Processos no Balcão Nacional de Arrendamento estiveram suspensos 11 meses por causa da pandemia. Num ano, só foi emitida uma ordem de desocupação. Lei mudou em fevereiro e tramitação passou a ser regra.
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A suspensão dos despejos urgentes está sujeita, desde o início de fevereiro, à demonstração pelo inquilino de que não tem uma alternativa habitacional. A exigência surge depois de, nos 11 meses anteriores, o Procedimento Especial de despejo (PED) - requeridos quando, entre outras situações, o contrato seja denunciado por falta de pagamento da renda - terem estado, "de uma forma geral", parados, no âmbito das medidas excecionais para responder à pandemia de covid-19.
Entre 20 de março do ano passado e o último dia 9, deram entrada no Balcão Nacional de Arrendamento (BNA), segundo o Ministério da Justiça, 1402 pedidos especiais de despejo, a maior parte referente a casos de habitações e substancialmente menos do que no período homólogo anterior. Só uma ordem de desocupação foi emitida no mesmo período. No total, até 1 de fevereiro, ficaram suspensos "aproximadamente 500" processos, entre aqueles que já "se encontravam aptos a prosseguir a sua tramitação".
"De uma forma geral, os procedimentos especiais de despejo estiveram suspensos desde 09-03-2020", adiantou, ao JN, fonte oficial do ministério liderado por Francisca Van Dunem, acrescentando que, a partir do passado dia 2 de fevereiro, "todos" os processos passaram a ser "tramitados".
Em causa está o facto de, desde esta data, só poderem ser suspensos, devido a uma alteração à Lei n.º1-A/2020 , que estabelece as medidas excecionais e temporárias de resposta à covid, os atos relacionados com a concretização da entrega da casa da morada de família ou de outro locado quando "venha a ser proferida decisão que confirme" que o despejo deixa o arrendatário "em situação de fragilidade por falta de habitação própria ou por outra razão social imperiosa". Sem esta decisão, validada por um juiz, a tramitação prossegue.
Cerca de 500 processos foram suspensos pelo Banco Nacional de Arrendamento, de 9 de março do ano passado a 1 de fevereiro, entre aqueles que tinham condições para ser tramitados. Inclui espaços habitacionais e comerciais.
Nova alteração à vista
Anteriormente, era a própria tramitação do processo que parava se a eventual desocupação pudesse colocar o inquilino naquela situação. Em breve, a lei poderá mudar mais uma vez.
Já esta semana, o Governo enviou à Assembleia da República uma proposta de lei que mantém que, num PED, só o ato de entrega do espaço ao proprietário pode ser suspenso. Em contrapartida, desaparece a exigência de uma decisão judicial para que tal ocorra, embora continue a ser obrigatório o arrendatário requerer que não terá onde morar. O diploma terá ainda de ser apreciado e aprovado no Parlamento.
Tribunal censurou
A suspensão automática pelo BNA da tramitação dos despejos urgentes já mereceu, de resto, a censura do Tribunal da Relação de Lisboa. "Os procedimentos especiais de despejo não devem ser suspensos antes de ser suscitada a questão pelo arrendatário de que a decisão final a proferir é suscetível de o colocar em situação de fragilidade por falta de habitação própria ou por outra razão social imperiosa", lê-se num acórdão de 11 de fevereiro, em que é determinado o prosseguimento de um pedido datado de agosto.
Em causa está a situação de uma senhoria da região do Porto que, no verão, requereu o despejo urgente de uma inquilina que terá deixado de pagar a renda em dezembro de 2019. Só em outubro percebeu que não fora tramitado.
O caso, apurou o JN, não foi o único a parar logo após dar entrada no BNA.
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