Estavam prometidas três horas de The Cure e assim foi. A banda liderada pelo muito carismático Robert Smith está em grande forma e apresentou um espetáculo a que apenas os mais resistentes conseguiram assistir do início ao fim.
Corpo do artigo
Assim que as luzes do palco se acenderam, à meia-noite, um burburinho invadiu todo o recinto. Uma mistura de expectativa e excitação parecia percorrer os corpos das cerca de 54 mil pessoas que ali se encontravam, na ansiedade de ver entrar em palco Robert Smith, o homem da noite. Quando se vislumbrou aquela figura vestida de negro, cabelo desgrenhado e lábios vermelhos a avançar no meio do instrumental que dá início a "Plainsong", um misto de apoteose e fascínio dominou o público, de pescoço esticado para absorver cada segundo.
Robert Smith parece não ter deixado o tempo passar por ele, e aos 53 anos conserva a mesma profundidade e emoção na voz, como se cada canção tivesse sido escrita e vivida naquele preciso momento. Essa emoção atravessa o público, que entoa com sentimento "Pictures of you", "Lullaby" ou "The End of the world". O magnetismo de Smith é surpreendente, em especial quando se tem em consideração que é o líder de uma banda que vai a caminho das quatro décadas de carreira.
O grupo britânico já comemorou o 36º aniversário e foi com 36 canções que brindou o público português na noite de sábado. Com 13 discos de estúdio e um sem fim de êxitos que se acumulam desde 1979, os The Cure podem dar-se ao luxo de fazer o alinhamento que quiserem, tendo a certeza que não faltarão fãs satisfeitos.
Nas primeiras filas não há canção que não seja trauteada, independentemente da década em que foi feita ou do género a que mais se aproxima. As favoritas exigem dedicação redobrada ou volume mais elevado. O próprio alinhamento é pensado para todas as gerações que ouvem The Cure, integrando temas dos discos dos anos 80, 90 e até do último, "4:13 Dream", editado em 2008: "A Forest"(1980), "In Between Days"(1985), "Mint Car" (1996), "Sleep When I'm Dead" (2008).
Da formação original dos The Cure apenas resta Robert Smith, que depois de muita dança das cadeiras se faz acompanhar por Simon Gallup no baixo, Reeves Gabrels na guitarra, Roger O"Donnell no teclado e Jason Cooper na bateria. Em palco, há rock, envolvido em luzes e fumos que criam atmosferas que velam a figura tímida de Robert Smith. Dele pouco mais se ouve do que uns "obrigados" entre canções.
A banda apresenta uma excelente forma ao vivo, mas nem todos os festivaleiros têm pedalada para acompanhar três horas de concerto até às 3 horas da madrugada. Passadas duas horas, já muitos tinham desligado do que se passava em palco, e os que desde o início se tinham mostrado mais preocupados em aprofundar a arte de socializar do que em ouvir música, continuavam a sua lavra, incomodando quem, de facto, estava ali para assistir ao concerto.
"Friday I'm in Love" e "Boys Don't Cry" - deixada para o segundo de três encores - foram entoadas a plenos pulmões pelo público, que despertou em massa quando os primeiros acordes de ambas as músicas se fizeram ouvir. Quando o concerto terminou, a imensa moldura humana que o enquadrara ao início já se desfizera, mas uns bons milhares de resistentes não arredaram pé até as luzes do palco se apagarem.