Flash interview com Miguel Guedes, 38 anos, vocalista dos Blind Zero.
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A Senhora do Caravaggio vai fazer falta à Selecção?
Nunca foi a "nossa senhora" e nunca operou milagres por cá. Não faz falta nenhuma, pelo contrário. Contra Atena, a deusa grega da sabedoria e civilização, a Senhora do Caravaggio perdeu duas vezes e uma oportunidade única. A sua ausência é um alívio. Credo!
Portugal não está na lista dos favoritos de Scolari, que inclui Brasil, Argentina e Espanha. Está na sua?
Scolari é um homem crente, mas sabe bem que a sua ausência não é suficiente para ganhar um Mundial. Tem toda a razão.
Já perdoou a Scolari o afastamento de Vítor Baía da Selecção?
Com certeza. Sujeitar e reduzir o mais vitorioso e melhor guarda-redes português desse momento a um simples homem de mão de um sargento seria sempre um título desonroso que Baía não merecia.
Sinceramente, consegue empolgar-se com o Mundial quando o F.C. Porto acaba de contratar “o André”, como o trata Pinto da Costa?
Duplamente empolgado. Como o F.C. Porto não vive em apartheid, pode e deve dar oportunidade a novas e brancas figuras. Um Mundial é sempre uma prova às escuras, mesmo para Queiroz (para muitos, o eterno "Carlos"). Ambos podem ganhar e para "o André" será só uma questão de tempo.
Queiroz promoveu um encontro entre a Selecção portuguesa e o alpinista João Garcia para explicar aos jogadores o que é a motivação. Acha que foi um apelo desesperado para que eles façam tudo o que for necessário para ganhar, incluindo perder partes do corpo?
O alpinista João Garcia é um exemplo romântico e a Selecção portuguesa não pode deixar de ser apaixonante. Se há algo que por vezes falta a esta Selecção é mesmo maior motivação. Altitude para que vos quero, menos gestão de esforço e mais respiração rarefeita.
A lesão de Drogba, da Costa do Marfim, é o bilhete que faltava a Portugal para passar aos oitavos-de-final?
Portugal está demasiadamente preocupado com as suas próprias lesões, tem pouco interesse no quadro clínico dos outros. Recuperar Pepe, elevar Deco, potenciar Ronaldo, acomodar Liedson. E os laterais, essa lesão permanente.
A lista de lesionados ainda não parou de aumentar: Michael Ballack, Michael Essien, Rio Ferdinand.... A história da política mostra que também houve vários líderes lesionados (Berlusconi levou com um ferro, Bush com um sapato, Soares foi agredido) e nunca desistiram. Os políticos são mais resistentes que os futebolistas?
Há uma enorme diferença: vão a eleições, fazem-se de coitadinhos e ganham. Não é a resistência, é o povo.
Cavaco Silva, cujas declarações podem quase contar-se pelos dedos das mãos, decidiu ontem deixar uma mensagem à Selecção. É um dom particular para se fazer ouvir em assuntos menores?
Mais uma vez, à semelhança da questão insular, quando falamos na Selecção falamos na unidade nacional. Gosto mesmo muito quando o Presidente deixa mensagens. Sinceramente, que pode ele mais fazer?...
Na despedida da Selecção, mais de 100 mil pessoas quiseram despedir-se dos jogadores com grande euforia. É tipicamente português celebrar antes do tempo?
É o histórico e sempre presente "Adeus português" para África. A celebração da despedida esteve sempre presente no fado, mas a grande diferença é que no futebol ainda é possível bater palmas no fim.
A alcunha “navegadores” remete para o passado. Não há inspiração possível no presente nacional?
Não sou fã dessa alcunha, mas confesso que seria difícil chamar-lhes "Mourinhos". Para além de que, depois da infeliz escolha da canção oficial, "I Gotta Feeling", foram obrigados a reconciliar-se com a antiga portugalidade. O arrependimento também é ser português.