Garcia Pereira, um dos advogados dos 13 militares que não embarcaram no NRP Mondego, no passado sábado, admite agir judicialmente contra o almirante Gouveia e Melo. De acordo com a defesa dos marinheiros, o chefe do Estado-Maior da Armada fez "declarações públicas vexatórias e humilhantes", na quinta-feira, quando se dirigiu à guarnição no navio, no Funchal.
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Agir judicialmente contra o Gouveia e Melo é uma das "hipóteses que está em cima da mesa", revela Garcia Pereira ao JN. Os 13 militares que não embarcaram na missão de acompanhamento de um navio russo, ao largo do Porto Santo, por alegada falta de condições de segurança para navegar, chegaram esta sexta-feira a Lisboa. Na segunda-feira, o grupo será ouvido pela Polícia Judiciária Militar, onde decorre um inquérito de âmbito criminal.
"Competia antes de mais, por se tratar de infrações de natureza pública, às entidades públicas intervir" no processo, aponta o advogado, referindo-se ao Ministério Público e a Marcelo Rebelo de Sousa, enquanto Comandante Supremo das Forças Armadas. "O chefe do Estado-Maior da Armada violou a lei, a Constituição e o próprio Regulamento de Disciplina Militar", afirma Garcia Pereira. "O que vimos foi uma aplicação de uma reprimenda pública vexatória e humilhante ao discursar com o dedo apontado".
Na quarta-feira, Marcelo Rebelo de Sousa não quis comentar diretamente a atitude dos 13 militares e a possível fragilidade do almirante após se saber da polémica. "Não vamos agora estar a falar daquilo que são as conclusões a que chegará a inspeção ou fiscalização em curso", disse o presidente da República aos jornalistas.
O almirante Gouveia e Melo disse, na quinta-feira, num discurso à guarnição do NRP Mondego, onde se incluíam os quatro sargentos e nove praças que não embarcaram no sábado, que o "ato de insubordinação" ia ficar "registado na História da Marinha". "Que interesses os senhores defenderam? Os da Marinha não foram certamente, os vossos muito menos. Só unidos venceremos dificuldades e vocês desuniram-nos", afirmou o chefe do Estado-Maior da Armada. Mais tarde, em declarações aos jornalistas, o almirante referiu que não podia "esconder debaixo do tapete um ato destes".
Também na quinta-feira, horas mais tarde após o discurso de Gouveia e Melo à guarnição, Paulo Graça, outro dos advogados dos 13 militares, defendeu que a "imparcialidade do processo disciplinar estava gravemente comprometida", uma vez que o almirante proferiu a condenação, segundo o jurista, ainda antes de permitir a defesa dos marinheiros.
Militares com "mais de 20 anos de Marinha"
"Estamos a falar de homens que têm a sua dignidade, alguns deles com mais de 20 anos de Marinha e medalhados", disse Garcia Pereira, esta sexta-feira, ao JN. O advogado defende que foi feita uma "repreensão pública, sem que houvesse lugar para o contraditório". Os 13 militares detalharam, num documento escrito, que um motor e um gerador de energia elétrica não estavam operacionais. A Marinha admitiu existirem limitações na embarcação, mas defendeu que a maior parte dos equipamentos é "redundante".
O grupo de marinheiros argumentou também que o próprio comandante do NRP Mondego não estava confortável com os constrangimentos técnicos do navio, mas o responsável desmentiu a versão dos militares. "Tive 50% da guarnição do meu lado e outros 50% que não quiseram cumprir as minhas ordens", afirmou Vasco Lopes Pires à CNN Portugal.
Garcia Pereira acusa ainda a Marinha de ter "limpado o navio" para apagar provas. "Se um navio tem problemas de fugas, de líquidos hidráulicos e de combustível, naturalmente tem sujidade. Daquilo que foi mostrado pelas televisões, houve a intenção de mostrar o navio como se estivesse novo em folha". O advogado refere que houve uma "tentativa de manipulação da opinião pública" e que, em breve, os 13 militares poderão apresentar a sua versão dos factos.