O Tribunal da Relação de Évora (TRE) acaba de mandar reintegrar quatro militares da GNR que, em primeira instância, tinham sido condenados nas penas acessórias de proibição do exercício de funções, por se ter provado que invadiram domicílios, sequestraram e agrediram quatro imigrantes indianos que trabalhavam nas estufas de Vila Nova de Milfontes, no concelho alentejano de Odemira.
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Estas agressões foram confirmadas pela Relação de Évora, que manteve as penas de prisão, suspensas, a que os quatro arguidos também tinham sido condenados pelo Tribunal Judicial de Beja, por quatro crimes de ofensas à integridade física, dois de violação de domicílio e dois de sequestro.
Em relação a um quinto militar julgado no mesmo processo, o TRE manteve tanto a pena principal, de seis anos de prisão efetiva, como a pena acessória de proibição de funções aplicadas em Beja.
Os militares João Lopes, Rúben Candeias, Luís Delgado e Nélson Lima, com idades entre 24 e 30 anos, recorreram das penas de prisão suspensas, que iam dos três anos e meio aos cinco anos em cúmulo jurídico, das indemnizações a pagar e da proibição de exercício de funções na GNR, por períodos entre dois anos e dois anos e meio.
O TRE só acolheu a terceira pretensão, em acórdão proferido no final de novembro, e os arguidos já estão de regresso ao serviço. Questionado pelo JN, o Comando Geral da GNR confirmou que "três militares já regressaram ao serviço e um irá regressar brevemente".
Na apreciação da parte dos recursos relativa à proibição de funções, o TRE seguiu o parecer emitido do Ministério Público junto deste tribunal, no sentido de que fosse "revogada a decisão" de afastar os arguidos da GNR, "em virtude de nenhuma das penas parcelares ultrapassar os três anos".
Invadiram casa sem mandados
Como noticiou já o JN, este processo relaciona-se com um jantar, em setembro de 2018, num restaurante de Almograve, que juntou cerca de 25 trabalhadores agrícolas indianos e foi "patrocinado" por um indivíduo, da mesma nacionalidade, conotado com o tráfico de seres humanos para exploração laboral. Vários trabalhadores desentenderam-se com o antigo patrão, queixando-se de que o mesmo lhes devia dinheiro. Mas foi já quando estavam em casa que lhes apareceram os cinco arguidos. Terão entrado nos domicílios, sem mandados, e transportado as vítimas para outro local, agredindo-as com murros, pontapés e golpes de bastão.
Estes factos também deram origem a um processo interno, que está em curso na Inspeção-Geral da Administração Interna.
Três condenados são investigados noutro processo
Três militares da GNR condenados pelas agressões aos imigrantes asiáticos e um colega deles, igualmente colocado no posto da GNR de Vila Nova de Milfontes, foram constituídos arguidos pela Polícia Judiciária (PJ) de Setúbal e estão a ser investigados num novo processo-crime em que há suspeitas de maus-tratos sobre cidadãos estrangeiros.
Segundo apurou o JN, quando os cinco condenados do processo dos indianos foram detidos, em 8 de maio de 2019, a PJ apreendeu os telemóveis dos arguidos, tendo encontrado fotografias e vídeos onde outros cidadãos asiáticos são humilhados e obrigados a fazer flexões, a rastejar e a fazer outros exercícios físicos, tanto no exterior como no interior do posto da Guarda.
Depois de visualizarem as imagens, os inspetores da PJ remeteram o caso para o Ministério Público de Odemira, que extraiu uma certidão e ordenou a investigação num processo autónomo. O JN apurou ainda que o caso continua a ser investigado pela PJ, podendo os militares vir a serem acusados de crimes de abuso de poder, ofensas corporais e, no limite, sequestro.
Beja condena
Os arguidos começaram por ser proibidos de exercer funções porque o Tribunal de Beja concluiu, nos termos do disposto no artigo 66 do Código Penal, que tinham cometido "crime punido com pena de prisão superior a três anos", em "grave violação dos deveres que lhe são inerentes" e revelando "indignidade no exercício do cargo".
Évora absolve
O Tribunal da Relação entendeu, pelo contrário, que a lei só permitia a pena acessória de proibição de funções se pelo menos um das penas parcelares aplicadas aos arguidos fosse superior a três anos. O que não era o caso.