Alexandre terá recebido comissões ocultas em vários negócios do F. C. Porto. Ministério Público realizou 33 buscas na SAD portista e nas residências dos suspeitos.
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Alexandre Pinto da Costa, filho do histórico presidente portista, é suspeito de receber comissões milionárias na transferência de jogadores do F. C. Porto, intermediadas por outros empresários ligados ao clube. O Ministério Público (MP) desconfia que as comissões tenham sido inflacionadas ou sejam mesmo fictícias e, na manhã de segunda-feira, fez buscas nas casas de filho e pai, Alexandre e Jorge Nuno Pinto da Costa, no Porto.
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A operação do MP e da Autoridade Tributária que, na segunda-feira, sobressaltou o universo portista incluiu um total de 33 buscas, destinadas a recolher documentação sobre negócios em que terão intervindo os empresários Alexandre Pinto da Costa, Pedro Pinho (também alvo de buscas) e Miguel Macedo. Não houve detenções, nem foram constituídos arguidos, mas o MP suspeita que tenham sido cometidos crimes com comissões de 20 milhões de euros pagas pelo F. C. Porto desde 2017.
Segundo apurou o JN, há pelo menos cinco transferências suspeitas. São as de Ricardo Pereira, Quintero, Felipe, Tiquinho Soares e Militão, entre 2018 e 2020. Os negócios foram intermediados, direta ou indiretamente, por Pedro Pinho e Bruno Macedo. Este último foi detido em julho deste ano, na Operação Cartão Vermelho, a par do então presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira.
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Naquelas transferências, terão sido pagas, oficialmente, comissões a Pinho e Macedo. Mas a equipa do MP do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), liderada pelo procurador Rosário Teixeira, acredita que Alexandre Pinto da Costa tenha recebido uma quota-parte em todas elas. Os outros empresários eram quem aparecia nos negócios celebrados com o F. C. Porto, mas Alexandre Pinto da Costa receberia uma percentagem das respetivas comissões, num esquema que seria do conhecimento do presidente dos dragões, suspeita o MP.
Alerta do sistema bancário
"As diligências de recolha de prova visam investigar a suspeita de prática de crimes de fraude fiscal, burla, abuso de confiança e branqueamento, relacionados com transferências de jogadores de futebol e com circuitos financeiros que envolvem os intermediários nesses negócios", explicou na segunda-feira o MP.
Terá sido através da circulação do dinheiro das comissões ocultas que nasceu este inquérito, paralelo e complementar à Operação Cartão Vermelho. Segundo apurou ainda o JN, foram alertas do sistema bancário relativas às transferências entre Alexandre Pinto da Costa e Pedro Pinho que levaram o MP a dar crédito a denúncias anónimas recebidas pelas autoridades anos antes. Estas detalhavam as alegadas comissões ocultas de que Alexandre beneficiaria, por ser filho do presidente.
Banco privado
Além de residências e escritórios, os inspetores do Fisco, apoiados pela PSP, também foram à sede do banco Carregosa, no Porto, uma instituição que aconselha clientes e gere os seus ativos financeiros. Os documentos e material informático apreendidos permitirão às autoridades perceber os fundamentos de transferências bancárias detetadas entre os suspeitos nos últimos anos.
Numa sucinta reação às buscas, em comunicado enviado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), a SAD do F. C. Porto confirmou apenas a busca às suas instalações e assegurou que colaborou com "a equipa de investigadores, cujo trabalho visou a apreensão de documentos que pudessem interessar à investigação". Nada disse, porém, sobre as restantes buscas.
O JN tentou, sem sucesso, ouvir Jorge Nuno Pinto da Costa.
Protagonistas desta operação
Jorge Nuno Pinto da Costa, presidente do F. C. Porto
Tem 83 anos e está no comando dos destinos do F. C. Porto há 39 anos. Enfrentou vários processos judiciais, sendo o mais mediático o do Apito Dourado, com suspeitas de pagamentos a árbitros. Foi sempre ilibado.
Alexandre Pinto da Costa, empresário
Desde 2015, altura em que o "Football Leaks" denunciou alegadas comissões irregulares pagas pelo F. C. Porto a Alexandre Pinto da Costa, através da Energy Soccer, que a sua colaboração com o clube é contestada.
