Grupo de mães de Braga criou movimento para exigir soluções para interrupções letivas de crianças e jovens com deficiência. Falta de respostas tem obrigado alguns pais a usarem as férias e a baixas para assistência à família, mas não é suficiente.
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Quando, em 2019, Rosa Oliveira inscreveu o filho, com autismo severo, na EB1 de Gualtar, em Braga, percebeu logo "que faltavam recursos na escola para o centro de apoio à aprendizagem". Depois, a bracarense notou que também não havia um centro de Atividades de Tempos Livres (ATL) preparado para crianças com deficiência. Juntou-se a outra mãe, Helena Pereira, para reivindicar condições e conseguiram a integração de uma assistente e professora de educação especial. Mas o problema com as pausas letivas continuou até hoje, o que originou um movimento que alerta para a falta de inclusão das cidades nos seus programas de verão.
"O Município empurrava-nos para as juntas, estas empurravam-nos para a Câmara. Entretanto, entrou a pandemia e não houve ATL para ninguém. No início deste ano, decidimos juntar-nos", conta Rosa Oliveira, que, além de Helena Pereira, fundou o Movimento Pais em Luta com Marília Costa, Fátima Couto, Sónia Martins e Susana Ferreira. Mas, entretanto, são já 52 as famílias de Braga que estão a lutar por atividades inclusivas nas pausas letivas.
O assunto ganhou dimensão, recentemente, quando o grupo aceitou a ajuda da CDU de Braga e os problemas foram levados a reunião do Executivo. Antes, os contactos com a divisão de Educação não tinham surtido efeito. Marília Costa, enfermeira, confidencia que, entre outros problemas, a falta de respostas tem obrigado a usar as férias e a baixas para assistência à família. "Dá um mês para mim e outro para o meu marido, mas o meu filho tem férias quatro meses por ano", lamenta.
"Somos arrastadas para ficar em casa. Não trabalharmos também significa ter menos condições financeiras e não suportar custos com terapias", acrescenta Rosa Oliveira, mostrando-se pouco convencida com as soluções que o Município está a desenhar, à última hora, junto de algumas instituições sociais.
Respostas segregadas
Para contornar a falta de respostas, Miguel Azevedo, do Movimento Cidadão Diferente, uma Organização Não Governamental (ler entrevista ao lado), admite que dispôs "muitas vezes" do seu dinheiro para organizar colónias de férias para crianças. "Mas não há capital que aguente", ressalva o responsável, garantindo que, no país, "são uma minoria as cidades que têm atividades inclusivas".
Na perspetiva do sociólogo e investigador do Instituto Universitário de Lisboa, José Miguel Nogueira, "as respostas até existem na comunidade, mas esta não está preparada para as crianças" com algum tipo de deficiência. E garante que, mesmo as entidades que trabalham junto desta população têm práticas ultrapassadas. "O que diz a convenção sobre os direitos da pessoa com deficiência é que estas crianças pertencem à comunidade e não devem ter respostas segregadas. Não é o que faz a maioria das associações", atesta.
Há, porém, exceções. Guimarães, desde 2018, tem um programa gratuito, desenhado "pelas equipas de ensino especial", refere a vereadora Adelina Pinto. No Porto, a Autarquia mantém um protocolo com a Associação de Desporto Adaptado ADADA e, em Gaia, há um programa que conta com idas à praia, caminhadas, visitas à quinta pedagógica, ioga, música e oficinas variadas. Gondomar garante que faz a adaptação das atividades do programa de verão a crianças com deficiência e, mais abaixo, em Sintra, as "Férias Desportivas" também não discriminam os participantes. Barcelos, Ponte de Lima ou Almada são outros bons exemplos.
Pelo país
Sintra
A Câmara de Sintra promove, em julho, as "Férias Desportivas". A participação é gratuita e aceita crianças e jovens com necessidades educativas especiais. Dança, equitação, judo e ténis de mesa são algumas das modalidades praticadas.
Porto
O Município do Porto vai manter o protocolo com a Associação de Desporto Adaptado do Porto, que permite a inscrição de cidadãos com deficiência no programa de férias de verão. Atividades decorrem entre julho e agosto.
Gaia
Chama-se "GaiaAprende+(i)" o programa de atividades de verão de Vila Nova de Gaia. Estão inscritas 44 crianças que frequentam todos os níveis de ensino da rede pública. As atividades proporcionam, na generalidade, as mesmas experiências que são vividas por menores sem necessidades especiais.
Guimarães
Passeios, ioga e terapias são algumas das atividades que Guimarães proporciona a crianças e jovens com deficiência. O Município reforça assistentes operacionais e garante transporte dos participantes para as escolas onde decorrem as sessões.
Gondomar
Município tem programa de ocupação de tempos livres em julho, que não exclui crianças com necessidades educativas especiais. Inclui atividades nas escolas, biblioteca, casa da juventude e centro de educação ambiental.
Outras lutas
Apoio contínuo
O Movimento Cidadão Diferente, à semelhança das mães de Braga, admite que há escolas a recusar apoio a alunos com deficiência, após as aulas. Exigem que o tempo letivo e não letivo, durante o ano, seja coberto pelas escolas.
ATL todo o ano
Além da integração de crianças e jovens com deficiência nas atividades de tempos livres, os pais exigem que os ATL sejam inclusivos durante todo o ano, para apoiar períodos pós-aulas.