Procedimento para contratar 178 profissionais já só tem 58 candidatos. Com menos recursos e com o regresso do limite das horas extra, vai haver mais ambulâncias paradas, diz sindicato.
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Há cada vez menos pessoas interessadas em trabalhar nas ambulâncias ou nos centros de orientação de doentes urgentes do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM). O concurso para contratar 178 técnicos de emergência pré-hospitalar (TEPH) vai ficar praticamente deserto. Ainda está a decorrer e só tem 58 candidatos. Os baixos salários são uma das principais razões para a desmotivação.
Era uma oportunidade para dar um novo fôlego ao socorro pré-hospitalar, cujas carências de recursos humanos se agravam de ano para ano e têm efeitos na operacionalidade das ambulâncias. Mas a falta de atratividade da carreira - exigente e com remuneração próxima do salário mínimo - e a alteração de regras no processo de admissão dos candidatos deitaram por terra as esperanças. Os técnicos fazem hoje greve e manifestam-se em Lisboa por melhores condições de trabalho e pela revisão da carreira, naquela que é a primeira de várias paralisações no setor da saúde (ler ao lado).
Iniciado em abril, o concurso para contratar 178 TEPH para o INEM recebeu 950 candidaturas e foram admitidos 428 candidatos, o número mais baixo de sempre. Segundo informação avançada ao JN pelo INEM, em 2017, o procedimento para contratar 100 técnicos recebeu 1633 candidaturas (853 candidatos entraram no concurso) e, em 2019, houve 986 candidaturas para 125 vagas (676 admitidos). Em ambos foi possível preencher todas as vagas e manter uma bolsa de recrutamento para ir compensando as saídas do INEM. Desta vez, não acontecerá.
Seleção mais exigente
O concurso é composto por sete fases até à admissão - inclui prova de conhecimento, prova de condução, avaliação física e psicológica, entre outras - e está a chegar ao fim. Segundo a última lista de resultados publicada pelo INEM, apenas 62 candidatos passaram as provas físicas (5.ª fase) e seguiram em frente. Está a correr atualmente a prova de condução e o JN sabe que, pelo menos, mais quatro candidatos foram eliminados, o que significa que já só há 58 candidatos em condições de serem contratados. Faltam ainda os exames de saúde. Segundo o INEM, deverá terminar em novembro.
Além da diminuição dos interessados, uma alteração nas regras de admissão terá contribuído para a razia neste concurso. Ao que o JN apurou, a avaliação curricular passou a ter em conta os últimos cinco anos de experiência, em vez dos últimos dez, como aconteceu nos últimos concursos. "Há pessoas que nos concursos anteriores tiraram 16 e 18 na avaliação curricular e agora chumbaram", referiu o presidente do Sindicato dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (STEPH). Rui Lázaro questiona, também, a exigência das provas físicas e diz que "a ideia que dá é que o concurso foi desenhado para excluir muitos profissionais". Questionado pelo JN, o INEM não adiantou as razões para a baixa captação de recursos.
Com saídas permanentes e pouca capacidade de atração de novos técnicos, vão agravar-se as dificuldades para manter e alargar os meios do INEM, como as ambulâncias de emergência médica e as motos.
Desde o ano passado que as escalas destes meios têm sido asseguradas à custa de horas extra, cujos limites foram levantados devido à pandemia. Porém, a proposta do Orçamento do Estado para 2022 quer repor o teto que vigorava antes e que impedia os técnicos de ultrapassar 60% da remuneração-base em horas extra. "Neste momento, só não há mais ambulâncias fechadas porque, até ao final do ano, não há limite de horas extra", assegurou Rui Lázaro.
Protestos
Começa hoje calendário de greves no setor da saúde
Os técnicos do INEM cumprem, esta sexta-feira, uma greve de 24 horas, com uma manifestação em Lisboa. É a primeira de várias greves agendadas até novembro na Saúde, que incluem os médicos, enfermeiros e farmacêuticos.
O protesto de hoje foca as más condições de trabalho no INEM, a necessidade de revisão da carreira dos técnicos e a falta de formação (ler ao lado), entre outros problemas. É a terceira greve do ano convocada pelo Sindicato dos Técnicos Pré-Hospitalares.
Em junho, foi decretada uma greve de zelo ao trabalho não urgente e administrativo, ainda em vigor, e, em julho, houve uma greve parcial de duas horas. Os técnicos alegam que, três meses após reunirem com o Governo, não receberam uma única solução do conselho diretivo. "Não nos resta alternativa se não endurecer a luta".
À lupa
750 euros
é a remuneração base de um técnico de emergência pré-hospitalar, um valor cada vez mais próximo do salário mínimo (poderá chegar aos 705 euros em 2022).
OE 2022 não prevê mais contratações
A proposta do Orçamento do Estado para 2022, ainda em discussão para ser votada na generalidade, não prevê a contratação de novos TEPH para o INEM. Nos últimos anos, foi autorizada a abertura de concursos em 2017, em 2019 e em 2021, com 100, 125 e 178 vagas, respetivamente.
Dificuldade em manter os novos
Além da incapacidade para atrair novos recursos humanos, o INEM tem tido dificuldade para manter os técnicos que contrata. Em 2019 e até outubro de 2020, um total de 35 técnicos denunciaram os contratos logo no período experimental, como já escreveu o JN.