Os níveis de ansiedade e de depressão dos pais pioraram na segunda fase da covid- 19, com repercussões no estado emocional dos filhos. Em geral, as crianças conseguiram lidar com a pandemia e as suas consequências, mas 8% têm um nível de ansiedade acima do considerado funcional. Medo, tristeza, dificuldades em dormir ou em concentrar afetam entre 4% a 15%.
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São algumas das conclusões da segunda fase do estudo "O que pensam e o que sentem as famílias em isolamento social", lançado pelo Instituto de Apoio à Criança (IAC) e divulgado esta terça-feira.
A investigação decorreu em duas fases (2021 e 2022) para avaliar o que as famílias pensavam e sentiam nos dois momentos da crise pandémica.
"Observámos que os pais apresentaram, em média e percentualmente, níveis de stress inferiores, mas níveis de ansiedade e de depressão superiores aos valores encontrados no início da pandemia (1.ª fase )", conclui o relatório de investigação, assinado por Fernanda Salvaterra e Mara Chora. De acordo com o documento, os valores de ansiedade, depressão e stress acima da norma situaram-se entre os 22% e os 23% para os adultos.
Relativamente à ansiedade das crianças, os resultados apontam no mesmo sentido, sendo que "algumas crianças (7,9%) apresentam um nível de ansiedade acima do considerado funcional. O mesmo se verifica em outras variáveis, como estar triste, com medo, ter dificuldades em dormir ou em concentrar".
As autoras avançam algumas hipóteses para estes resultados. Uma delas é que "a situação de stress a que as famílias foram sujeitas durante o ano e meio terá consequências a longo prazo a nível da saúde mental, nomeadamente pelo aumento dos estados depressivos e ansiosos".
Outra possibilidade é os resultados estarem relacionados com o momento em que a segunda fase do estudo foi lançada, dezembro de 2021, período no qual as medidas de proteção contra a covid- 19 foram agravadas devido ao aumento de casos, culminando na recomendação e posterior obrigação de teletrabalho, alteração do calendário escolar, encerramento de creches e ATL, discotecas e bares e proibição de ajuntamentos na rua.
Reforçar intervenções para mitigar efeitos da pandemia
"Podemos afirmar que, de modo geral, as crianças estão a lidar com a pandemia e com as suas consequências de forma adaptativa. Contudo, não podemos deixar de ignorar os casos em que isto não acontece, sendo importante reforçar a necessidade de se pensar em intervenções que ajudem a mitigar os efeitos da pandemia neste grupo de crianças", alertam as investigadoras.
Da mesma forma, destacam "a necessidade de os pais estarem mais alerta ou não desvalorizarem o que as crianças sentem e manifestam", fornecendo-lhes uma resposta adequada em cada momento.
O estudo permitiu ainda observar "uma relação entre a ansiedade, a depressão e o stress dos pais e a ansiedade das crianças, com níveis superiores para as famílias que não tinham retomado as suas rotinas como eram antes da pandemia ou tinham-nas retomado apenas parcialmente".
"Os resultados indicam que pais mais ansiosos, deprimidos ou stressados têm, também, filhos mais ansiosos", refere a investigação.
De resto, salientam as autoras, "os elevados níveis de ansiedade, de depressão e de stress dos pais constituem um fator de risco para a ansiedade dos filhos, estando esta relação bem sustentada na literatura".
Mais tempo em família destacado como aspeto positivo
Note-se que cerca de metade das crianças e a maioria dos pais referiram que a pandemia trouxe aspetos positivos para a dinâmica familiar, nomeadamente, passarem mais tempo em conjunto.
"Regressa à discussão a necessidade de se repensarem as formas de conciliar a vida profissional /escolar e a vida familiar, para que as famílias possam desfrutar de tempo de qualidade em conjunto", destaca o estudo.
Por outro lado, 40% das crianças e 52,8% dos pais mencionaram que a pandemia trouxe alguns aspetos negativos, como a falta de convívio familiar e social.
Participaram no estudo 269 famílias portuguesas com filhos entre os 4 e os 20 anos.