Os voos de drones russos na Polónia, sejam eles intencionais, como acusam alguns aliados europeus da Ucrânia, ou acidentais, constituem um teste à preparação e solidez da NATO.
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Sobrevoos intencionais?
A Rússia enviou, durante a madrugada desta quarta-feira, uma nova salva maciça de mais de 450 drones e mísseis contra a Ucrânia.
Segundo o primeiro-ministro polaco, Donald Tusk, 19 das aeronaves não-tripuladas violaram o espaço aéreo da Polónia, membro da NATO, três dos quais foram abatidos, com a ajuda de caças furtivos F-35 neerlandeses.
Estes drones de baixo custo são sensíveis à forte interferência eletrónica ucraniana, que pode perturbar a sua trajetória.
O Ministério da Defesa russo garantiu que "não havia qualquer intenção de atacar alvos em território polaco".
Mas o ministro dos Negócios Estrangeiros polaco, Radoslaw Sikorski, afirmou hoje não ter "qualquer dúvida de que não foi acidental".
"Que cerca de vinte drones se encontrem acidentalmente num território onde não deveriam estar parece-me muito improvável", considerou Ulrike Franke, investigadora do ECFR, um grupo de reflexão europeu.
Há precedentes: "Desde 2022, houve várias intrusões de drones inimigos na Polónia, na Roménia, na Lituânia e até na Croácia", recordou Romain Le Quiniou, do centro de reflexão Euro Créativ.
"Esta não é a primeira nem será a última vez que assistimos a uma violação do espaço aéreo da NATO, já se contam às dezenas. Os russos estão constantemente a testar os limites", argumentou um oficial de alta patente da Aliança Atlântica.
Cartões SIM utilizados na Polónia ou na Lituânia, que podem servir para orientação utilizando a rede de telemóveis desses países, também foram encontrados em julho a bordo de drones russos abatidos na Ucrânia, segundo o diário ucraniano "Defence Express".
Qual será o interesse de Putin?
Há vários.
Do ponto de vista tático, para atacar a Ucrânia. De acordo com duas fontes militares entrevistadas pela agência noticiosa francesa, AFP, alguns drones russos invadiram o espaço aéreo polaco antes de se desviarem para a Ucrânia, numa tentativa de apanhar de surpresa os seus sistemas de defesa.
Além disso, a manobra é rica em ensinamentos para Moscovo: "São testes físicos para ver se os nossos sistemas funcionam, se as regras de combate funcionam", analisou o oficial da NATO.
Outro interesse, desta vez diplomático, é que tal contribui para manter "uma tensão latente", segundo essa fonte, e permite "verificar onde está o limite com [o presidente dos Estados Unidos] Donald Trump", que em vão multiplicou os ultimatos para exortar a Rússia a cessar as hostilidades na Ucrânia.
Estes voos de drones na Polónia ocorrem poucas horas antes do início do grande exercício militar Zapad 2025, organizado na Bielorrússia e na Rússia, pouco depois do anúncio pelos países europeus da "Aliança de Voluntários" da sua intenção de oferecer garantias de segurança a Kiev após um cessar-fogo.
Por fim, a longo prazo, "também é muito bom para assustar os europeus. Envia o sinal: "Se vocês fizerem alguma coisa, também podemos alargar esta guerra para que ela vos atinja"", avaliou Ulrike Franke.
A NATO está preparada?
"A NATO reagiu rapidamente e de forma decisiva", congratulou-se o comandante supremo das forças aliadas na Europa (SACEUR), o general norte-americano Alexus Grynkewich.
Mas, para além desta reação contra um número muito reduzido de drones, existem dúvidas sobre a capacidade da NATO e da Europa para combater um ataque aéreo russo em grande escala.
"Três ou quatro drones abatidos em 19 não é uma boa proporção. Será porque eles não representavam perigo ou porque só conseguimos abater esses?", questionou Franke.
Neutralizar drones baratos com munições disparadas por caças que custam fortunas não é viável a longo prazo.
"Se nós, os países ocidentais, tivermos de disparar contra alvos de 10 mil dólares com mísseis de um milhão de dólares, um dia perderemos", resumiu, em 2023, o almirante francês Pierre Vandier, que desde então se tornou comandante supremo para a transformação das forças da NATO (SAC-T).
"A utilização de caças F-35 e F-22 contra drones mostra que ainda não estamos prontos", sustentou hoje o antigo comandante do exército norte-americano na Europa, o general Ben Hodges.
Quanto à defesa contra mísseis, a estratégia europeia promovida por Berlim de se proteger sob um escudo antimísseis "é perdedora", considerou o investigador alemão Fabian Hoffman.
"A Rússia produz cerca de uma vez e meia a duas vezes mais mísseis balísticos e de cruzeiro do que a Europa produz intercetores e ultrapassa largamente a Europa em termos de produção de drones de longo alcance", argumentou.