Era um domingo como tantos outros. Marta Magalhães seguia no Intercidades procedente da Guarda com destino a Lisboa. A viagem, que duraria quatro horas, foi abruptamente interrompida em Santa Comba Dão e só terminou 12 horas depois. Pelo meio, juntamente com 200 pessoas, Marta foi retirada da estação e passou a noite numa "vila fantasma".
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Quando os passageiros do Intercidades 518 se aproximaram da estação de Mangualde, em Viseu, repararam na mancha vermelha que pintava o verde da floresta. Marta Magalhães, de 24 anos, seguia na composição que parou em Santa Comba Dão, devido ao corte da linha da Beira Alta.
"O comboio parou, mas mantive a calma, porque o fogo, apesar de visível, estava longe e não apresentava grande perigo", contou ao JN.
Com o passar do tempo, os passageiros começaram a ficar impacientes e a ansiedade crescia. "Poucos tinham rede no telemóvel, o que deixava as pessoas mais ansiosas", recorda. Apesar da constante informação prestada pelos funcionários da CP, as falhas de energia na composição tornaram o cenário mais dramático. "Estava sentada a ver um filme no computador e reparei que uma senhora entrou aflita no comboio e comecei a ver as pessoas a taparem a cara com as camisolas", explica.
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Tal como os outros passageiros, Marta foi encaminhada para o interior da estação, que rapidamente se tornou pequena para tanta gente. "Reparei na cinza que estava no ar e não havia bombeiros por perto. Só a GNR e os funcionários da CP, que foram incansáveis durante o tempo em que estivemos retidos na estação", diz.
Para além dos passageiros, no local estavam também moradores, que viram as casas ameaçadas pelo fogo. Pouco tempo depois de toda a gente ser retirada do comboio, foram informados de que um autocarro estava a caminho para os levar para o centro da vila. "Começaram por chamar as crianças e os idosos e eu só fui na segunda viagem", disse.
Uma viagem de medo
O percurso desde a estação até à Casa da Cultura durou pouco mais de 20 minutos, mas foi um "verdadeiro horror". "Pensei que poderíamos ser as vítimas de outro 'Pedrógão'", confessou. De um lado havia labaredas bem altas e do outro cinzas incandescentes. "O motorista benzeu-se, acelerou e passou pelo meio das labaredas com o autocarro", adianta Marta.
Do percurso, a jovem recorda o suspiro de quem seguia no interior no veículo: "Foi em crescendo até ao momento em que passamos o fogo".
Já na Casa da Cultura, no centro do que parecia ser uma "vila fantasma", Marta viu "idosos e crianças só de pijama", pessoas "com os animais de estimação" e algumas "de cadeira de rodas". "São imagens que não esquecemos e que ainda me emocionam", conta.
As pessoas retiradas da estação pernoitaram no local, onde tiveram direito a refeições e acompanhamento médico. No dia seguinte, regressaram em segurança à estação ferroviária e retomaram a viagem bruscamente interrompida no dia anterior.