Carneiro apela à união interna, sem “golpes recíprocos” ou ficar a olhar para dentro
O candidato a secretário-geral do PS José Luís Carneiro apelou, este sábado, à união interna no partido, sem “golpes recíprocos” ou ficar a olhar para dentro, assegurando que não fará “ataques pessoais e superficiais na praça pública”.
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“Apelo aos socialistas para que se unam na sua diversidade, para iniciar o caminho de volta que a defesa dos nossos ideais nos pede”, afirmou José Luís Carneiro no discurso de apresentação da sua candidatura à liderança do PS, no jardim da sede nacional do partido, no Largo do Rato, em Lisboa.
O ex-ministro do PS - que até agora é o único na corrida à sucessão de Pedro Nuno Santos - avisou que “aqueles que serão deixados para trás por políticas neoliberais”, “discriminados por políticas conservadoras”, ou que não verão melhorias na sua qualidade de vida, nos salários ou serviços públicos, não perdoarão o partido se ficar a “olhar para o umbigo”.
“Não nos perdoarão se ficarmos agora a olhar para nós próprios ou nos entretivermos a golpear reciprocamente a nossa credibilidade e as nossas qualidades, em vez de nos organizarmos para os defendermos a eles, que são a razão de ser e de existirmos como partido”, afirmou.
José Luís Carneiro reconheceu que o PS está a “viver um momento difícil” e teve um “resultado que não desejava” nas legislativas de maio, tendo perdido votos “para a direita em todos os grupos sociais”. “O que procurarei fazer e vos peço que façam é uma análise profunda daquilo em que falhámos, de quando falhámos, do que devíamos ter feito diferente”, disse.
No entanto, logo de seguida, pediu que se “desengane quem confunde essa reflexão com tentações de ajustes de contas internos e com cedência a tentativas de aproveitamentos por parte” dos principais opositores do PS, uma passagem do seu discurso que mereceu vários aplausos da plateia. “Análise e debate? Sim, ao máximo. Ataques pessoais e superficiais na praça pública? Não, nunca. Comigo, não contam com isso”, assegurou.
Procurando demarcar-se de outros líderes políticos, José Luís Carneiro disse que, “por vezes, os dirigentes dos grandes partidos gostam excessivamente de se ouvir a si mesmo e a uns aos outros”, distanciando-se “do que pensa o povo”. “A democracia necessita que a maior preocupação de um político seja outra: a de saber ouvir”, disse, acrescentando que o PS tem o “dever de saber ouvir e dar voz às pessoas e às suas expressões cívicas e instituições”.
“O PS que defendo e quero reerguer convosco assumirá esse dever, terá essa capacidade e repensar-se-á da base às cúpulas. Acredito que esse é o caminho que temos de percorrer em conjunto para voltarmos a fazer do PS o maior partido português”, afirmou.
José Luís Carneiro defendeu que o PS “é o grande partido da esquerda democrática em Portugal” e manifestou-se convicto de que os valores que defende “continuam a ter vocação maioritária no país”. “E cabe-nos a nós, socialistas que neste momento conduzem o partido, estar à altura da responsabilidade de os defender e promover”, sustentou.
No início do seu discurso, José Luís Carneiro deixou uma “saudação fraternal” a Pedro Nuno Santos, afirmando que procurou sempre “colaborar com lealdade” com o ex-secretário-geral do PS.
Oposição enérgica a “retrocessos” mas abertura a “consensos democráticos”
Carneiro prometeu que, caso seja eleito, o partido será “determinado e enérgico na oposição” perante o que considerar retrocessos, mas também não terá receio em “promover consensos democráticos”.
“Temos de ser determinados e enérgicos na oposição àquilo de que discordamos e que vemos como retrocessos, como temos de ser responsáveis, ponderados e ativos na procura de caminhos que aprofundam os consensos democráticos na nossa sociedade”, afirmou José Luís Carneiro na apresentação da sua candidatura à liderança do PS, no Largo do Rato, em Lisboa.
Carneiro defendeu que o partido “não é um partido da crítica pela crítica, nem é um partido que possa transigir com caminhos de retrocesso económico e social”.
“Comigo na liderança, o PS não terá receio de promover consensos democráticos, nem será tíbio na oposição ao regresso das políticas que ponham em causa os valores e os princípios fundamentais do socialismo democrático”, reforçou.
Afirmando que o PS é um “pilar do regime democrático” e o “líder do espaço progressista”, Carneiro prometeu depois defender a Constituição da República, numa altura em que tanto a IL como o Chega anunciaram que pretendem rever a lei fundamental.
“Jurámos e defendemos a Constituição da República, acreditamos no aprofundamento da democracia e queremos um Portugal mais europeu, mais próspero e mais coeso. Tudo o que tivermos de fazer para o garantir, faremos sem estados de alma e com a convicção de estarmos a cumprir os nossos deveres perante as cidadãs e os cidadãos”, avisou.
Depois, sem nunca referir explicitamente qualquer partido, José Luís Carneiro disse ser um homem “que sabe a diferença entre o fascismo e a democracia” e que não tem “grandes dúvidas sobre a grande superioridade do regime democrático dos últimos cinquenta anos”, em contraponto com os “horrores da ditadura” do Estado Novo.
“Todos os que tentarem desvalorizar a grande obra da democracia serão sempre os nossos primeiros e os nossos maiores adversários”, avisou.
Sobre os consensos democráticos para os quais se manifestou disponível, Carneiro elencou as áreas da política externa e europeia, a Defesa, a segurança, a Justiça e a organização e reforma do Estado.
