Além da criminalização do incentivo ao aborto, clínicas privadas foram impedidas de realizar o procedimento. Organização Mundial da Saúde alerta: “isto será um golpe contra os abortos com medicamentos”, mais seguros.
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Teoricamente, a Rússia possui uma das legislações mais liberais do mundo no que concerne ao aborto, sendo que, apenas no ano passado, mais de meio milhão de gestações foram interrompidas. Porém, cada vez mais as autoridades procuram limitar o acesso a este procedimento. Um quinto das interrupções de gravidez no país são realizadas em clínicas privadas, que têm sido pressionadas por entidades da Igreja Ortodoxa Russa a deixar de disponibilizar o serviço. A medida começou por ser implementada na região anexada da Crimeia, no início de novembro, mas, poucos dias depois, estendeu-se até à região de Kursk.
Os medicamentos utilizados para abortar, cujas vendas aumentaram em mais de 50% no ano passado, também começaram a ser restringidos e, a partir de 2024, qualquer pessoa que tente adquirir os fármacos terá a sua compra registada numa base de dados. Além disso, o Ministério da Saúde elaborou diretrizes que instruem os médicos sobre as melhores formas para dissuadir mulheres que queiram interromper a gravidez – por exemplo, se a paciente for solteira, deverá dizer-lhe que “ter um filho não será obstáculo para encontrar um companheiro para a vida”.
A população da Rússia, estatisticamente, permanece igual há 20 anos. A Igreja aponta o aborto como sendo uma das principais causas da crise demográfica, uma vez que pelo menos um terço das mulheres russas já abortou. “A população pode ser aumentada como por magia: se resolvermos este problema e aprendermos a dissuadir as mulheres de abortar, as estatísticas aumentarão imediatamente”, disse o patriarca Kirill, líder religioso.
Os especialistas temem que esta campanha seja nociva para a saúde feminina, uma vez que desencoraja interrupções com medicamentos, mais seguras, e força-as a procurar alternativas, nem sempre legais. “Os abortos cirúrgicos acarretam maiores riscos de complicações, efeitos colaterais e lesões. É por isso que o mundo está a deixar de os praticar”, advertiu a Organização Mundial da Saúde.