As autoridades acreditam que, em dezenas de contratos de futebolistas, houve falsas prestações de serviços de intermediação pagas por clubes. O objetivo seria empolar custos para diminuir impostos a pagar e desviar dinheiro de forma oculta.
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A Autoridade Tributária (AT) e o Ministério Público (MP) têm na mira um alegado esquema de comissões-fantasma milionárias pagas por clubes de futebol que passava pela emissão de faturas de serviços de intermediação fictícios. Este e outros artifícios contabilísticos terão permitido uma fuga ao Fisco de cerca de 40 milhões de euros, em negócios que totalizam 200 milhões.
De acordo com informações recolhidas pelo JN, uma das linhas de investigação do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) - que, com a AT e a GNR, realizou uma série de buscas sem precedentes no futebol português - prende-se com falsas prestações de serviços de intermediação na compra e venda e de negociação de contratos de jogadores de futebol. O esquema passará pela introdução de terceiros no negócio, entre as SAD dos clubes, os jogadores e os agentes. São empresas, muitas vezes sediadas no estrangeiro, preferencialmente em paraísos fiscais. Oficialmente, a empresa, representada por um advogado ou mesmo até por uma outra sociedade, passa uma fatura de prestação de serviço de intermediação que, para as autoridades, não é real. O objetivo era aumentar os custos do negócio para diminuir IVA e IRC a pagar. Por outro lado, também permitiriam fazer "desaparecer" o dinheiro de forma oculta, aproveitando as contas bancárias das offshores.
Por outro lado, os clubes pagaram avultadas verbas a agentes por supostos serviços prestados que, na verdade, consistiam na representação dos futebolistas. Na ótica do Fisco, era a estes que competia a obrigação de pagar (ver infografia).
Jorge Mendes, figura central
O objetivo da megaoperação foi recolher o máximo de documentos sobre todas as transferências e contratos dos clubes visados e os negócios de Jorge Mendes.
Agora, a missão das autoridades passa pela minuciosa análise dos documentos apreendidos, para consolidar as suspeitas sobre os negócios milionários de dezenas de jogadores.
Nos 20 inquéritos que levaram as autoridades a realizar perto de 60 buscas nas SAD do Benfica, F.C. Porto e Sporting, além de Sp. Braga, V. Guimarães, Portimonense e Estoril, estão em causa cerca de 200 milhões de euros de negócios considerados suspeitos e que remontam a 2015. Existem fortes indícios de fraude fiscal e branqueamento de capitais.
Foram constituídas arguidas 23 pessoas singulares e 24 sociedades. São futebolistas, agentes, advogados e ainda dirigentes dos clubes.
Dois dos principais visados foram o empresário Jorge Mendes e o seu advogado Carlos Osório de Castro. Os diversos escritórios dos dois homens foram alvo de buscas por parte do Fisco e até o juiz Carlos Alexandre acompanhou pessoalmente as diligências no gabinete do advogado, na Avenida da Boavista, no Porto.
Presidentes na mira
As casas dos dirigentes Luís Filipe Vieira, Pinto da Costa, Frederico Varandas (por questões da anterior gestão do clube) e António Salvador foram alvo de buscas. Segundo apurámos, os seus telemóveis e computadores pessoais foram apreendidos. As buscas às residências dos dirigentes foram rápidas, até porque nenhum teria documentação em casa.
Pinto da Costa e Salvador deslocaram-se aos respetivos estádios, para acompanhar as diligências das autoridades.
Buscas
300 elementos
Para realizar as buscas nos diferentes locais, foram necessários perto de 300 elementos da Autoridade Tributária, da GNR e da PSP.
Magistrados
As buscas foram acompanhadas por 11 procuradores do DCIAP e sete juízes, um deles Carlos Alexandre, do Tribunal Central de Instrução Criminal.
Clubes tranquilos
Benfica, F. C. Porto, Sporting, V. Guimarães, Sp. Braga e o Marítimo reagiram com tranquilidade às buscas. Todos garantem a legalidade dos respetivos negócios e asseguram ter oferecido uma colaboração total às autoridades.