Vinte e seis responsáveis de órgãos policiais de 25 países europeus apelaram esta quinta-feira, numa declaração conjunta assinada na sede da Polícia Judiciária (PJ), em Lisboa, a que seja instituído "um novo quadro legal" que, na sequência do chumbo da conservação e uso de metadados na investigação criminal, permita "restabelecer a confiança entre as agências de aplicação da lei, o setor privado e os cidadãos".
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No documento, os dirigentes mostram-se "particularmente preocupados com o impacto nacional e internacional da inexistência" na União Europeia de um regime de "retenção de dados de tráfego e de localização". "[Tal] afeta não só o cumprimento das nossas missões, como também toda a sociedade", acrescentam, lembrando que, uma vez que "alguns tipos de crimes apenas podem ser prevenidos e investigados se a conservação de metadados for autorizada", podem existir consequências para os "direitos, liberdades e garantias dos cidadãos".
Além do diretor nacional da PJ, Luís Neves, subscreveram a "Declaração Lisboa" chefes policiais de Alemanha, Áustria, Bélgica, Bulgária, Croácia, Chipre, Dinamarca, Eslovénia, Espanha, Estónia, Finlândia, França (dois órgãos distintos), Grécia, Hungria, Irlanda, Itália, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Noruega, Países Baixos, Roménia e Suécia.
O documento foi assinado no final de uma conferência sobre metadados que decorreu, na quarta-feira e esta quinta-feira de manhã, na sede da PJ.
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"Garantidamente, não será mais um papel. [...] O compromisso que saiu daqui é que cada um de nós fará chegar, naturalmente em cada um dos Estados, esta conclusão. [...] Nós internamente, para além da tutela, faremos chegar a outros decisores, aos órgãos de soberania", assegurou aos jornalistas, após a conferência, Luís Neves, lembrando que marcaram ainda presença na iniciativa responsáveis europeus.
"Nenhuma Polícia tem interesse, necessidade, tempo, meios para bisbilhotar seja o que for", frisou o dirigente, reconhecendo que qualquer solução legal, com "equilíbrio", terá de ser encontrada a nível nacional e europeu.
Chumbo na Europa
Os metadados são as circunstâncias em que ocorrem as comunicações entre pessoas e em que estes acedem à Internet. Embora não permitam saber nem o conteúdo das conversas nem os sites visitados, podem, se foram trabalhados, permitir apurar com quem fala determinada pessoa e onde esteve, ocasional ou regularmente.
Em 2006, na ressaca dos atentados terroristas em Madrid, Espanha (2004) e em Londres, Reino Unido (2005), foi utilizada uma diretiva europeia que autorizou a utilização dos metadados na investigação criminal. Só que, em 2014, o Tribunal de Justiça da União Europeia invalidou a diretiva, que entretanto fora transposta para o ordenamento jurídico de vários países europeus, incluindo em Portugal. Em abril de 2022, a lei portuguesa, que permitia a conservação de informação durante um ano, acabou, mais de uma década após a sua entrada em vigor, por ser também chumbada.
Em causa tem estado, sobretudo, a desproporcionalidade entre os direitos assegurados pelo recurso aos metadados na investigação e as restrições à intimidade da vida privada dos cidadãos, uma vez que é armazenada a informação não apenas de suspeitos de crimes mas da generalidade da população.
Atualmente, está a ser trabalhado na Assembleia da República, por proposta do Governo, um diploma que permitirá que a PJ aceda aos metadados armazenados pelas operadoras, durante seis meses, para efeitos de faturação.