No ano passado, a PSP recebeu 2100 denúncias de violência no namoro (1200 entre ex-namorados e 900 entre namorados), numa média de 5,7 por dia.
Corpo do artigo
De acordo com os dados, ainda provisórios, a grande maioria das vítimas é do sexo feminino e tem entre 18 e 24 anos. As do sexo masculino estão entre os 25 e os 34 anos. Os suspeitos das agressões têm em média entre 25 e 34 anos.
A violência no namoro é uma realidade em Portugal e já há vários anos que a tutela, autoridades policiais e e instituições alertam para este fenómeno. Os números só não são superiores porque os jovens desvalorizam este tipo de comportamentos e também porque têm vergonha de os denunciar, explicaram vários responsáveis ouvidos pelo JN.
O Estudo Nacional sobre a Violência no Namoro 2020, que é hoje apresentado no Porto, revela que quase 70% dos jovens acham normal comportamentos de violência no namoro, registando-se uma elevada legitimação da violência exercida através das redes sociais, do controlo do vestuário ou de hábitos de convívio. A investigação desenvolvida pela UMAR - União de Mulheres Alternativa e Resposta, que envolveu 4600 jovens de 15 anos, revela que 58% já sofreram ou sofrem violência no namoro.
Fiscalizar redes sociais
"Há uma grande legitimação de comportamentos de controlo. Não deixar sair com amigos ou amigas, controlar a forma como se veste, perseguir com mensagens, pressionar para beijar, entrar nas redes sociais do outro. Assume-se isto como normal", explicou ao JN a secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Rosa Monteiro, que participa hoje na apresentação de uma nova campanha.
A governante acrescentou que são os rapazes quem mais legitima estas formas de violência e que a cultura digital "está carregada de mensagens de posse".
Rosa Monteiro recorda um relato recente: "Uma aluna tirava sempre uma selfie no início da aula para mandar ao namorado como prova do sítio onde estava. Estes comportamentos nem sempre saltam à vista", disse, insistindo na importância de formar pessoal docente e não docente e alertar as famílias.
Segundo Raquel Simão, da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), "os jovens têm dificuldade em expor a situação" e procurar ajuda. "Porque não se identificam enquanto vítimas, que aquele padrão abusivo é sinónimo de violência". E devido a fatores relacionados com a sua privacidade, bem como a vergonha em expor a situação.
Se, por um lado, desculpabilizam o comportamento do agressor, por outro, também "têm muito receio de serem culpabilizados por aquela relação abusiva". Raquel Simão fala ainda da "pressão entre os pares para ter um namorado ou namorada e ser-se aceite", que leva a que prefiram manter-se no relacionamento e a alimentarem a esperança de que a situação mude.
Em Dia de São Valentim, sai para a rua a campanha #NamorarNãoÉSerDon@, da Secretaria de Estado para a Cidadania e a Igualdade. Os humoristas Diogo Faro e Rita Camarneiro protagonizam um vídeo que vai circular pelas escolas em ações de sensibilização. "Quando os adolescentes veem um Diogo Faro falar destas coisas, a mensagem é mais eficaz", sublinhou Rosa Monteiro.
Violações no namoro
Ao JN, a apresentadora Rita Camarneiro disse que o objetivo foi falar "de forma muito informal sobre comportamentos controladores e abusivos". A campanha resulta de uma parceria com o Movimento #NãoéNormal, que Diogo Faro criou com cinco amigos. Diogo já recebeu, pelo Instagram, quase três mil relatos de violência. "Incluindo violações dentro do namoro. Isto tem que ser falado. Há comportamentos que estão banalizados e que a sociedade precisa de combater".
No ano passado, a campanha #NamorarMemeASério, que recorreu a memes criados por influenciadores digitais, alcançou 30 mil pessoas nas redes sociais.
Observatório
Ciúmes são a principal causa da violência
Mafalda Ferreira, do Observatório da Violência no Namoro (OVN), confirmou que existe uma grande resistência das vítimas em denunciar. Em 2019, o OVN recebeu 74 denúncias, no ano anterior tinham sido 101, o que pode ser explicado com o facto de não se identificarem como vítimas. "Os ciúmes, que neste caso são a principal causa atribuída à violência, muitas vezes são percecionados como demonstração de amor". A investigadora aponta a "falta de confiança nas instituições", no que respeita à proteção, e lembra os casos de mortes por violência doméstica praticadas por agressores que tinham sido denunciados.
Outros dados
Violência doméstica
A campanha de 2018, #NamorarMemeASério, divulgou a Linha do Serviço de Informação às Vítimas de Violência Doméstica (800 202 148). Em 2019, foram relatadas 465 situações de abuso, mais 143 do que em 2018.
PSP nas escolas
No ano passado a PSP realizou 1335 ações sobre a violência no namoro para mais de 35 mil alunos.
APAV dá conselhos
No microssite "APAV para jovens" há um separador sobre violência no namoro, com informações e conselhos.