Ana Nunes de Almeida disse, ontem, ter ficado "absolutamente chocada" com as declarações do diretor do Departamento Nacional da Pastoral Juvenil, Filipe Diniz que, no início do mês, considerou que o relatório sobre abusos sexuais, ontem apresentado, não afetaria o evento católico. E defendeu que a Jornada Mundial da Juventude, que vai reunir mais de um milhão de pessoas em Lisboa em agosto, é "o melhor lugar" para falar deste tema.
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"Este, para mim, é um sinal do alheamento. Fez-me muita impressão ouvir isto. Há ou não melhor lugar para discutir este problema do que a Jornada Mundial da Juventude? Como não vai afetar?", questionou a investigadora e membro da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica, que ontem cessou funções, durante a apresentação do relatório.
A socióloga disse que "a Igreja, que aqui foi pioneira, não tem de ter vergonha e pode orgulhar-se de ter encomendado este trabalho e de ter dado a liberdade que nos deu para investigar". "A Igreja podia integrar este discurso na Jornada Mundial da Juventude", sugeriu ainda, referindo-se ao evento onde está prevista a presença do Papa Francisco e onde poderá haver mesmo um encontro com vítimas de abusos, como é tradição nalgumas JMJ.
Em entrevista à agência Lusa, no início do mês, Filipe Dinis disse acreditar que a divulgação do relatório da Comissão Independente sobre as denúncias de abuso sexual na Igreja Católica portuguesa não irá afetar a Jornada Mundial da Juventude, embora admita que a situação faz "estremecer" a Igreja.
Para o padre Filipe Diniz, "é de saudar todo o trabalho que tem sido feito" pela Igreja Católica no combate ao problema, sublinhando "a transparência" do processo. "Se há um criminoso, deve ser julgado (...). E o Papa Francisco tem sublinhado várias vezes a tolerância zero" quanto aos abusos sexuais na Igreja, refere o padre Filipe Diniz, reconhecendo que a Igreja "estremece" com estes casos.
"A verdade clarifica"
"Mas, se houver verdade, transparência, estamos a ser Igreja. A verdade clarifica. Pode abanar a estrutura (...), as próprias pessoas, a credibilidade, mas se (...) estamos a ser verdadeiros e é a verdade que mostra tudo isso, mostra estas situações, penso que nesse sentido é bom", afirma o sacerdote responsável pela pastoral juvenil da Igreja Católica em Portugal em entrevista à agência Lusa.
Também há um ano, em entrevista à Lusa, Duarte Ricciardi, que lidera a equipa executiva da Jornada, disse: "não temos sentido dos jovens que isso (abusos sexuais) seja tema de assunto nos encontros da Jornada da Juventude". "Não se tem juntado as duas conversas, nem por iniciativa dos jovens, nem por nossa iniciativa", referiu na altura. Quanto à apresentação dos resultados do relatório, que aconteceu ontem, disse: "Não penso sobre o impacto que isso possa ter".
Ricciardi reconheceu, contudo, que "a questão dos abusos sexuais é um tema muito sério e em que a Igreja portuguesa está também a atuar de uma forma muito séria". "É uma coisa que nos causa dor, que não gostamos que possa ter acontecido, que sentimos muita empatia pelas vítimas e que é algo que gostaríamos que nunca tivesse acontecido".