Apesar desta abertura a diálogos, o candidato à liderança do PS deixou críticas ao executivo da AD (PSD/CDS-PP), avisando em particular que “é bom que o Governo tenha em atenção os alertas sobre a situação económica e financeira internacional”. “Sejamos claros: derramar o saldo orçamental, legado pelos governos do PS, sobre os problemas que são estruturais pode comprar momentaneamente a paz social, mas não é a solução de fundo de que o país precisa”, sustentou.
Manifestando-se orgulho no trabalho que foi feito pelos governos do PS nos quais participou – liderados por António Costa –, José Luís Carneiro defendeu que os “progressistas não se podem deixar prender na crítica fácil, têm de se empenhar na resolução dos problemas que as pessoas enfrentam, seja qual for o domínio em que atuam”. “Para o fazerem, têm de ter programas bem fundamentados, ideias claras e caminhos bem estudados”, sustentou, antes de apresentar o que disse ser um “pacto de confiança” para a próxima década, com “metas claras” para o futuro do país.
Nesse pacto, anunciou, irá constar uma política de aumento dos rendimentos e de redução da carga fiscal para que o salário médio em Portugal alcance em 10 anos o salário médio europeu.
O pacto teria ainda como objetivo garantir uma habitação condigna no prazo de 10 anos a todas as famílias e assegurar que Portugal é “capaz de se autoabastecer de eletricidade com recurso a fontes renováveis” até 2035.
Prioridade são as autárquicas
José Luís Carneiro avisou que é o PS que define a hierarquia das suas prioridades e que a primeira são as autárquicas, referindo que, com as presidenciais em 2026, “cada coisa a seu tempo”.
“Sei que há quem esteja centrado nas eleições presidenciais. […] Compreendo e saúdo os que têm coragem e disponibilidade para servir o país. Lá chegaremos, mas, quero que fique muito claro: é o PS que define a sua agenda e é o PS que define a hierarquia das suas prioridades”, avisou José Luís Carneiro na reta final do discurso de quase 40 minutos de apresentação da sua candidatura a secretário-geral do PS, que decorre esta tarde nos jardins do Largo do Rato, em Lisboa.
Sem nunca citar o nome do ex-líder do PS António José Seguro, que esta semana apresentou que será candidato a Belém, José Luís Carneiro apontou que “as autárquicas serão já em fins de setembro, princípio de outubro”, e “as presidenciais serão só em 2026”. “Cada coisa a seu tempo. Sei bem qual é o meu dever no que respeita à defesa da autonomia e unidade estratégica do PS”, enfatizou.
Apesar de identificar vários desafios, o ex-ministro e deputado deixou claro que a “prioridade imediata são as eleições autárquicas”. “As eleições autárquicas são um momento decisivo na integração de jovens e de mulheres na vida política. Quero que seja uma orientação para os nossos dirigentes: é necessário ter mais mulheres e mais jovens nas nossas listas”, apelou.
Carneiro antecipou que nas autárquicas serão defendidas “as marcas das autarquias socialistas” e que “os autarcas do PS e o trabalho que desenvolvem ao serviço das populações são uma das grandes riquezas" do partido que pretende liderar. “Estaremos em todo o país em listas próprias, mas procuraremos convergências progressistas onde elas se revelarem necessárias, sólidas e ganhadoras”, antecipou.
A descentralização, as políticas sociais, o desenvolvimento regional e a valorização das economias locais integram o “património no poder local democrático”. “Todos temos o dever de estarmos ao lado dos milhares de autarcas e candidatos a autarcas que, hoje e por todo o país, estão em diálogo com as comunidades locais. É lá que mais se rejuvenesce a esperança quotidiana na melhoria das condições de vida”, enfatizou.
O discurso de apresentação da candidatura, sob o lema “Ouvir e dar voz às pessoas”, foi escutado por várias caras socialistas conhecidas, estando na primeira fila Manuel Alegre ou Maria de Belém Roseira, assim como Fernanda Tadeu, a mulher do ex-primeiro-ministro e presidente do Conselho Europeu António Costa.
Vários atuais e antigos deputados, eurodeputados ou ex-ministros marcaram presença, entre os quais Edite Estrela, Sérgio Sousa Pinto, Ana Catarina Mendes, Capoulas Santos, Pedro Silva Pereira, Ana Catarina Mendes, António Mendonça Mendes, Paulo Cafôfo, Ana Mendes Godinho ou Inês de Medeiros.
No final do discurso, após o qual ainda falaram mais apoiantes de Carneiro, o socialista - que se volta a candidatar à liderança do PS um ano e meio depois – assegurou que se apresenta “com o espírito de servir o PS e de servir Portugal”.
“Temos de ir de encontro às pessoas, de saber falar com elas. Ouvi-las onde elas estiverem. Fazer-lhes sentir que são escutadas e que a sua opinião conta, ouvir-nos mais uns aos outros”, defendeu.
Com o objetivo de “restabelecer uma relação de confiança” entre o PS e os portugueses, José Luís Carneiro quer “voltar a fazer do PS o partido central” do sistema político: “o partido do socialismo democrático, um partido progressista, aberto, tolerante e agregador”.
“Como candidato a secretário-geral do PS irei ao encontro de todos. Procurarei a unidade e conto com todos. Sou corajoso, ponderado e firme nas minhas decisões. […] Caminhemos juntos ao encontro dos portugueses e certamente voltaremos a ser de novo o grande partido de Portugal”, apelou.