Eutanásia era o destino que a lei apontava como provável para o rafeiro alentejano responsável por ataque mortal em Porto de Mós. Mas voluntários do canil municipal, União Zoófila e PAN intercederam e salvaram Tóbi.
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A lei prevê que o cão que provoque "ofensas graves à integridade física" de uma pessoa seja "eutanasiado", depois de se ponderar "o caráter agressivo do animal". Tóbi é um rafeiro alentejano que matou o dono em setembro do ano passado, numa aldeia de Porto de Mós, e o seu abate parecia uma inevitabilidade, mas o tribunal local, em concertação com o veterinário municipal e a União Zoófila, acaba de conceder uma segunda oportunidade a este cão de grande porte.
Dar um final de vida digno a Tóbi, que tem dez anos, é o objetivo perseguido pela Câmara de Porto de Mós e União Zoófila, em conjugação de esforços com voluntários do Centro de Recolha Oficial (CRO) de Animais de Companhia do Município e o PAN. Pelo meio, houve a intervenção crucial do Tribunal de Porto de Mós, que passou a decisão de eutanasiar ou não o animal para o veterinário municipal. Este, depois de um parecer emitido por técnicos da União Zoófila, optou pela reabilitação do animal.
"Muito dócil e afável"
A história começou a 29 de setembro último, quando o dono do cão apareceu morto, junto ao animal, com ferimentos profundos, causados por mordidelas. Após a ocorrência, Tóbi foi encaminhado para o CRO de Porto de Mós e está, desde então, numa "sala de isolamento".
O regime jurídico da criação, reprodução e detenção de animais de companhia perigosos e potencialmente perigosos estabelece que um cão, por exemplo, que cause "ofensas graves à integridade física, devidamente comprovadas por relatório médico, é eutanasiado através de método que não lhe cause dores e sofrimentos desnecessários, uma vez ponderadas as circunstâncias concretas, designadamente o caráter agressivo do animal".
Em alternativa ao abate, prevê-se que o animal seja devolvido ao seu "detentor", depois de provado que é tratável. Uma opção inaplicável no caso, devido ao falecimento do dono, que vivia sozinho com o cão.
É aqui que entra a União Zoófila, que recebeu "um pedido de ajuda" das voluntárias do CRO. "A informação que nos transmitiram foi a de que o animal é muito dócil e afável e que tinha desenvolvido com elas uma excelente relação", conta Margarida Saldanha, da direção da associação. O mesmo apelo chegou ao PAN, que também intercedeu junto da Câmara, pedindo para que o cão não fosse abatido.
"O município nunca achou bem a aplicação de eutanásia ao animal e sempre quis dar-lhe mais uma hipótese, mas tínhamos de pugnar pelo cumprimento dos procedimentos burocráticos necessários", alega o vice-presidente da Câmara de Porto de Mós, Eduardo Amaral.
Este justifica assim o arrastar do processo, que ainda aguarda a formalização do protocolo que vai definir as condições de entrega do animal à União Zoófila. "Será necessário indicar um técnico credenciado que irá trabalhar a socialização do cão", explica o autarca, adiantando que, após essa intervenção, o canídeo será ainda "presente a um júri, para verificar se cumpre os requisitos" para ser considerado "recuperável".
PAN quer que seja exemplo
"Se não há pena de morte para humanos, não tem de haver para os animais. Neste caso, trata-se de dar um fim de vida digno a um cão que já não terá muitos anos pela frente", afirma Liliana Vieira, responsável do PAN no distrito de Leiria, elogiando o Município de Porto de Mós pela decisão de "dar prioridade à vida". "Temos esperança que este caso possa servir de exemplo a outras autarquias", salienta.
O futuro de Tóbi passará agora pelo acolhimento em instalações da União Zoófila, onde passará "o tempo que lhe resta", avança Margarida Saldanha, reconhecendo que, por se tratar de "um cão idoso e de grande porte, dificilmente será adotado".
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Morte há 9 meses
A morte de António Barreto, de 55 anos e que vivia sozinho com Tóbi em Marinha da Mendiga, Porto de Mós, ocorreu a 29 de setembro de 2021. Foi encontrado sem vida junto do cão, com ferimentos profundos provocados por mordidelas.
O que diz a lei
Segundo o regime legal em vigor, o animal que cause ofensas graves à integridade física é eutanasiado. Pode também ser entregue ao dono, mediante a realização de provas de socialização e ou treino de obediência.
Perfil
Firme com os estranhos, dócil com as crianças
O rafeiro alentejano destaca-se como cão de guarda, nomeadamente de rebanhos. O rei D. Carlos também o usava na caça. Descenderá dos molossos do Médio Oriente, tal como o serra da Estrela. Pesa 40 a 55 quilos, atinge 75 cm de altura e vive, em média, até 13 anos. É um cão "confiante", "firme com estranhos" e "dócil" com crianças. Precisa de grandes espaços exteriores.