Especialistas apontam falhas nas aulas de condução e pedem mais fiscalização. Motociclistas procuram cursos. Excesso de velocidade é "grande fator de risco".
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A sinistralidade com motociclos está a aumentar e a ultrapassar os números pré-pandemia. De acordo com dados da PSP e da GNR, contabilizaram-se 10.194 acidentes com motas em 2022, dos quais resultaram 104 mortos. Todos os indicadores estão a agravar-se face a 2019. Houve mais 441 acidentes, mais oito mortos, mais 20 feridos graves e mais 629 ligeiros. Em 2020 e 2021, a análise esteve condicionada pela pandemia, dada a redução da circulação. Os especialistas apontam falhas nas aulas ministradas a motociclistas e pedem mais fiscalização. Nas últimas semanas, houve vários acidentes fatais. O mais recente foi no domingo: um homem de 48 anos residente na Trofa morreu na sequência do embate entre a mota que conduzia e um carro na Maia.
Domingos Simões criou em 2019 a Academia de Condução Moto (ACM) com o objetivo de "preencher lacunas na formação dos motociclistas" e "reduzir a sinistralidade" das motas para zero. O antigo militar da GNR explica que os cursos são sobretudo frequentados por pessoas a partir dos 40 anos, que compraram motas de "grande potência", mas não as sabem usar. Como o JN noticiou, a venda de motociclos em 2022 ultrapassou o recorde de 2021: cerca de 100 motas vendidas por dia. "Há 700 pessoas em lista de espera" para a formação, diz. Apesar de terem título de condução, a maioria dos alunos não sabe como circular com perícia e segurança, diz o diretor.
"Saber travar e curvar"
Alain Areal, diretor-geral da Prevenção Rodoviária Portuguesa (PRP), aponta existirem exercícios "imprescindíveis" que "não são ensinados" nas escolas de condução, como saber "travar e curvar". Os representantes daqueles estabelecimentos relembram que a lei permite conduzir motas até 125 cc sem fazer qualquer exame ou formação.
O responsável da PRP defende que a fiscalização dos motociclistas seja reforçada, até devido à infração recorrente do não uso do capacete. A GNR contabiliza 3780 autos de contraordenação a motociclos em 2022 (menos 21,3% do que em 2019). "As infrações mais comuns são a falta de utilização ou utilização incorreta de capacete, as relacionadas com componentes e acessórios, com chapas de matrícula e as relativas a estacionamento", aponta.
Metas estão em risco
Para João Dias, professor no Instituto Superior Técnico, o excesso de velocidade é "um grande fator de risco". O especialista em dinâmica de acidentes rodoviários antevê que a Visão Zero, de zero mortes nas estradas até 2050 na União Europeia, não seja cumprida por causa dos sinistros com motas. "A fiscalização é mais importante do que a educação" neste caso, diz. A maior circulação de motas desportivas, mais potentes, deve ser analisada com precaução.
Os especialistas dizem que o aumento da sinistralidade não é estranho, uma vez que houve um "boom" do seu uso agora e na pandemia. Alain Areal diz que tal deve-se a darem maior mobilidade, acesso a estacionamento gratuito e serem usados pelos estafetas de plataformas, como a Uber e a Glovo. A PRP vai avançar, em breve, com um estudo sobre o "impacto do comércio eletrónico sobre a venda de motas"."Há um crescimento da utilização a nível profissional, o que gera um cocktail perigoso".
Idade
Os detentores da carta de categoria B (automóveis ligeiros) podem, a partir dos 25 anos, conduzir motociclos até 125 centímetros cúbicos (A1) sem fazer qualquer exame ou formação específica.
Risco de sinistro
João Dias acredita que será necessário um regime penalizador para as motas desportivas, como seguros mais caros, porque são veículos mais potentes, o que poderá aumentar o risco de sinistro.
Exames
Para as categorias A, A1 e A2, a prova prática é composta por duas partes: as manobras especiais e a circulação em condições normais de trânsito em vias urbanas e não urbana. As manobras especiais são agrupadas em séries, em blocos de três.