Ainda é a unidade da Região Norte com mais demora para cirurgia e primeira consulta. Profissionais dividem-se sobre gestão pública.
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As listas de espera para cirurgia e primeira consulta mantêm-se "enormes", há problemas de pessoal na Urgência, chefias insatisfeitas e uma taxa de inoperacionalidade da viatura médica fora do normal. Faz hoje dois anos que o Hospital de Braga deixou de ter gestão privada. Piorou?
A resposta não é consensual. Há quem tenha saudades do grupo Mello e quem respire de alívio com a gestão pública. Após a reversão de duas parcerias público-privadas (PPP) para o Estado, e numa altura em que decorrem concursos para Loures e Cascais [ler ao lado], o JN foi a Braga saber o que mudou.
Pandemia à parte, o atual presidente do Hospital de Braga, João Porfírio Oliveira, reconhece que a transição da gestão privada para a gestão pública trouxe "dores de crescimento". Ainda assim, garante, no geral, profissionais e utentes saíram a ganhar.
Os médicos estarão mais insatisfeitos do que os enfermeiros. Especialistas ouvidos pelo JN, que pediram para manter o anonimato, relataram problemas graves na Urgência, com carências de pessoal e grande sobrecarga de trabalho. A ponto de as chefias daquele serviço terem apresentado, no início do verão, uma carta aberta em que ameaçavam com uma demissão em bloco. Não se concretizou, mas aguardam-se soluções.
O presidente do hospital reconhece que a organização daquele serviço, que dispõe de uma equipa dedicada, não se coaduna com as regras da administração pública em que todos são pagos por igual. O gestor privado podia pagar valores diferenciados na Urgência, mas o público não pode, por isso tem mais dificuldade em contratar [ler ao lado].
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Já os enfermeiros ouvidos pelo JN falam em melhorias nas condições de trabalho. Muitos estavam a receber abaixo da tabela e sentiram a diferença no vencimento. "Agora não há recibos verdes" e os cerca de 180 enfermeiros que recebiam 1060 euros estão agora a receber 1205, constata a enfermeira Ana Couto. Salvo algumas exceções, as horas extra são pagas, ao contrário do que acontecia com o gestor privado e que motivou greves, recorda a delegada sindical.
Denise Salsa corrobora. Também é enfermeira e faz uma análise positiva da reversão para o Estado em termos de direitos dos trabalhadores. Na parte clínica, há questões a melhorar, como o rácio de enfermeiros por doente e a necessidade de substituição e manutenção de equipamento. Quanto aos utentes, garante que não se apercebem muito das mudanças até porque o hospital e as equipas são as mesmas. Mas já há quem fique surpreendido com a resposta rápida em algumas cirurgias. "Dizem que estavam à espera de pior", conta Denise Salsa.
41 mil esperam por consulta
A redução dos tempos de espera cirúrgicos é um dos focos da atual administração, que recebeu um hospital quase novo (dez anos) com uma ala operatória subdimensionada e a necessitar, com urgência, de uma unidade de ambulatório de raiz. Enquanto o projeto não avança, as equipas estão a operar fora, em blocos do setor privado e social da região.
Sendo a unidade mais pressionada do Norte, o Hospital de Braga tem mais inscritos para consultas e cirurgias do que o S. João, no Porto. Em janeiro de 2020, Braga tinha 19 mil doentes inscritos para cirurgia e, no final de julho de 2021, eram menos de 12 mil, assinala o presidente. Ainda assim, os números estão longe do aceitável.
O último relatório de monitorização da ARS Norte coloca Braga como o pior hospital da região em termos de acesso à cirurgia, com uma mediana de espera de 3,5 meses (a nível regional, é de 2,3 meses), e que chega aos sete meses em Ortopedia. Nas consultas, também há longas esperas e muitos doentes que já aguardam fora dos tempos máximos recomendados. A lista de inscritos reduziu, mas ainda há mais de 41 mil utentes a aguardar por uma primeira consulta de especialidade.
Privado não aceitou prolongar contrato
O volte-face aconteceu há dois anos. O Estado quis prolongar os contratos de gestão privada dos hospitais de Braga e de Vila Franca de Xira, de forma a ganhar tempo para lançar os respetivos concursos públicos para uma nova PPP, mas a José Mello Saúde não aceitou. A gestão clínica daqueles dois hospitais voltou à esfera pública.
Novas PPP no Sul
Em 2018, a Lusíadas aceitou prorrogar o contrato do Hospital de Cascais por três anos, estando a decorrer um concurso para uma nova PPP. Para o Hospital de Loures, gerido pela Luz Saúde, também está a correr um concurso para uma nova PPP.