De um dia para o outro, milhões de crianças ucranianas viram as suas vidas viradas do avesso. Acabaram-se as aulas, as brincadeiras com os amigos e as celebrações familiares. O único objetivo agora é sobreviver. Muitas foram forçadas a deixar tudo para trás e rumaram para o desconhecido em busca de segurança. Algumas já se tornaram um símbolo de uma guerra que lhes roubou a inocência.
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Uma menina tranquilamente sentada na janela de um edifício em ruínas, com fitas amarelas e azuis no cabelo, um chupa-chupa na boca e uma shotgun nos braços. Um símbolo de força e de resistência e do quotidiano de uma criança ucraniana em tempo de guerra. A fotografia, intitulada "Menina com doce" tornou-se viral, mas o que muitos não sabem é que foi encenada. A 22 de fevereiro, dois dias antes da invasão russa, Oleksii Kyrychenko, fotógrafo amador e engenheiro de profissão, decidiu fazer uma sessão fotográfica com a filha de nove anos "para chamar a atenção do Mundo para a agressão russa na Ucrânia". Mesmo sendo encenada, o impacto visual da foto não deixou ninguém indiferente e chegou até ao antigo presidente do Conselho Europeu Donald Tusk. O político polaco partilhou a imagem nas suas redes sociais com a legenda: "Só não lhe digam, por favor, que sanções mais duras seriam demasiado caras para a Europa". E a partir deste momento a fotografia de Oleksii explodiu nas redes sociais tendo sido partilhada milhões de vezes pelos utilizadores.
Sozinho por mais de mil quilómetros até à Eslováquia
Com apenas 11 anos, Hassan Pisecká viajou sozinho da cidade de Zaporizhzhya, no sudeste da Ucrânia, até à fronteira com a Eslováquia, no oeste do país. Ao todo percorreu mais de mil quilómetros a pé e de comboio apenas com um saco de plástico, o passaporte e um número de telefone escrito na mão. A mãe de Hassan, Júlia, teve de ficar em casa a tomar conta da avó de 84 anos que está acamada. Mas optou por colocar o filho a salvo e mandou-o ao encontro dos irmãos, estudantes na Eslováquia. Meteu o menino num comboio lotado em direção à fronteira. Hassan teve de fazer vários transbordos e ainda caminhou grande parte do caminho juntamente com milhares de outros refugiados. Conseguiu chegar à fronteira e, graças ao número escrito na mão, as autoridades alertaram os irmãos, que foram rapidamente ao seu encontro. "Foi a esperança que me carregou", explicou o menino. A história viria a ter um final ainda mais feliz. Júlia conseguiu arranjar transporte para si e para a mãe. Dez dias após ter saído de casa e já a salvo na Eslováquia, Hassan reencontrou-se com a mãe e a avó e ainda o seu cão que não o pudera acompanhar.
Luz de esperança nasce sob a terra ao som de bombas
A população de Kiev sabia que as estações de metro, construídas na década de 60 do século passado, no auge da Guerra Fria, também tinham o propósito de servir como abrigos antiaéreos para um eventual ataque da NATO. Sessenta anos depois, as bombas que caíram não foram americanas, mas sim russas. A 26 de fevereiro, quando soaram as sirenes, uma grávida correu a refugiar-se numa das estações. Enquanto esperava pelo fim do bombardeamento, a bebé decidiu que era tempo de nascer. "Mia nasceu num abrigo num ambiente stressante - o bombardeamento de Kiev. A sua mãe está feliz após este nascimento desafiante", anunciou, no Twitter, a deputada ucraniana Hanna Hopko, publicando também uma foto da bebé a segurar na mão da mãe. O nascimento da pequena Mia foi visto como um raio de esperança e até a primeira-dama ucraniana partilhou a foto da recém-nascida. "Isto deveria ter ocorrido em condições completamente diferentes, debaixo de um céu tranquilo. É o que as crianças devem ver. (...) Mas as crianças nascidas nos abrigos viverão num país pacífico que se defendeu", escreveu Olena Zelenska.
Música no bunker foi ouvida em todo o Mundo
Amelia está no centro de uma cave em Kiev que abriga algumas dezenas de pessoas. Com apenas sete anos, olha timidamente para a câmara e começa a cantar. Primeiro baixinho e depois cada vez mais alto à medida que ganha confiança. As pessoas apercebem-se e ficam em silêncio para a ouvir cantar "Let it go", um tema do filme Frozen. No fim, uma salva de palmas faz o olhar de Amelia reluzir ainda mais. O vídeo foi captado e partilhado no Facebook por Marta Smekhova. "Olhem, russos, contra quem vocês estão lutando. (...) As nossas crianças irradiam luz e, mesmo numa cave escura e reles, ela não se ofusca e brilha ainda mais!", escreveu. O vídeo foi visto por milhões de pessoas, inclusive até pela artista principal do filme Frozen. "Nós vemos-te. Nós vemos-te mesmo", garantiu Idina Menzel. Também a compositora da música elogiou a "menina com a linda voz". "A maneira como cantas é como um truque de magia que espalha luz no nosso coração e cura todos os que a ouvem. Continua a cantar! Nós estamos a ouvir", disse Kristen Anderson-Lopez. Amelia conseguiu entretanto sair de Kiev e já está a salvo na Polónia.