Casas que são propriedade das autarquias duplicaram, atenuando a redução do parque público, que só pesa 2%.
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Num parque público residual que representa apenas 2% do alojamento no país, a redução geral das últimas décadas é atenuada pelo aumento das habitações que são propriedade das autarquias locais. Em 30 anos, mais do que duplicaram, enquanto os alojamentos familiares que são do Estado têm caído sucessivamente. Quando se agrava a falta de casas e disparam os preços, o Governo leva hoje ao Parlamento o seu programa nacional de habitação. Porém, proprietários, inquilinos e construtores garantem que não chega para resolver os problemas, reclamando o envolvimento dos privados.
Com base nos últimos Censos, os alojamentos que são propriedade do Estado, de empresas públicas, institutos públicos autónomos e instituições sem fins lucrativos rondam os 32 mil. São menos 65% (quase dois terços) do que em 1991, quando eram quase 91 mil.
Numa tendência inversa, estão a aumentar os alojamentos detidos pelas autarquias locais. Passaram de 43 349 nos Censos de 1991 para 90 933 nos de 2021, cujos resultados definitivos foram divulgados em novembro passado.
Governo promete 5%
Se juntarmos as categorias onde estão o Estado e o poder local, representam somente 3% dos alojamentos familiares clássicos de residência habitual. O Governo tem apontado uma percentagem mais baixa, de 2%, por não incluir as instituições sem fins lucrativos na mesma categoria do Estado, ao contrário do INE.
O programa nacional, com um horizonte até 2026, visa aumentar o parque público para 5% nos próximos anos, segundo prometeu a nova ministra, Marina Gonçalves, ainda enquanto secretária de Estado. O investimento previsto inicialmente era de 2 377 milhões. E mais de metade para o programa "1.º Direito", que garante habitação condigna em caso de carência financeira. Segundo disse ao JN o Ministério da Habitação, há 223 municípios com acordos assinados e mais de 65 mil famílias identificadas.
No "Porta 65", que ajuda os jovens a pagar a renda, diz que, "em 2022, foi executada a maior verba de sempre: 26,5 milhões de euros". O programa de apoio ao arrendamento continua muito aquém das expectativas, com cerca de mil contratos ativos em dezembro.
35% a precisar de obras
Quanto ao total dos alojamentos existentes em Portugal, seja propriedade pública ou privada, cresceram dos três milhões registados há 30 anos para 4,1 milhões. As casas ainda são poucas, denuncia o setor, alertando para a sua degradação.
Em 10 anos, o número de edifícios apenas subiu 0,8%. Segundo os Censos de 2021, em 3 573 416 edifícios, 35,7% precisam de reparação (1 278 826). Já o total de alojamentos, familiares e coletivos, aproxima-se dos seis milhões.
Ao JN, o presidente da Associação dos Inquilinos Lisbonenses, Romão Lavadinho, disse que o programa "não resolve os problemas no imediato". Perante mais de 700 mil fogos devolutos, propõe que os proprietários fiquem isentos de pagar os 28% sobre os rendimentos se colocarem as casas no mercado de arrendamento a "preços razoáveis". As rendas devem ficar 20% abaixo da mediana do mercado. Sugere ainda apoio para reabilitação a fundo perdido.
Para António Frias Marques, presidente da Associação Nacional de Proprietários, o Governo deve "chamar os privados, que estão dispostos a colaborar nesta missão nacional". Questionado sobre o programa, avisa que a falta de envolvimento dos proprietários privados "é um erro crasso". E "os grandes beneficiários" do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) são os municípios. Ou seja, "mais Estado". Notando que Lisboa tem quase 48 mil casas devolutas, crê que "a primeira coisa a fazer era ajudar os privados a recuperar o património", por exemplo com empréstimos a longo prazo e juros "razoáveis".
Manuel Reis Campos, presidente da Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas, defende a remoção dos entraves ao licenciamento e a redução do peso dos impostos e taxas no preço das casas.