Assunção de despesas até 11 de janeiro está prevista em decreto-lei. Mas há um parecer jurídico interno da Secretaria-Geral da Administração Interna que é contra mais pagamentos.
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A Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna (SGMAI) assumiu o pagamento de mais 155 mil euros à SIRESP - Gestão de Redes Digitais de Segurança e Emergência SA, a empresa pública que é responsável, desde 1 julho último, pela rede de comunicações de emergência e segurança do Estado até que seja criada uma entidade que agregue todas as redes de comunicações do Ministério da Administração Interna.
A despesa é relativa ao período entre 1 de julho de 2021 e 10 de janeiro de 2022, para o qual o Governo já tinha pago 11 milhões de euros de indemnização compensatória à SIRESP SA para assegurar a continuidade do serviço. A assunção das responsabilidades financeiras está enquadrada num decreto-lei recente, mas há um parecer jurídico interno da própria SGMAI que diz que não deve haver mais pagamentos.
O Decreto-Lei 8/2022 de 10 de janeiro estabelece que a SGMAI assume uma série de encargos da rede SIRESP - contratos de arrendamento de espaços que alojam sites ou antenas, prestações de serviços associadas a sites da rede, fornecimento de energia, serviços de manutenção e comunicação das estações móveis e sistemas e aplicações informáticas de suporte à rede - que já eram da sua responsabilidade antes do fim do contrato, a 30 junho 2021.
71% já foram pagos
Em resposta ao JN, o Ministério da Administração Interna (MAI) esclareceu que os encargos assumidos, de 1 de julho de 2021 a 10 de janeiro de 2022, "correspondem a cerca de 155 mil euros, dos quais já foram pagos 71,3%", e que estão sustentados no decreto-lei.
O MAI acrescenta que "a indemnização compensatória de 11 milhões de euros à empresa SIRESP SA destinou-se ao pagamento dos contratos relativos à gestão, operação, manutenção, ampliação e correto funcionamento do Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP) no segundo semestre de 2021".
Recorde-se que o Governo não renovou a parceria público-privada (PPP) que geria a rede SIRESP desde 2006 e terminou a 30 junho do ano passado, tendo prolongado por 18 meses o contrato de prestação de serviços com o operador privado que liderava a PPP, a Altice.
O objetivo é que, nesse período transitório, que decorre até ao final deste ano, seja criada uma entidade para gerir as várias redes de comunicações do MAI. O projeto está, no entanto, suspenso devido à interrupção da legislatura (ler ao lado).
Parecer crítico
Porém, há divergências internas sobre a obrigação de a SGMAI assumir despesas correntes da rede SIRESP após o término do contrato. No verão passado, a secretária de Estado da Administração Interna, Patrícia Gaspar, tentou responsabilizar a SGMAI pelas despesas correntes com a rede até 31 de dezembro de 2021, mas o despacho de 6 de julho foi considerado ilegal pelos serviços jurídicos.
De acordo com o documento, a que o JN teve acesso, "cessaram impreterivelmente em 30 de junho de 2021 todas as responsabilidades e encargos de natureza financeira da SGMAI no âmbito do funcionamento do modelo transitório de gestão, operação, manutenção, modernização e ampliação do SIRESP", considerando que foi precisamente para "assegurar o funcionamento sem hiatos nem perturbações" do referido modelo transitório que a SGMAI pagou 11 milhões de euros à operadora.
O parecer dos Serviços de Assessoria Jurídica, Contencioso e Política Legislativa, refere que o teor do despacho da secretária de Estado não tem base ou fundamento legal, e "contraria e viola todas as normas legais, regulamentares e administrativas em matéria de gestão orçamental da MAI e da SGMAI".
Dados
519,3 milhões de euros é o montante que o Estado gastou com o SIRESP (Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal), entre 2006 e 2019, segundo uma auditoria do Tribunal de Contas, divulgada em abril passado.
31,9 milhões de euros
Em maio de 2021, o Governo autorizou a SIRESP SA a gastar 31,9 milhões de euros para garantir o funcionamento da rede após 30 de junho. A este valor acresce a indemnização compensatória de 11 milhões de euros.