Falta de transparência e ligação entre MPLA e Estado pairam sobre eleições da próxima quarta-feira.
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As eleições em Angola, no dia 24, prometem uma disputa acesa e renhida entre os dois principais oponentes: o Movimento Popular para a Libertação de Angola (MPLA), no poder desde a independência, e a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), líder da oposição.
Mais de 14 milhões de eleitores são chamados às urnas para escolher o próximo Presidente da República e, consequentemente, os deputados da Assembleia Nacional. Depois de mais de 30 anos presididos pelo recém-falecido José Eduardo dos Santos, cujo corpo chegou no sábado a Luanda, Angola está sob a liderança de João Lourenço desde 2017 e rege-se, desde sempre, pelo mesmo partido político, o MPLA.
A Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral (CASA-CE), o Partido de Renovação Social (PRS), a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), a Aliança Patriótica Nacional, o Partido Nacionalista para Justiça em Angola e o Partido Humanista de Angola concorrem também à presidência. Os partidos lutam, ainda, por um número de votos que lhes permita mais lugares no parlamento, por forma a equilibrar a balança do poder político angolano - dominado há décadas pelo MPLA.
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Este é apenas o quinto processo eleitoral multipartidário desde que o país conquistou a independência, em 1975. Em 1992, a Oposição contestou os resultados eleitorais e o país mergulhou novamente numa guerra. A paz só seria alcançada em 2002. Este ano, pela primeira vez, os angolanos residentes no estrangeiro são convocados a votar, e há também mais mulheres e jovens nas listas de candidatos a deputados dos dois principais partidos.
A Assembleia Nacional é constituída por 220 deputados, dos quais 130 são eleitos através das listas dos partidos, em função do número de votos obtidos por cada força política a concorrer nas eleições. Os restantes 90 deputados são eleitos com base nas listas provinciais, sendo que cada província elege cinco deputados. A Constituição define o sistema político angolano como presidencialista.
Atualmente, o MPLA tem uma maioria absoluta com 150 lugares na assembleia, seguido da UNITA com 51 deputados, e a CASA-CE com 16. O PRS conta apenas com dois deputados e a FNLA com um.
a campanha eleitoral tem sido marcada pela falta de transparência, numa relação estreita entre o MPLA e o Estado
País enfrenta seca, inflação e pobreza
João Lourenço promete reformar o Estado, reduzir as desigualdades e atingir a estabilidade macroeconómica se for reeleito. Na terça-feira, a Amnistia Internacional denunciou que, com as eleições a aproximarem-se, Angola tem sofrido uma repressão de direitos humanos sem precedentes - nomeadamente com assassinatos, prisões arbitrárias e fome.
Escolhido a dedo pelo antecessor, Lourenço prometeu uma nova era para Angola, depois de vencer as eleições de 2017 com 61% dos votos. Embora a reforma económica tenha reconhecimento internacional, pouco mudou desde então para milhões de angolanos que vivem em pobreza, enquanto a inflação escala e o país enfrenta a pior seca dos últimos 40 anos.
Dois cenários
Um relatório do Instituto de Estudos de Segurança da África do Sul sobre as eleições em Angola prevê dois cenários prováveis de violência pós-eleitoral. Se, por um lado, o MPLA vencer, o país poderá enfrentar a ira popular; por outro lado, se a UNITA ganhar, o atual Governo pode recusar a transferência de poder e instalar violência.
Borges Nhamirre, o investigador autor do estudo, explica ao JN que a campanha eleitoral tem sido marcada pela falta de transparência, numa relação estreita entre o MPLA e o Estado. Embora o país se tenha tornado mais aberto nos últimos anos, continua a ser classificado como "não livre" pela organização vigilante democrática Freedom House.
A representação desigual nos media, a presidência do Tribunal Constitucional por uma juíza membro do MPLA, a recusa de observadores e de uma contagem paralela, a segurança estatal do presidente e a lista de eleitores não auditada (como dita a lei) são algumas incongruências elencadas no relatório que levantam a dúvida sobre se estas serão eleições justas.
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