O JN ouviu os advogados Carlos Melo Alves e Paulo Saragoça da Matta para tentar perceber o enquadramento legar para os crimes de que é acusado o estudante da Batalha suspeito de tentar matar colegas na Universidade de Lisboa. As opiniões divergem.
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Se queria matar para se vingar não é terrorismo
"Para saber se é terrorismo, é necessário saber qual o objetivo do ato, se há uma ideologia por trás", afirma o advogado Carlos Melo Alves. "Se o objetivo era matar várias pessoas em nome de uma religião ou política, aí é claro que sim. Mas será que era assim? Se o objetivo fosse matar várias pessoas, por exemplo, para se vingar de ser alvo de bullying, absolutamente não", considera o jurista, que representou um dos arguidos acusados de terrorismo no caso Alcochete. Melo Alves explica que Portugal tem uma lei que no crime de terrorismo "enquadra de uma forma mais abrangente várias condutas". Ao ter este conceito mais vago, permite interpretações erradas, como se verificou na acusação de terrorismo após a invasão de elementos da Juve Leo à Academia do Sporting. Nesse caso, depois, "de forma correta, o tribunal emendou a mão" e deixou cair esse crime. Tendo por base o que se conhece até agora do caso, Melo Alves diz ainda nem sequer se pode falar em atos preparatórios, apenas em intenção criminosa. "O facto de ele ter armas é um crime de uso e posse de arma ilegal. Mesmo que tivesse anunciado a intenção de matar pessoas ainda podia ter mudado de ideias. Para haver atos preparatórios teria de ter avançado para a concretização do crime", afirma o advogado.
Qualquer motivação pode ser terrorismo
"Todos os indícios permitem admitir, em abstrato, que estamos a falar de terrorismo", garante Paulo Saragoça da Matta. O penalista esclarece que após a mudança da lei, em 2013, deixou ser necessária uma motivação política para este crime. "Quer internacionalmente, quer na nossa lei interna, o conceito de terrorismo passou a ter uma base mais alargada. Continua a ser possível uma motivação política mas também admite uma outra motivação qualquer: ideológica, económica, social ou cultural", afirma. O advogado realça que, ao planear um crime de terrorismo, falamos em atos preparatórios que são equivalentes ao crime consumado. "Há uma antecipação da tutela do bem jurídico que permite uma punição mesmo sem que haja homicídio. Não pressupõe que haja um resultado específico. Basta que haja um caminho que levaria a causar danos generalizados a bens jurídicos protegidos como a vida". E dá um exemplo: "se eu quiser envenenar alguém, não sou punido por comprar o veneno; só quando o misturar na comida. No terrorismo, já sou punido só por comprar a gasolina ou gás que iria usar no crime". Saragoça da Matta explica que isto sucede porque o bem jurídico em causa é tão importante que o plano tem de ser travado o mais atempadamente possível, mas o crime é tão grave que deve ser punido com a mesma gravidade como se fosse concretizado.