Um contrato-promessa de arrendamento para fins habitacionais, com um pagamento antecipado de 312 500 mil euros, tendo em vista a construção de um Centro de Exposições Transfronteiriço (CET), em tudo semelhante ao assinado em Caminha pelo agora demitido secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro, Miguel Alves, esteve em vias de ser celebrado em junho de 2020 pela Câmara da Guarda. O contrato não avançou devido "a divergências internas" na maioria PSD. O atual autarca local, Sérgio Costa, diz ao JN que "nunca concordou" com o negócio.
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O acordo com o investidor GreenEndogenous foi fechado com o então autarca Carlos Alberto Monteiro e previa a cedência da propriedade da antiga fábrica Tavares para execução da obra, mas não avançou devido "a divergências internas" na maioria PSD na câmara. O edil recuou a assinatura face à não concordância dos seus pares no seio do Executivo e à possibilidade de estes o virem a chumbar.
A informação foi confirmada ao Jornal de Notícias, pelo atual presidente da autarquia, Sérgio Costa, que na altura exercia funções como vereador social-democrata no Executivo. "Nunca concordei com o negócio. Defendi sempre que o projeto [do CET] devia ser colocado a concurso e nunca uma adjudicação direta", declarou ao JN, o autarca eleito como independente em 2021, após rutura com o PSD.
De acordo com os documentos das propostas que a Câmara previa submeter a aprovação do Executivo e Assembleia Municipal, a que o JN teve acesso, o município da Guarda tinha intenção de ceder à GreenEndogenous a "Quinta do Rio Diz", propriedade que a câmara decidiu comprar em 2001 e pela qual aquela autarquia já pagou 1,995 milhões de euros. O negócio com a sociedade Textil Manuel Rodrigues Tavares foi parar a tribunal por iniciativa dos proprietários e a aquisição nunca foi formalizada até hoje através da respetiva escritura.
No negócio proposto à Guarda, a GreenEndogenous assumiria a posição contratual daquele município e uma dívida de cerca de 791 mil euros referente a uma hipoteca constituída pelos proprietários a favor do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social. O objetivo seria a construção naquele local de um Centro de Exposições Transfronteiriço (CET), num investimento de 16,2 milhões de euros e que seria cedido em regime de arrendamento ao município pelo período de 25 anos.
Pediam cinco meses de rendas
Na minuta do contrato-promessa, que depois não chegou a ser assinado, consta que a câmara comprometia-se a pagar à cabeça cinco meses de rendas no montante global de 312 500 euros. O valor da renda mensal do CET da Guarda seria de 62 500 euros (750 mil por ano). Lê-se também que a empresa compromete-se a, após a conclusão da obra, devolver ao município os cerca de 1,995 milhões de euros pagos pela compra da "Quinta do Rio Diz", sendo que o contrato contemplava ainda a criação de "uma conta-caução" a favor da Câmara da Guarda, prevendo a eventualidade de incumprimento por parte da GreenEndogenous.
Indica também que, se não houvesse incumprimento, "não poderá ocorrer denúncia do contrato, por qualquer das partes outorgantes, antes de decorrido o primeiro ciclo de vida do contrato definitivo". E que após 25 anos a câmara ou renovaria arrendamento ou teria opção de compra, por um valor nunca inferior a 25 milhões de euros.
Sem visto prévio do Tribunal de Contas
O mesmo documento refere que aqueles investidores "participam no consórcio privado, responsável pela conceção, construção e exploração do Super Bock Arena no Porto" e que o acordo com os mesmos foi alvo de um parecer jurídico pelo Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Licínio Martins, em que este "fundamenta legalmente a estratégia de atuação prosseguida" com a sua celebração. Indica que este avançaria, tendo em conta o seu "reconhecido interesse público" e os pressupostos de "legalidade", não estando este sujeito nem "ao regime da contratação pública", nem "a controlo prévio do Tribunal de Contas".
Na fundamentação para a construção do CET, o município considerava aquele equipamento "fulcral para o sucesso da candidatura da Guarda a Capital Europeia da Cultura".