Valorização dos principais ativos digitais tem contrariado o normal movimento de procura de refúgio que, tradicionalmente, transfere fundos dos investidores para o ouro ou o petróleo.
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As sanções do Ocidente à Rússia, nomeadamente o bloqueio do sistema internacional de pagamentos entre bancos (Swift), estão a ser contornadas através das moedas digitais e do CIPS, o sistema chinês semelhante ao Swift.
Apesar das restrições de Putin à saída de rublos do país e do congelamento das reservas russas em dólares e em euros, as famílias mais ricas com dinheiro fora da Rússia terão conseguido escapar com o respaldo das corretoras de moedas digitais não reguladas. Mas não conseguem comprar nada, porque ninguém vende nada à Rússia e, em breve, não conseguirão pagar o custo da guerra, vaticinam os especialistas.
O comportamento dos denominados ativos de refúgio em tempo de guerra ou crise internacional - nomeadamente, o ouro e o petróleo - têm acompanhado a trajetória ascendente que os analistas esperavam.
Corretoras não alinham
"A bitcoin (BTC) valorizou cerca de 15% desde a invasão da Ucrânia pela Rússia. Trata-se de um comportamento atípico, visto que as criptomoedas são percecionadas como ativos de risco e, normalmente, têm tendências similares às ações e outros ativos que têm sido penalizados na última semana", explicou Paulo Rosa, economista sénior do Banco Carregosa. "Provavelmente, a BTC tem sido utilizada pelo povo russo para contornar as sanções impostas pelo Ocidente e respetivo bloqueio aos pagamentos internacionais via Swift", concluiu.
Apesar da valorização - 13% só esta semana -, a BTC continua longe do máximo histórico, atingido a 11 de novembro passado (68 mil dólares), nota Henrique Tomé, da corretora XTB, o que "pode comprovar transações" a Leste.
Paulo Cardoso do Amaral, docente na Católica Lisbon, especializado em Inovação Digital, acredita que "a Rússia, mesmo fora do sistema bancário, continua a receber pagamentos enquanto continuar a fornecer gás ao exterior, nomeadamente 40% nas necessidades da Europa". Se os negócios não puderem passar pelo Swift, "podem sempre usar o CIPS, o concorrente chinês do Swift baseado em yuans [moeda chinesa]". Para o especialista em sistemas de informação, "o maior problema da Rússia vai ser não ter a quem comprar", uma vez que "as aquisições de criptomoedas só podem ser feitas fora do país ou através de corretoras não reguladas".
É o caso de plataformas como a Binance, a Kraken ou a Dex, exemplifica Henrique Tomé. "São descentralizadas, não podem ser bloqueadas e ninguém consegue intervir na rede", acrescentou o analista.
"Banir unilateralmente o acesso das pessoas às suas cripto é uma contradição face ao motivo pelo qual as cripto existem", declarou a Binance, em resposta ao apelo do presidente ucraniano, que pediu às corretoras para bloquearem transações com origem na Rússia.
Oligarca apela a banco central para reconhecer cripto
Oleg Deripaska, um dos maiores bilionários russos, apelou ao banco central russo que reconhecesse as criptomoedas como meio de pagamento. "Quando é que o desenvolvimento das tecnologias financeiras vai abrir uma brecha nesta parede de superstição? Quando é que vamos ter um verdadeiro instrumento financeiro que assegure a independência em negócios externos?", questionou, no Telegram.
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