Em 2022 houve 808 autorizações dadas por compra de imóveis. Desejo de levar programa para zonas menos povoadas falhou.
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Oito em cada dez propriedades compradas, este ano, ao abrigo do regime dos vistos gold (79,6%) situam-se nos distritos de Lisboa e Porto - e só o concelho de Lisboa concentra metade. Ao contrário do que queria o Governo - que, a 1 de janeiro, dificultou a emissão de autorizações de residência a quem comprasse casas nas duas maiores cidades e no litoral -, as zonas menos habitadas não atraíram estes investidores: dos 808 imóveis adquiridos, só 61 (7,5%) se situam em regiões pouco povoadas (ver infografia).
A maioria dos 808 imóveis foi adquirida no distrito de Lisboa (465, ou seja, 57,6% do total), seguindo-se o do Porto (178, isto é, 22%). Tal ainda é possível porque as novas regras para a capital e a Invicta só proibiram a compra para fins residenciais, não impedindo a compra para fins comerciais ou turísticos. Desde o início do programa, foram emitidos 10 393 vistos para compra de casas no valor de 5,4 mil milhões de euros.
A cidade de Lisboa concentra metade (49,4%) das propriedades transacionadas até outubro, num total de 399 casas. O município do Porto - o segundo mais procurado - soma 139 (17,2%). Juntos, os dois concelhos contabilizam 538 imóveis (66,6%, ou seja, dois terços).
ÉVORA EM QUARTO LUGAR
No distrito de Lisboa, os restantes municípios onde se adquiriram mais imóveis foram Cascais (37), Sintra (dez) e Oeiras (nove). No do Porto, foram Matosinhos (20), Marco de Canaveses (nove), Gaia e Amarante (cinco cada). No Algarve, lideram Lagos (15), Loulé (14) e Albufeira (11).
Quanto aos concelhos de baixa densidade - para onde o Governo queria atrair os vistos gold -, o município com mais vendas ao abrigo deste programa é Évora (23). Têm esta designação os concelhos com menos de 100 habitantes por quilómetro quadrado ou PIB per capita inferior a 75% do nacional. Évora é o quarto município do país com mais imóveis vendidos ao abrigo do regime criado em 2012. Seguem-se Vila Viçosa (11) e Grândola (sete).
Em 2020, ao anunciar as mudanças nos vistos gold, António Costa tinha dito que a compra de casas ao abrigo do programa já só fazia sentido "nas regiões autónomas ou territórios de baixa densidade". Na Madeira, segundo o SEF, venderam-se três casas (todas no Funchal) e nos Açores nenhuma.
"aqui vistos valeram zero"
Ao JN, Fernando Queiroga, autarca de Boticas e ex-líder da Comunidade Intermunicipal do Alto Tâmega, diz que a pouca procura dos investidores por novas zonas se deve à falta de "incentivos". Lembrando que os vistos visavam "recuperar o imobiliário nos grandes centros", atira: "Qual é a vantagem de agora virem para aqui? Nenhuma. Para os meus territórios, os vistos gold valeram zero".
Paulo Caiado, líder da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária, também não esperava que a mudança de regras ajudasse outras regiões. "Não se potencia o interior por decreto", frisa, vincando que é fácil contornar as novas normas para o litoral: "Basta pôr os imóveis para fins turísticos".
Em 2022, até outubro, foram atribuídos 1009 vistos, dos quais 808 (80%) por compra de imóveis. Em 2021, em igual período, tinham sido dados 698 (pelo imobiliário foram 622, ou 89%). Em 2019, o último ano pré-covid, emitiram-se 1245 em 12 meses (1160 por imóveis).
Vistos à lupa
Baixa densidade
São concelhos de baixa densidade os que têm menos de 100 habitantes por quilómetro quadrado ou com PIB per capita inferior a 75% do nacional. São 165 municípios.
6,6 mil milhões
Em dez anos, foram concedidos 11 263 vistos e captados 6,609 mil milhões de euros.
O que mudou em 2022
O valor mínimo de transferência de capitais subiu de 1 para 1,5 milhões de euros, o de transferência para fundos de investimento ou capitais subiu de 350 mil para 500 mil euros e deixou de se poder comprar imóveis para residência em Lisboa, Porto e litoral.
Medina criticou
O anúncio de remodelação dos vistos gold, em 2020, teve a oposição de Fernando Medina, então autarca de Lisboa. O agora ministro das Finanças disse que o país "não deve diminuir instrumentos de atração de investimento".
Saber mais
10 mil vistos gold foram atribuídos, desde 2012, pela via do imobiliário. A barreira foi ultrapassada este ano, sendo que, atualmente, o total já vai em 10 393, o que corresponde a 92,3% do total. Desde a criação do programa, foram emitidas 11 263 autorizações.
22 vistos concedidos, em dez anos, pela criação de postos de trabalho. No total, esses investidores geraram 280 empregos. Em 2022, até setembro, foram criados 39 postos de trabalho pelos dois únicos investidores que conseguiram visto por essa via.