Em rações está a gastar mais 7800 euros por mês. Negócio só é rentável porque produtor é "homem dos sete ofícios"
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"Há 15 anos, o meu pai recebia mais pelo leite do que eu recebi em 2021!", atira António Campos, balançado entre a tristeza e o desânimo. Cresceu ali, entre vacas e leite, em Gondifelos, Famalicão, numa exploração que o pai construiu de raiz em 1989, com o dinheiro que amealhou no cultivo de tabaco no Canadá.
António tem 235 vacas, 120 em produção. Entrega, por dia, 3500 litros de leite à Agros. Aposta cada vez mais nas forragens cultivadas em casa para diminuir a dependência das rações que "sobem todos os meses", mas "sai-lhe do corpo". Para além de produtor de leite, é eletricista, mecânico e agricultor. Trabalha 12 a 14 horas por dia. Raramente tem um fim de semana completo de folga. Mulher e filho ajudam e "lá se poupa mais algum". Só isso lhe torna ainda rentável o negócio.
Há 12 anos investiu na nova vacaria. Seguiu-se a recria, os solos e a zona de aprovisionamento das forragens. Os painéis solares e a ventilação foram as duas últimas aquisições.
Contas feitas, em 2021, produzir um litro de leite custou-lhe 33,7 cêntimos. O preço médio pago à produção foram 29,98 cêntimos. Perdeu dinheiro. O pai, em 2007, recebia o leite a 39,40 cêntimos. Em 15 anos, desvalorizou 10 cêntimos em cada litro.
Cada vaca come, em média, 50 quilos por dia. Na exploração de António Campos só 20% é comprado fora. Ainda assim, fruto da seca e da guerra na Ucrânia, só o preço do grão subiu, num ano, 75%. "Era a 320 euros a tonelada e agora está a 560 euros. Só em ração gasto, agora, mais 7800 euros por mês".
Para produzir um litro de leite, explica o nutricionista Rui Cruz, são agora necessários, dependendo da eficiência da exploração, "40 a 50 cêntimos". "Para ter uma ideia, só por causa do anúncio do recrutamento russo, a tonelada de soja subiu de 550 para 650 euros", afirma. Depois, "é tudo o resto": a eletricidade, o gasóleo, os fertilizantes.
Rui Cruz, que dá apoio a várias explorações da região, vê de perto o drama de muitos: "Se as pessoas querem leite de qualidade, no mínimo, o produtor tem de receber 50 a 55 cêntimos e, mesmo assim, alguns vão fechar", alerta. A somar aos custos de produção, há quem tenha investido e tenha empréstimos para pagar ou nova maquinaria e tratores para comprar.
"O meu pai começou por cultivar uma coisa que faz mal à saúde [tabaco] e ganhava muito dinheiro. Eu produzo uma coisa saudável e ganho mal", remata António. O filho, com 15 anos, já ajuda a tocar a exploração, mas, hoje, António, que orgulhosamente herdou o negócio do pai, deseja-lhe um futuro melhor.
Valor
54 cêntimos por litro de leite é o valor que o produtor António Campos está a receber desde 1 de outubro. Há menos de um ano recebia 29,98.