No próximo dia 28 de maio realizam-se, em Espanha, as eleições regionais e municipais, sendo que 12 das 17 regiões autónomas também vão a votos. Nas cidades de Ceuta e Melilla, no enclave espanhol no Norte de África, a votação, que já decorre de forma antecipada, está a ser dificultada pela compra de votos e pela "máfia" que assalta os carteiros.
Corpo do artigo
Enquanto na maior parte das cidades e regiões os candidatos ainda se encontram em campanha eleitoral, em Ceuta e Melilla, territórios autónomos de Espanha que se localizam no Norte de África, uma parte da população, que não vota presencialmente ou eletronicamente, já começou a receber os boletins eleitorais esta segunda-feira.
O que pode, contudo, parecer um procedimento simples está a ser um verdadeiro pesadelo para os carteiros locais, que não estão a conseguir fazer a recolha dos envelopes sem o auxílio da Polícia Nacional e da Guarda Civil.
Em apenas dois dias, ocorreram cinco ataques nos quais foram roubados pelo menos 80 boletins recolhidos diretamente na casa dos eleitores. As investidas são, no entanto, apenas a ponta do iceberg de um esquema de roubo e compra de votos estabelecido na cidade autónoma há vários anos, uma vez que não é a primeira vez que as autoridades locais lidam com o problema.
De acordo com a Polícia Nacional, trata-se de uma "máfia" já existente há vários anos, mas que se tem intensificado nestas eleições regionais, já que o número de ocorrências tem aumentado, tal como o nível de violência aplicada durante os roubos.
Em 2023, é a primeira vez que os carteiros estão a sofrer agressões diretas durante a realização do seu trabalho. "Pedimos mais segurança. Um dia vai acontecer uma desgraça", alertou Juan Diego Román, delegado sindical da CC OO na cidade, em declarações ao jornal espanhol "El País".
O objetivo, de acordo com fontes policiais ouvidas pelo jornal, é fazer pender a balança numa luta aguerrida entre o Partido Popular (PP) e a Coligação de Melilla.
Pagamento de votos vai até aos 800 euros
A recolha de boletins foi, esta terça-feira, suspensa devido aos atentados perpetrados desde o primeiro dia, sendo retomada um dia depois sob alçada da Polícia Nacional e da Guarda Civil que, ainda assim, se queixam por não terem mãos a medir perante a ameaça constante.
A rede de tráfico de votos funciona em pirâmide, segundo as conclusões da investigação policial. O topo é ocupado por militantes dos partidos políticos e a base formada por traficantes que estão encarregues de fazer o trabalho de terreno.
Além do roubo de boletins eleitorais - já que, em Melilla, 7387 pessoas solicitaram o voto por correspondência, o que representa 13,39% do total de votos provenientes da cidade, segundo dados do Ministério do Interior de Espanha -, nos locais onde estão colocadas as urnas compram-se votos.
Embora os locais sejam amplamente vigiados, as autoridades não conseguem controlar o pagamento de votos, que, segundo fontes policiais ouvidas pelo jornal espanhol, está "cada vez mais normalizado" e varia entre os 50 e 800 euros.
As autoridades admitem que não é fácil provar judicialmente os crimes, tendo em conta que o "negócio" funciona como uma rede de narcotráfico, porém, no passado, já houve quem chegasse à barra dos tribunais.
Em 2021, o Supremo Tribunal condenou a dois anos de prisão o ex-presidente da cidade e líder da Coligação de Melilla, Mustafa Aberchán, tal como o ex-secretário geral do PSOE de Melilla, Dionisio Muñoz Pérez, pela suposta compra de votos nas eleições de 2008.
Menos de uma semana após ter começado a votação antecipada, já foi iniciada uma investigação policial, mas ainda não há indícios de que partidos políticos estarão à frente do esquema, como tal, também ainda não se registaram detenções.
Escândalo ensombra Imbroda
Atualmente, Melilla é presidida por Eduardo de Castro, eleito em 2019 pelos deputados do Ciudadanos, PSOE e da Coligação de Melilla.
Para já, de acordo com as sondagens, quem conta com mais intenções de voto é Juan José Imbroda, do PP. Porém, nas últimas eleições, em 2019, o político viu-se envolvido num escândalo, já que o próprio filho foi apanhado a comprar votos para beneficiar o partido do pai - na altura igualmente candidato à corrida eleitoral.
A cidade, que conta com apenas 12 quilómetros quadrados, mas possui cerca de 86 mil habitantes, tem a maior densidade populacional de Espanha e a maior taxa de natalidade do país, a par de Ceuta. Quase metade da população do enclave é muçulmana, sendo que muitas pessoas têm dupla nacionalidade: espanhola e marroquina.
