É feita a partir dos 16 anos e com critérios apertados que incluem avaliação da maturidade. Associação defende que só deve acontecer em casos extremos.
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Já há adolescentes obesos a serem operados em Portugal, um tratamento em fim de linha que avança apenas quando a reeducação alimentar e exercício físico falham. Os critérios são apertados e têm em conta a maturidade dos doentes. Atualmente, a lista de espera para cirurgia bariátrica é de 755 pessoas.
Sara Vaz Rodrigues, cirurgiã pediátrica que integra a recém-criada Unidade de Tratamento Cirúrgico de Obesidade Pediátrica no Centro Hospitalar de Lisboa Central (CHLC), prepara-se para operar, no próximo mês, o primeiro de 20 menores que estão ali a ser acompanhados por uma equipa multidisciplinar. É um jovem que era seguido há anos no D. Estefânia, tem índice de massa corporal (IMC) 50 e diabetes.
"Está desejoso de ser operado e cansado de ser diabético e tomar medicação", conta Sara Vaz Rodrigues, explicando que este tipo de cirurgia só acontece após meses de acompanhamento e quando uma abordagem mais "conservadora", através de reeducação alimentar e exercício físico, não surte efeito.
Os critérios para a cirurgia são rigorosos e incluem, para além da análise do IMC (tem de ser superior a 40 ou, se estiverem associadas comorbilidades, superior a 35), uma avaliação da "maturidade" do adolescente. Depois da cirurgia, estes doentes serão seguidos durante pelo menos três anos.
Este tipo de cirurgia em adolescentes começou há pouco tempo em Portugal e faz-se "muito pontualmente. Muito mais pontualmente do que seria necessário", diz a médica, considerando que se deve "tornar este tratamento mais disponível para os doentes que precisam dele". Se os adolescentes cumprirem os critérios, sublinha a cirurgiã pediátrica, "não faz sentido esperar até aos 18 anos".
Não está definida uma idade mínima, mas, regra geral, em Portugal, a cirurgia bariátrica tem sido feita, nomeadamente no hospital Curry Cabral, em jovens a partir dos 16 anos.
"Muita prudência"
O estudo COSI, coordenado pelo Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, revela uma tendência de diminuição da obesidade nos mais jovens desde 2008. Ainda assim, em 2019, 29,7% das crianças entre os seis e oito anos tinham excesso de peso e 11,9% eram obesas. O impacto da covid-19 não está ainda estudado.
Mafalda Marcelino, secretária-geral da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo, realça que "todas as cirurgias num adolescente têm de considerar o ponto de vista psicológico e comportamental", avaliando a sua "maturidade" para compreender o que implica a cirurgia e os cuidados e mudanças de vida que se seguem. "É preciso muita prudência, não no sentido de não fazer, mas de avaliar o adolescente", acrescenta.
"A cirurgia só deve ser utilizada em casos extremos", tanto em adolescentes como em adultos, diz Carlos Oliveira, presidente da Adexo, a Associação de Doentes Obesos e Ex-Obesos de Portugal. O dirigente lembra que primeiro estão a mudança alimentar, exercício e fármacos. Há "fármacos aprovados que têm dado muito bons resultados, mas que, infelizmente, ainda não estão comparticipados pelo Governo".
Hospitais
Há 755 doentes em lista de espera
Em Portugal, há 755 doentes em lista de espera (dados provisórios de abril) para cirurgias a obesidade, adiantou ao JN a Administração Central do Sistema de Saúde. Em 2021, entraram 1536 doentes em espera, tendo sido operados nesse período 1217. De janeiro a abril de 2022 (dados provisórios), registou-se a entrada de um total de 675 doentes, tendo sido operados no mesmo período 578 doentes. No país existem quatro centros de responsabilidade Integrados (CRI) dedicados ao tratamento da obesidade (Centro Hospitalar de Entre Douro e Vouga, Universitário de S. João, Lisboa Central e Senhora da Oliveira, Guimarães).
Dia Nacional
Prioridades
No Dia Nacional da Luta contra a Obesidade, a Adexo defende várias mudanças: apostar na formação especializada dos médicos; criar um programa de consultas de obesidade nos cuidados de saúde primários; comparticipar fármacos para o tratamento e mudar a perceção pública, criando mecanismos para eliminar o estigma e a discriminação.
Maus hábitos
Segundo o estudo COSI, 80% das crianças consomem biscoitos/bolachas doces, bolos, donuts uma a três vezes por semana, sendo que 16% consomem estes alimentos quase diariamente. A isto soma-se o sedentarismo, pois a oferta de atividade física ao longo da semana não chega a todos. Apenas 19% das crianças vão a pé para a escola.
Em detalhe
1,2 mil milhões de euros é o custo direto do excesso de peso e obesidade em Portugal, segundo um estudo recente.
59% da população adulta e 1 em cada 3 crianças em idade escolar europeias têm excesso de peso ou obesidade.