Desde julho, foram realojados mais de 700 migrantes timorenses que viviam na rua em Portugal. São maioritariamente homens entre os 20 e os 40 anos e chegaram a território nacional no êxodo daquele país que se fez sentir a partir de janeiro de 2022 e que, em outubro, já tinha levado o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) a abrir uma dezena de investigações por tráfico de seres humanos para exploração laboral.
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Os dados do realojamento foram fornecidos, ao JN, pelo Alto Comissariado para as Migrações (ACM): de julho do ano passado, "foram identificados 1541 cidadãos timorenses em situação de vulnerabilidade", tendo sido "providenciada resposta de alojamento para 1471". Destes, "mais de 50% estavam a pernoitar na rua".
Entre as pessoas realojadas, "cerca de 30%" foram encaminhadas para pousadas da juventude. As restantes foram instaladas em "respostas de alojamento de emergência/temporário, criadas pelos Municípios ou resultantes de parcerias com o Instituto da Segurança Social". Atualmente, residem nas estruturas acompanhadas pelo ACM um total de 321 timorenses.
Destes, "cerca de 30" estão no Centro de Migrações do Fundão, por onde passaram, nos últimos dez meses, 164 cidadãos de Timor-Leste, adianta, ao JN, o presidente da Câmara local, Paulo Fernandes. Outros 12 permaneciam, a 11 de abril, na Estrutura de Acolhimento Coletivo de Emergência da Cáritas Diocesana de Beja, segundo a responsável do espaço, Ana Soeiro. No total, pernoitaram aqui, desde julho, 146.
Estas duas últimas soluções foram criadas no final do último verão para responder à situação de emergência de trabalhadores que viviam em casas sem condições mínimas no concelho do Fundão e no distrito de Beja. Os imigrantes terão sido enganados por redes criminosas em Timor-Leste, às quais pagaram a viagem, mediante a promessa de trabalho e salário em Portugal, que não se cumpriu.
muitos já têm emprego
No Fundão, uma dezena de imigrantes contaram então ao JN que o seu objetivo era ganhar dinheiro para mandar para as famílias que ficaram em Timor-Leste. E, poucos meses depois, muitos acabaram por arranjar emprego, com contrato, na região onde receberam o apoio de emergência.
Só na zona do Fundão estão "integrados laboralmente" 77 timorenses, 47% dos que foram recebidos no Centro de Migrações local. Segundo o presidente da Câmara, cerca de metade está no setor primário, incluindo 15 nos sapadores florestais. Seguem-se os setores secundário - no qual há, entre outros, oito cidadãos a trabalhar na indústria metalomecânica - e o terciário, no qual a restauração está mais representada, com cinco pessoas.
"Mais de 40 já têm casa própria", acrescenta Paulo Fernandes. Em sentido inverso, 68 cidadãos "foram abandonando" a região. "Não sabemos onde estão", reconhece, considerando que o balanço é, ainda assim, "muito interessante".
Os números são, aliás, melhores do que os de Beja, onde, segundo sabe a Cáritas, estão integrados laboralmente 44: 12 nas minas de Aljustrel; 10 na hotelaria e em instituições particulares e de solidariedade social; três na construção civil e 19 noutros ramos.
A nível nacional, o ACM já colocou em situação de emprego 294 timorenses, 94% dos quais com alojamento. "O acolhimento de migrantes deve ser desígnio nacional para os próximos anos", conclui o edil do Fundão.
Dezenas têm tentado ir para o Reino Unido
O Reino Unido barrou a entrada, no primeiro trimestre deste ano, a 50 timorenses que tentaram mudar-se de Portugal. De acordo com a agência Lusa, há registo de situações de cidadãos que decidiram abandonar o território nacional mesmo depois de aqui terem conseguido emprego. "Até alguns a quem tínhamos arranjado contratos e trabalho de um ano a ganhar limpos 800 euros partiram sem dizer nada a ninguém. Apercebemo-nos disto [há duas semanas] quando começámos a receber telefonemas de patrões", explicou uma fonte à agência noticiosa. No ano passado, entraram em Portugal, segundo o SEF, 6814 timorenses e saíram 5135. Já este ano, entraram em território nacional 731. Há, paralelamente, registo de 581 abandonos.
Pormenores
Aulas de português - A maioria dos imigrantes resgatados não fala português nem inglês, sendo apenas fluente em tétum, o idioma de Timor-Leste. O ACM já integrou mais de 750 em cursos do programa "Português Língua de Acolhimento".
Empresas envolvidas - Quer o autarca do Fundão, Paulo Fernandes, quer Ana Soeiro, da Cáritas de Beja, realçam o papel das empresas das suas regiões na integração dos timorenses. Muitos receberam formação profissional organizada pelas estruturas de acolhimento.
Poucos regressos - Três dos 146 cidadãos apoiados pelas Cáritas de Beja regressaram a Timor-Leste. No Fundão, ainda que com um fluxo menor, o Centro de Migrações continua a ter timorenses "a bater à porta" a pedir ajuda.