Desde maio que, à paisana, quatro brigadas da PSP disputam diariamente um jogo do gato e do rato com os carteiristas de Lisboa. Perseguição é feita de carro e a pé.
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Quando, em pleno Terreiro do Paço, em Lisboa, dois agentes da PSP à paisana chegaram ao pé de Margaret Clarricoates e lhe devolveram a carteira tirada da sua mala momentos antes, a turista inglesa, de 67 anos, ficou surpreendida.
Afinal, nem se apercebera de que acabara de ser roubada por duas mulheres com quem se cruzara na passadeira e contra quem decidiu, ao saber o que se passara, apresentar queixa na esquadra, apesar do receio de um amigo turco. "Não entres no carro. Sabes lá se são mesmo polícias", disse-lhe, desconfiado, sem saber que fora testemunha do desfecho de mais um episódio do jogo do gato e do rato que, diariamente, carteiristas e polícias disputam no Centro Histórico da capital.
Numa zona da cidade bastante procurada por turistas, o segredo é, para os dois lados da barricada, parecer só mais um visitante entre tantos outros - ainda que, dada a elevada frequência com que cada carteirista é apanhado, presa e caçador já se conheçam quase de cor.
Naquela dia de dezembro, foram detidas duas mulheres algo desconhecidas, mas, durante a perseguição que a precedera, não faltaram menções a velhos conhecidos e ao seu método de atuar há meses, anos ou, até, décadas. Quase sempre de olho no elétrico 15 ainda que, por fim, algumas movimentações inesperadas tenham obrigado a equipa acompanhada pelo JN a abandonar o carro e a misturar-se na multidão, à espera de apanhar as duas suspeitas em flagrante delito.
UM JOGO DE PACIÊNCIA
Ao todo, são quatro as brigadas da 1.ª Esquadra de Investigação Criminal que, desde maio, saem por turnos à rua em automóveis descaracterizados e sem farda, rotativamente apoiadas por elementos de outras unidades, essenciais para o fator surpresa. É, porém, na véspera que, explica o seu comandante, Nélson Silva, a informação é analisada e escolhido o alvo da operação.
Desta vez, a opção é pelos elétricos. O carro é igual a tantos outros que circulam por Lisboa, mas o seu percurso é feito ao ritmo do elétrico 28, no sentido Martim Moniz- Prazeres. A atenção está centrada em quem entra e sai do transporte mais turístico da capital até que, por telefone, chega a indicação dos agentes apeados de que é noutro ponto que os carteiristas se estão a juntar.
O 28 é então ultrapassado e o 15, que liga a Praça da Figueira a Belém, torna-se no alvo. Mas, agora, é tempo de ser paciente e estacionar o carro... sem deixar de controlar as operações.
SEM PERDER A PRESA
"Estão a concentrar-se em frente ao Mercado da Ribeira", "devem ir fazer um arrastão", "o Zé do Porto entrou no elétrico", "atenção, que o método dele não é esse", "há duas que entraram no sentido oposto, para a Praça da Figueira", "deve ser para entrarem logo no início", "vamos para lá", ouve-se, a espera já trocada por trajetos acelerados até ao Terreiro do Paço.
As duas carteiristas estão identificadas, mas, para já, é preciso seguir os seus passos a pé. Os dois agentes separam-se, entram nas lojas, fingem estar interessados no que se vende nas bancas de Natal instaladas na Rua Augusta. Ao mesmo tempo, testemunham duas tentativas frustradas. Elas regressam à Praça do Comércio e eles também, sem perder de vista a presa que, enfim, consegue apropriar-se da carteira de Margaret Clarricoates e dirigir-se para a paragem mais próxima.
Quando são intercetadas, o porta-moedas estava prestes a ser deitado ao lixo. Mas é já demasiado tarde: perante a surpresa de quem por ali passa, são algemadas enquanto aguardam pela carrinha que as levará até à esquadra da Palma. Desta vez, o gato levou a melhor.