O ex-primeiro-ministro José Sócrates (2005-2011) defendeu esta quarta-feira, ladeado pelo advogado Pedro Delille, que o processo Operação Marquês já “acabou”, com o que considera ser a sua “absolvição”, pelo mais recente acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa sobre o caso.
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“Não temos a pretensão de que a nossa opinião seja a verdade com ‘v’ grande. É apenas o nosso ponto de vista”, ressalvou o ex-governante socialista, numa conferência de imprensa de mais de uma hora, num hotel da Ericeira. Até porque, na prática, o processo continua a correr nos tribunais, sem que qualquer decisão transitada em julgado tenha expressamente ilibado José Sócrates, de 66 anos, de todos os crimes de que é suspeito há mais de uma década, incluindo corrupção.
Em causa está a existência, atualmente, de dois processos paralelos que resultaram da decisão instrutória, em 2021, do juiz Ivo Rosa. O então magistrado do Tribunal Central de Instrução Criminal decidiu, à data, mandar o antigo primeiro-ministro para julgamento por seis crimes, menos 25 do que os 31 de que tinha sido acusado pelo Ministério Público.
Num caso, o Tribunal da Relação de Lisboa ressuscitou, em janeiro deste ano, 2024, os 25 ilícitos que tinham caído; no outro, anulou, há um mês, a ida a julgamento de José Sócrates pelos crimes seis crimes de que este tinha sido pronunciado (acusado após instrução), ordenando a reapreciação dos indícios pelo Tribunal Central de Instrução Criminal.
Este último acórdão, segundo Pedro Delille, tornou-se definitivo na terça-feira e irá determinar o fim do Marquês sem que haja julgamento.
Aposta na prescrição
Para o advogado, tal significa que todo o caso “foi recolocado na fase prévia à decisão instrutória” de abril de 2021, uma vez que, ao ser anulada decisão instrutória, deixou de existir objeto para ser revertido pelo acórdão de janeiro do TRL. O mandatário já requereu, por isso, que os dois processos envolvendo Sócrates sejam devolvidos ao TCIC até ao final de amanhã, quinta-feira.
Ali chegados, Pedro Delille acredita que só poderá existir um desfecho: o término do processo, porque, alega, sem decisão instrutória os crimes imputados “estão todos prescritos”.
Numa conferência de imprensa em que usou a anulação da decisão instrutória e os argumentos ali explanados para atacar o Ministério Público, o ex-primeiro-ministro anunciou ainda que vai impugnar uma decisão de julho do Conselho Superior da Magistratura. Se ganhar, tal poderá anular o acórdão que, em janeiro de 2024, tinha reavivado os 25 crimes “apagados”.
"O que aconteceu no processo Marquês é de uma violência absolutamente inaudita. Tudo isto seria cómico se não fosse trágico", afirmou José Sócrates.
Quase dez anos de reviravoltas
21.11.14
DETIDO EM LISBOA
José Sócrates é detido ao aterrar no aeroporto de Lisboa. Ficou 288 dias em preventiva até passar para domiciliária. Ficou livre em outubro de 2015.
11.10.17
DEDUZIDA ACUSAÇÃO
O Ministério Público acusa o ex-primeiro-ministro de 31 crimes. Alega que foi corrompido com recurso a contas no estrangeiro e com o Carlos Santos Silva, seu amigo, como testa-de-ferro. Há 28 arguidos acusados.
09.04.21
INSTRUÇÃO ACABA
O juiz Ivo Rosa iliba a maioria dos arguidos, mas vê indícios de que Sócrates foi corrompido, não por terceiros mas pelo próprio Santos Silva. Manda cada um ser julgado por seis crimes que, ao contrário do de corrupção, não tinham prescrito.
25.01.24
DE VOLTA AO INÍCIO
O Tribunal da Relação de Lisboa recupera a tese do Ministério Público e ressuscita a maioria dos crimes “apagados”. Dos 28 acusados iniciais, só um é ilibado. São imputados 22 crimes a Sócrates, além dos seis validados em 2021.
21.03.24
NOVA REVIRAVOLTA
O Tribunal da Relação de Lisboa decide anular a imputação no processo mais pequeno, cujo julgamento nunca começara. A decisão terá de ser refeita.