Um homem comprou um Ferrari 328 GTS de 1987 por 55 mil euros pensando que só tinha 20 mil quilómetros. Na verdade, o conta-quilómetros dera a volta e já tinha 120 mil.
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Examinou melhor o carro e notou várias anomalias, incluindo a falta do compressor do ar condicionado. Processou o vendedor e o Tribunal de Évora deu-lhe razão, condenando o vendedor a pagar 20 mil euros e a reparar o ar condicionado. Decisão que foi confirmada pela Relação de Évora a 25 de fevereiro.
O negócio remonta a 2014 e começou com a venda de uma autocaravana. O dono tinha ido a Évora e soube que havia um Ferrari 328 GTS à venda. Foi vê-lo. O vendedor garantiu que estava em bom estado e pediu 60 mil euros. Ele não quis dar uma volta. Fez uma vistoria rápida ao carro, que marcava 20 783 quilómetros, e disse que ia pensar.
À distância, chegaram a acordo: o Ferrari pela autocarava, avaliada em 30 mil euros, mais 25 mil euros em dinheiro. A 2 dezembro de 2014 a autocaravana foi levada até Évora e o Ferrari foi para Espinho, num reboque.
No dia seguinte, ao ver o Livro de Revisões do Ferrari, apercebeu-se de intervenções aos 103 mil e 106 mil quilómetros. Foi ao carro e viu que o mostrador só tinha cinco dígitos. Já tinha dado a volta e, afinal, tinha 120 783 quilómetros. Descobriu ainda várias anomalias, incluindo a ausência de compressor, apesar de ter ar condicionado de origem. Em janeiro de 2015, reclamou por carta, mas só em 2019 é que intentou uma ação a pedir 27 500 euros. O vendedor contestou e queixou-se de que também tinha gasto 17 mil euros em reparações efetuadas à autocaravana.
dono sabia e nada disse
O Tribunal de Évora deu como provado que o vendedor do Ferrari sabia que os quilómetros no mostrador não correspondiam à realidade e não esclareceu o comprador desse facto. Sendo uma compra de coisa defeituosa, podia exigir redução do preço.
O tribunal estimou que aquele modelo de Ferrari com 20 mil quilómetros e em bom estado pode ser vendido entre os 55 mil euros e os 60 mil euros. Com 120 mil quilómetros, baixaria para 35 mil euros. Por isso, condenou o vendedor a pagar 20 mil euros. O réu recorreu, alegando que o comprador não questionou os quilómetros e que não examinou melhor o carro porque sabia que era um bom negócio. Os juízes discordaram, salientando que a conduta do comprador era aceitável, pois vira documentos oficiais mencionando 20 783 quilómetros e tinha encontrado o carro "fechado num barracão mal iluminado existente numa herdade e com uma capa de proteção, inculcando a ideia de pouca utilização pelo seu dono".
Frisaram que o vendedor estava obrigado aos deveres de lealdade e de informação, pelo que deveria ter revelado os quilómetros reais e que o carro não tinha o compressor do ar condicionado. Por isso, o comprador tinha direito à redução do preço em 20 mil euros e ao pagamento da instalação do ar condicionado.
Pormenores
Prazo caducado não foi alegado - No recurso para a Relação, o vendedor alegou que a ação tinha sido interposta muito depois do prazo de seis meses dados pela lei. Era verdade, mas os desembargadores explicaram que essa caducidade deveria ter sido invocada na contestação e não em sede de recurso.
Fichas de inspeção revelavam 20000 km
Na primeira visita ao carro, o vendedor apenas mostrou as fichas de inspeção de 2013 e 2014, que mostravam quilometragens de 20 726 e 20 783, ou seja, feitas já depois do conta-quilómetros ter dado a volta.