Pedro Pinho, empresário
Foi sócio de Alexandre Pinto da Costa na Energy Soccer. Entretanto, fez vários negócios com o F. C. Porto. Recentemente, foi acusado de ofensas por ter agredido um repórter de imagem da TVI à porta do estádio do Moreirense, em abril.
Bruno Macedo, empresário
É um empresário de futebol que foi detido, a par de Luís Filipe Vieira, então presidente do Benfica, na Operação Cartão Vermelho. Terá intermediado negócios dos portistas que também estão sob suspeita de fraude e branqueamento de capital.
As transferências que estão na mira
Éder Militão - Real Madrid - 50 milhões de euros
Chegou à Invicta em 2018, para sair um ano depois. Esta transferência foi comunicada pelo Real Madrid em março de 2019, com a época a decorrer. O defesa brasileiro juntou-se aos espanhóis apenas em agosto.
Felipe - Atlético Madrid - 20 milhões de euros
Aterrou em Portugal em 2016, proveniente dos brasileiros do Corinthians. Esteve três épocas ao serviço dos dragões. Uma boa campanha, em 2018/19, valeu-lhe a transferência para a capital espanhola.
Ricardo Pereira - Leicester - 22 milhões de euros
Após ter sido emprestado aos franceses do Nice, competiu pela equipa principal dos dragões em 2017/18. Transferiu-se para os ingleses do Leicester uma época depois e tornou-se numa das figuras da equipa.
Quintero - River Plate - 3,75 milhões de euros
Saiu após empréstimo O colombiano pisou pela primeira vez o relvado do Estádio do Dragão em 2013, mas nunca se afirmou como titular absoluto. Após uma série de empréstimos, acabou mesmo por sair da Invicta em janeiro de 2019.
Tiquinho Soares - Tianjin Jinmen Tiger - 5,4 milhões de euros
Assinou contrato com o F. C. Porto em janeiro de 2017, proveniente do V. Guimarães. Depois de 140 jogos e 65 golos, em quatro épocas de azul e branco, foi transferido para a liga chinesa em setembro de 2020.
Operação Cartão Vermelho
Luís Filipe Vieira fora de jogo
Foi o pontapé de saída da Operação Cartão Vermelho. Luís Filipe Vieira, o seu filho Tiago, o empresário José António dos Santos, conhecido como "Rei dos Frangos", e o agente de futebol Bruno Macedo foram detidos no âmbito de uma investigação do Departamento Central de Investigação e Ação Penal, liderada, tal como a operação de ontem, pelo procurador Rosário Teixeira e o inspetor tributário Paulo Silva (ambos estiveram juntos também na Operação Marquês). Vieira, que se demitiu da presidência do Benfica, ficou em prisão domiciliária até ter prestado uma caução de três milhões de euros.
Bruno Macedo, o elemento comum
O elemento comum entre os inquéritos criminais que visam negócios do Benfica e do Porto é o empresário Bruno Macedo. O MP acredita que Vieira lesou o Benfica em 2,5 milhões de euros - subtraídos 2,5 milhões à SAD encarnada em relação a mais-valias das vendas de jogadores - com a conivência do agente bracarense. Esse dinheiro foi canalizado por circuitos financeiros estrangeiros, passando por offshores, e voltou para Portugal, onde serviu para que Macedo comprasse bens a Vieira.
Golpe ao Fundo e OPA ao Benfica
Na Operação Cartão Vermelho, Vieira é suspeito de ter dado um golpe ao Fundo de Resolução, através da compra da dívida de 54 milhões de euros que uma das suas empresas, a Imosteps, tinha no Novo Banco. A dívida seria indiretamente adquirida pelo ex-presidente por nove milhões de euros, financiados por José António dos Santos, "Rei dos Frangos". Para compensar o amigo e financiador, Vieira terá promovido a oferta pública de aquisição de 25% das ações da SAD e, se a operação não tivesse sido cancelada pela CMVM, José António dos Santos, que comprara ações a um euro, poderia vendê-las por cinco euros, lucrando cerca de dez milhões de euros.