o cumprimento da pena", acrescenta o acórdão, entendendo que "a censura da sua conduta e a ameaça da prisão bastarão para evitar que volte a conduzir sem habilitação".
Sérgio foi apanhado a conduzir sem carta pela primeira vez em 2002. No ano seguinte foi detido mais cinco vezes, outra em 2005, mais uma em 2006, oito vezes em 2009 e, agora, a última em 2018.
Dos 16 crimes por condução sem habilitação legal, foi condenado a duas penas de multa e 14 penas de prisão, algumas das quais efetivas.
PORMENORES
Registo criminal extenso
Para além das condenações por conduzir sem carta, Sérgio foi sentenciado por outros crimes como furto, dano, coação sexual, ofensa à integridade física, desobediência qualificada, condução em estado de embriaguez, roubo, furto qualificado, ameaça agravada, violação de domicílio e denúncia caluniosa.
Pediu à GNR para "fechar os olhos"
A relação entre Sérgio e as autoridades de Valpaços já é antiga. Numa das vezes que foi apanhado a conduzir sem carta, pediu à GNR "para fechar os olhos quando o visse a passar de carro numa próxima ocasião", disse fonte próxima da GNR.
Situação modesta
A situação socioeconómica de Sérgio é considerada "modesta" pelo tribunal. Vive com os pais, recebe o rendimento social de inserção no valor de 187 euros mensais e completou o 9.º ano de escolaridade. Tem problemas de saúde, entre os quais uma patologia do foro depressivo para a qual toma medicação.
NÚMEROS
13 vezes condenado em tribunal
Sérgio P. foi condenado 13 vezes a penas de prisão pelos vários crimes que já cometeu nos últimos anos. A maioria das condenações reportam-se ao crime de condução sem habilitação legal.
8 crimes semelhantes no mesmo ano
Em 2009, Sérgio P. foi condenado a pena de prisão pela prática de vários crimes, entre eles oito de condução sem habilitação legal.