É um marco na vida de todas as crianças: passar do 4.º para o 5.º ano. Este ano, a mudança será ainda mais radical pelo facto de os alunos terem tido o terceiro período confinados em casa. Muitos pais temem que não estejam à altura e há quem preferisse que repetissem o ano.
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"As crianças terão de se adaptar na transição para o 5.º ano, mas mais ainda os próprios professores, que vão receber alunos com um nível de conhecimento abaixo do que é normal. Logo nos primeiros dias, deveriam fazer testes de despiste para saber o nível dos alunos".
A observação é do professor da Universidade do Minho João Lopes, que alerta para as perdas que as crianças estão a sofrer com o ensino à distância. Os pais, preocupados com a adaptação dos filhos ao novo ciclo, concordam com o especialista em psicologia escolar.
De acordo com João Lopes, atualmente não é possível perceber o nível de aprendizagem das crianças que estão prestes a terminar o quarto ano. E nem mesmo os professores titulares estarão em condições de avaliar os prejuízos com a nova modalidade de ensino, que se dividiu entre a telescola e aulas online que, na maioria dos casos, não chegaram a mais de duas horas por dia.
Pais fazem os trabalhos
"Há situações em que são os pais que tentam fazer os trabalhos pelos alunos, há pais a sussurrar aos filhos. Conhecer em que ponto estão os alunos vai ser importante para os professores [do quinto ano] saberem por onde começar", entende.
Carina Silva, psicóloga e coordenadora de um projeto da Cruz Vermelha de Braga que trabalha a inclusão de crianças e jovens do bairro social de Santa Tecla, concorda com a necessidade de adaptação de conteúdos no arranque do 2.º Ciclo. Mas vai mais longe: "O ano letivo deveria ter encerrado quando fecharam as escolas. O melhor seria ninguém transitar e repetir o ano".
O ensino à distância, diz a psicóloga, "acentuou as diferenças sociais". Famílias sem telemóvel, computador ou internet viram os filhos ficarem privados do contacto online com os professores.
"Quem fez o último período só com fichas enviadas pelos professores não está minimamente preparado para transitar", defende Carina Silva, adiantando que, só do bairro de Santa Tecla, acompanharam 109 crianças, 70% das quais nunca tiveram qualquer contacto com o professor, depois do fecho das escolas. "Teremos cerca de 10 crianças do quarto ano que só fizeram fichas de exercícios", contabiliza.
E como será a despedida?
Mesmo os alunos que tiveram contacto esporádico ou quase diário com os professores admitem que não apreenderam com a mesma eficácia. Há queixas à telescola e falhas nas sessões online que prejudicaram a aprendizagem (ler ao lado).
Os próprios professores admitem que não houve condições para "sistematizar" matéria. "Demos os conteúdos essenciais para prosseguirem", afirma Fátima Ribas, professora do Agrupamento Alberto Sampaio, em Braga, adiantando que irá fazer um relatório com o nível dos alunos e alertas para quem necessitar de cuidados especiais.
Ana Bizarro, do Agrupamento Carlos Amarante, na mesma cidade, contactou os alunos todos os dias, durante duas horas. Mas mais do que os conteúdos, sublinha que as crianças precisam de voltar a socializar. Tal como Fátima Ribas, se houver condições a festa de finalistas será adiada para setembro, numa espécie de piquenique. Recomendam que todos os alunos tenham a possibilidade de visitar a escola básica para onde vão transitar. "Têm de perceber que vão deixar de ser crianças para se tornarem jovens adolescentes", conclui Ana Bizarro.