Um osteopata de Felgueiras vai cumprir três anos de prisão efetiva por um crime de violação perpetrado contra uma paciente durante uma consulta. O Tribunal da Relação do Porto decidiu, há dias, manter a pena aplicada em primeira instância por juízes de Penafiel. Os desembargadores entenderam que o arguido não merecia uma suspensão de pena por este não ter assumido o crime e porque pode voltar a cometê-lo. Um dos três juízes que assinam o acórdão queria dar uma oportunidade ao osteopata, mas foi o único.
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A 6 de julho de 2020, após ter sido sujeita a uma primeira consulta que decorreu sem problemas, a vítima voltou à clínica do arguido. Tinha contraturas musculares para tratar. Alegando ser necessário normalizar um "movimento rotativo primário", José F., de 49 anos, pediu à paciente movimentar a anca e, como ela não estaria a realizar o exercício corretamente, disse-lhe que iria ajudá-la. Passou a mão debaixo da roupa interior e molestou-a sexualmente. "Ainda que perturbada e incomodada, conquanto o arguido continuava a insistir para que prosseguisse com o designado "movimento respiratório primário", nada disse ou manifestou" a paciente, descreve o acórdão. Mas após a consulta, a mulher informou-se e obteve a certeza de que o procedimento não era nenhum ato médico. Apresentou queixa e, apesar de negar o crime, o osteopata acabou condenado no passado mês de abril a três anos de prisão efetiva.
Com o registo criminal limpo e uma vida social irrepreensível, José F. recorreu para a Relação alegando que o tribunal de primeira instância cometeu erros de apreciação de prova, além de questionar a efetividade da pena de prisão e a aplicação de três anos de cadeia. Continuou a negar ter molestado sexualmente a paciente.
Mas os desembargadores entenderam sancioná-lo por isso. "O direito ao silêncio não é equiparável à negação (mentirosa) dos factos por parte do arguido, apresentando-se esta como relevante manifestação expressa da sua personalidade, sem margem para qualquer dúvida séria e fundada onde, ao contrário do silêncio, aquele possa valer-se do princípio do in dubio pro reo", lê-se no acórdão a que o JN teve acesso. Os desembargadores não acreditam que a paciente possa ter inventado o caso porque "a denúncia dos factos implicou que os tivesse que partilhar, o que não só importou revivê-los como agravou o sentimento de culpa, vergonha e humilhação".
Para manter a pena efetiva de prisão, os juízes argumentam que "estamos perante crimes com forte repercussão negativa na sociedade, que espera do sistema judiciário uma resposta firme, perentória e severa no combate ao flagelo que constitui, além de causador de um grande alarme e reprovação social".
Juiz votou de vencido
Um dos três desembargadores que assinam o acórdão queria dar uma oportunidade ao arguido e suspender a pena de prisão. Para este magistrado, o facto de negar o crime não beneficiou o arguido, mas também não o podia prejudicar. "A opção pelo silêncio, tal como a negação dos factos, são posições processuais legalmente tidas como legítimas", explica o juiz para quem "a sociedade toleraria uma pena suspensa na sua execução, sem que tal opção, a meu ver, pusesse em causa a validade da norma e a confiança na justiça penal".
Credibilidade
Apesar de não existirem testemunhas do crime, os juízes entenderam que o depoimento da vítima era muito credível.
Clínica aberta
O terapeuta ocupacional e osteopata mantém-se a trabalhar com a clínica aberta. Nunca foi proibido de exercer.
Contexto agrava
Os juízes entendem que os crimes sexuais cometidos no contexto clínico e de confiança entre a utente e o terapeuta constituem um dos fatores que provoca maior perturbação e comoção social.